Paixão em 1ºgrau

Quando já bem adiantada ia a hora, ele entrou em casa e viu sobre a mesa, correspondência em seu nome. Aproveitou que sua mulher tinha ido visitar uma velha amiga, conforme avisara, e foi ler aquela carta.

Paralisado ficou ao abrir e ver seu conteúdo, juntamente com algumas fotos provavelmente para comprovar o que nela estava escrito.

O remetente da tal correspondência era velho conhecido e meio aparentado, marido de sua irmã, deixando-o ainda mais perplexo.

Com pensamentos agitados, caminhava de um lado ao outro até que resolveu sair para refrescar as idéias.

Foi até ao bar na esquina de sua casa. Sentou-se e pediu uma bebida forte. Ali ficou por algum tempo, olhando para o céu que estava repintado de estrelas. Já sentindo certa paz no coração, pegou o caminho de volta.

Com passo lento e cadenciado, como se contasse cada pisada pelas batidas de seu coração, ele retornou, onde sua mulher já o aguardava.

Ela era a grande paixão de sua vida, como diversas vezes fez em declarações explicitas.

Amiudadas vezes fez declarações também por escrito, que ela era o maior amor de sua vida, sua paixão eterna. Usava palavras de desvelo e ternura jurando jamais separar-se dela.

Mas agora ele estava com uma carta em mãos e precisava relatar a ela o que nela continha e não sabia como iniciar esta conversa.

Pensou rapidamente que poderia omitir aquela carta e dar o caso por encerrado, mas a dúvida de nunca mais poder dormir sossegado, e ter por companhia fantasmas passeando e tirando seu sono, o fez decidir.

Impetuosamente colocou-a em suas mãos e deu alguns passos para trás, observando sua reação.

Ela, imediatamente abriu a tal correspondência e hesitante, leu com olhar fixo em cada palavra. Pegou as fotos e repassou devagar cada uma, parecendo já serem conhecidas. Aparentava certo tremor nas mãos e a pele levemente pálida. Justificou ser, o remetente da tal carta, seu amante, e pelo menos duas vezes por semana saíam, enquanto ele trabalhava, e já fazia algum tempo.

Atribuiu a ele, seu marido, a culpa pela traição, pois ela gostava de sair, ir a baladas, encontrar amigos para dançar, e ele não a acompanhava por estar sempre ocupado com tarefas de trabalho.

Ele perturbado, pensou no grande amor que tinha por aquela mulher, e como seria sua vida sem ela. Aceitou a justificativa, porém, advertindo-a que não toleraria outra traição.

A partir daí, ela começou a trabalhar, pois quando pensou que poderia perder o marido, estaria perdendo também a oportunidade de receber uma grande pensão caso ele deixasse essa vida antes dela, e ela contava friamente com esta possibilidade.

Ela não demonstrava forte afeto pelo marido, e não raro fazia planos diabólicos com o pai, que também não demonstrava nenhum tipo de pudor, para quando chegasse a hora de poder colocar a mão na pensão que o marido deixaria para ela.

Sempre que o marido era internado para fazer tratamento de uma rara doença da qual era portador, ela juntamente com o pai festejava de uma maneira tão explicita que aos olhares alheios, tremia a indignação.

Ele continuou a presenteá-la com bons presentes, e dava-lhe carro novo a cada ano, para que se sentisse confortável e feliz.

Ela continuou saindo nos fins de semana para a casa de parentes que residiam no outro lado da cidade, e encontrava seu novo amante. Saía para baladas e motéis, retornando na segunda-feira, enquanto ele em casa terminava algum trabalho importante, acreditando na sua lealdade.

Nestas saídas em fim de semana, acontecera um grave acidente, envolvendo seu carro, e ela foi levada ao hospital para tratar alguns ferimentos. Só então tomou conhecimento de estar acometida por grave doença. Era portadora do vírus da AIDS.

Ela não suportava a idéia de que nunca mais pudesse lançar mão da pensão do marido, da qual tantos planos fizera.

Esta pensão virara obsessão de sua vida, a razão de seu viver. Passou a amaldiçoar noite e dia sua sorte, até que sucumbida pela tristeza e em momento de forte instabilidade emocional, se suicidou.

Ele, o marido, chocado pelo ocorrido, chorou a dor da perda daquela que ele amou mais que a própria vida, mesmo após tomar conhecimento da vida paralela que ela assumira.

Após longo período buscando razão para continuar a viver, ele saiu para uma longa viagem pelos continentes.

Quando retornou, estava transformado com aparência alegre e jovial, e junto trouxe uma namorada que conhecera durante a viagem.

Sem perda de tempo, casou-se com a jovem, que já era mãe de um belo garoto, e formaram uma bonita e feliz família.