CELEBRIDADES

 

Nunca gostei de meu próprio nome. Mas com o tempo, também sabendo que isso não tem muita importância, com ele me acostumei. Também porque devido a dificuldade da sua pronúncia, sempre tive apelidos piores que o próprio nome. Eu até sei porque eu não gostava dele, pois ele sempre me pareceu com nome de padre, o que não combina com meu temperamento acnti-clerical e nada religioso. Hoje até acho que ele expressa bem a minha maneira peculiar de ser. Mas não quero falar de mim, mas de outros casos mais contemporâneos e decididamente mais extravagantes. Vou falar de quatro deles.
 
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Lá pelo início desse século eu era professor de História e Filosofia num colégio de ensino médio (tristes tempos) em uma cidade do interior de Goiás. Era uma turma de 1º ano, ainda não conhecia os alunos com quem iria conviver durante um ano inteiro, ou até três anos. Mas em todo primeiro dia de aula eu lia a lista de alunos, não por afeição a essa coisa de fazer "chamada", sim porque era uma forma de ligar aqueles estranhos nomes aos seus donos. Memorização. Não adiantava nada, mas era um tipo de ritual sem o qual o ano letivo não podia começar. E assim fiz naquele dia. Eu diante daquelas caras bonitas e cheias de espinhas, lendo a lista. Fazendo chiste com cada um deles. Foi quando cheguei na letra C (de custoso, capeta), e me deparei com aquele nome que não sabia ler: "Caullius". Li o nome e o seu proprietário levantou a mão, meio rindo, e me corrigiu. Pronunciei, e ele me corrigiu de novo.
_ Como é que se pronuncia mesmo?
_ Do jeito que tá escrito.
Fiz de conta que não ouvi, e pronunciei pela terceira vez.
_ É assim mesmo professor!
Pronunciei duas vezes pra mim mesmo. Então deu um estalo.
_ Seu nome é o daquele atleta?
_ É, minha mãe era fã dele.
Não é que menino tinha por nome "Carl Lewis", ou melhor Caullius. Mecanicamente perguntei:
_ Você gosta do seu nome.
_ Gosto. Eu acho bonito.
Ele merece o pai e mãe que tem.


 
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Eu estava esperando a minha vez de ser atendido num caixa de supermercado, no Jardim Olímpico em Aparecida de Goiânia. E na minha frente dois carrinhos lotados de caixas de leite, suquinhos e bolachas, dessas de escola. Na condução do veículo, uma mãe e sua filha. Eu tava lá, pensando na morte da bezerra e esperando a hora de comprar um maço de cigarros. Quando a mãe falou para a filha:
_ Sharon Stone?!!! (Acho que era assim que era escrito.
_ O que foi mãe?
_ Vá procurar o Maicon Douglas (foi assim que ela pronunciou), tá chegando a nossa vez.
Não sei que basic instinct leva uma mãe, ou pai, a colocar esse par de nomes em irmãos! Não deve ter assistido o filme. E lá se foi a Sharon Stone procurar o Maicon Douglas. Não sei se o encontrou, mas presumo que ele estava na seção de brinquedos junto com o Maicon Jackson

 
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Esse caso eu descobri com uma aluna, minha orientanda. Se passou num pequeno distrito do interior, no sudeste goiano. Era uma pesquisa sobre processos de nomeação de pessoas. Ela conhecia todos do lugar, assim como seus nomes. Não sei porque ela escolheu somente os casos que julgou mais esdrúxulos. Foi assim que ela chegou até a Canídia. Não acho um caso muito estranho, talvez seja até um nome bonitinho. O problema não é a sua beleza ou não. É que o nome é uma homenagem ao jogador Caniglia, o carrasco argentino que fez o gol que eliminou o Brasil da Copa de 1990.
_ O que a mãe dela falou? Ela torce pra a Argentina?
_ Não é isso. Ela falou que achava o Caniglia bonito e que gostou do nome.
Caniglia bonito? Mas tinha mais. A mãe da moça disse que todos criticavam o nome, que não achavam muito católico, essas coisas. Então a mãe resolveu procurou o padre para ver o que achava, pra costurar a boca daqueles fofoqueiros. Então o padre respondeu que de fato aquele nome não combinava com o cristianismo. E que ele deriva do radical latino cani, que quer dizer cão, que é o próprio coisa ruim, o tinhoso do caramunhão. E a mãe perguntou se bastava colocar um Maria na frente de Canídia. Não sei se o padre aprovou ou não a saída. Mas o fato é que ela foi até o cartório para dar consecução à sua ideia. Parece que o processo era demorado, caro e devia ser feito no judiciário, lá no fórum da cidade, a uns 40 quilômetros. Então deixou por isso mesmo. Afinal de contas ela achava o nome bonito. E é isso que interessa. E quanto a Canídia, ela continuou a viver carregando seu nome do cão.

 
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Agora é mais rápido. Eu espero. Esse vi por causa de minha mania de assistir programas de esportes na TV. E é um caso razoavelmente conhecido. Então aqui não existe o perigo de me chamarem de mentiroso. O que pra mim não é uma ofensa, considero até um elogio. Existiu um jogador de futebol alcunhado "Capitão". Sei que ele jogou pelo Goiás, pela Portuguesa e por um monte de outros times. Era daqueles jogadores a que chamam de folclóricos, pelo que dizia e pelo que fazia. O fato em questão nem se relaciona a isso. Ocorre que o nome de registro do Capitão era "Oliúdi". É, o cara se chamava "Holywood", traduzido para a nossa língua vernácula. Nome dado não tendo em referência o bairro de Los Angeles, mas sim em honra a determinada marca de cigarros. É claro que isso dava pano pra manga para a mídia esportiva. Pois tornava o jogador ainda mais folclórico. Foi quando chegou o dia em que o filho do Capitão nasceu. E ele batizou de "Oliúdi Jr" ao seu herdeiro. O negócio virou uma maldição familiar. É melhor rapidamente colocar no menino o apelido de "Capitão Jr"! Pois acho que esse nome nem pode ser pronunciado na mídia, dada a proibição da propaganda de cigarros. Mas o pimpolho teve a sorte de ir ao miolo do decadente universo das celebridades: a própria Holywood.
 
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