Desencontro

Naquele dia de setembro, pela hora da madrugada, quando todos ainda dormiam, ela colocou suas poucas roupas numa mala e partiu, deixando mãe e irmãos. Encontrou-se com tal caixeiro-viajante, do qual tinha engravidado e viajou para terras distantes.

Chegaram a um pequeno casebre onde seria sua morada. Ele pernoitou e no dia seguinte partiu, deixando-a sozinha, pois tinha outra família, mulher e cinco filhos, que esperava por ele em outra cidade.

Sem nenhum recurso deixado, ela teve que ir à peleja e arrumar um trabalho para sua sobrevivência.

Ela sozinha, teve o filho com ajuda de alguns bondosos vizinhos. Quando fazia dois anos, ele reapareceu como quem visita um amigo num fim de semana e logo partiu, deixando-a novamente grávida.

Do mesmo modo, em visita relâmpago, ele a engravidou do terceiro, não tardou do quarto e do quinto filho. Jamais demonstrara em qualquer das visitas, nenhum tipo de afeto por esses cinco filhos.

Ele continuou voltando a cada dois ou três anos, e os filhos crescendo, assistindo aquela figura entrando e saindo de casa como se fosse um alienígena.

Ela completamente sem juízo, mesmo já tendo passado tantos anos e muitos apertos para alimentar aqueles cinco filhos, presenciado a falta de caráter e de humanidade daquele homem, ainda assim o recebia, tratando-o como rei, e nessas horas ignorando os cinco filhos.

Ele, com ar insolente, dava aos filhos um tratamento desumano, difícil até para um cão aturar.

Ainda assim, ela o acompanhava, entrava para o único cômodo que tinha uma cama, e ali faziam sexo sem se importarem com os pequenos que ali estavam. Curiosos, os filhos assistiam a esses atos libidinosos pelas frestas da cortina.

Vinte anos se passaram, os filhos casaram-se, tiveram também seus filhos, mas adquiriram severos traumas, alguns deles ignorando os próprios filhos, ou dando a eles o mesmo tratamento humilhante porque passaram.

O infortúnio e a dor semeados largamente durante anos em suas vidas fizeram deles pessoas fracas, inseguras, ácidas e solitárias.

Ele já velho, desgostoso por não ter o amor e a compaixão de nenhum dos filhos, e tido uma vida indecente e desrespeitosa, vivia se embriagando e chorando a má sorte.

Amargando a dura solidão que fizera do seu caminho, assim ele sucumbiu da vida.

Ela assistia silenciosamente uma guerra entre os filhos, e nenhum deles se harmonizava sequer com ela. Os irmãos desconheciam um ao outro.

Dia após dia, ela assistia as mesmas cenas e chorava!

Enigmaticamente, como que iluminados por uma luz celestial, os irmãos se compadeceram de sua velha mãe, e passaram a olhá-la com mais ternura.

Tomados de forte emoção, em um encontro marcado para alegrar aquela, que amargurada por tantos anos de solidão, sofrimento e tristeza, abraçaram-se, mãe e irmãos chorando em indizível comoção.

Todos os irmãos perdoaram-se mutuamente, deixando aquele velho coração de mãe finalmente experimentar a paz.

Puderam também os irmãos e seus filhos, conhecerem este novo sentimento em família com um amor fraternal nunca sentido antes.

Com coração tranqüilo, todas essas almas puderam enfim repousar em paz.