A MULHER DA TESOURINHA
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Recontando Contos Populares
Certo dia, o caboclo Romildo chegou a seu rancho desejando cortar umas fatias de queijo; então, pediu para sua mulher uma faca. A mulher que era teimosa a não mais poder, cismou que ele devia cortar o queijo com uma tesoura e, em vez da faca, trouxe-lhe uma tesoura. O caboclo estranhou e, de imediato, retrucou:
— Está doida, mulher? Pedi faca, e você me traz uma tesoura!
— Isso mesmo! Queijo não se corta com faca, corta-se com tesoura. Escutou?
— Não senhora! É com faca! E não me queima o juízo, senão...
— Senão o quê? É com tesoura! Com tesoura! Com tesoura! Vou dizer uma, duas, mil vezes...
Romildo insistia na faca e era sempre contestado pela mulher, tanto foi que o caboclo indignou-se e lhe aplicou o mais formidável bofetão de que há memória nas redondezas; depois agarrou sua mulher e a levou até o poço que havia no quintal, lançando-a dentro dele, gritando, irritado:
— Queijo se corta com faca ou com tesoura?
E debatendo-se dentro da cisterna, a mulher a gritou:
— Com tesoura! Com tesoura! Com tesoura... - E aos poucos foi submergindo, porém irredutível, inflexível na sua incompreensível teimosia.
Quando finalmente desapareceu em meio à água da cisterna, que lhe cobria todo o corpo, ainda conseguiu, num último esforço, erguer a mão e, com os dedos abertos, imitar as lâminas de uma tesoura.®Sérgio.
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Nota Sobre o Texto: Este conto, ouvi de uma senhora idosa, na cidade de Aquidauana (MS), esposa do dono de um boteco, onde tomava com um amigo, uns dedinhos de cachaça, "pra esquentar", depois de um bom banho no rio homônimo ao nome da cidade.
Imagem: Caipira picando fumo. Óleo sobre tela de José Ferraz de Almeida.
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Agradeço a leitura do texto e, antecipadamente, qualquer comentário. Volte Sempre!