Barbie Monstro

Sexta-feira será aniversário da Júlia. Seu sonho era ganhar uma boneca Barbie. Impossível a primeira vista. Seus pais não tinham condições de presente-la, uma vez que a boneca é a mais cara do mundo e a mais famosa. Nunca na vida alguém poderia imaginar um morador do Beco do Brás comprando um presente assim. Mas lá foi o seu Antonio, pai de Júlia, fazer hora extra, juntar o máximo possível de dinheiro, apenas para ver a sua filha sorrindo. A mãe dela, dona Lúcia, passava as roupas do bairro vizinho, pessoal da grana. Naquela semana ela se fez em duas para dar conta do serviço e de mais uns que arranjou para ganhar mais dinheiro. Os planos para ter mais um filho iam-se acabando assim como os fios de cabelo do seu Antônio. Todas as vezes que Júlia via na televisão, não na sua porque não possuíam uma, a propaganda da Barbie Cabeleireira, uma vontade imensa tomava conta de seu peito e a fazia encher-se de alegria e vontade de brincar com a sua futura boneca. Ainda era muito nova para entender as dificuldades da vida. Na escola o papo não era outro, Barbie daqui, Barbie dali. Algumas colegas já levavam faceiras as bonecas que haviam ganhado. Por mais que sua família fosse pobre e não tivesse condições de comprar presentes, Júlia sempre os amou. Certa noite, no aniversário do ano passado, seu Antônio chegou com uma expressão cabisbaixa. Lúcia já sabia que naquele dia ele não havia conseguido comprar o presente de Júlia. Apenas com um olhar, o qual confirmou a noticia, Antônio abraça a filha e lhe deseja parabéns. Por menor que Júlia fosse, ela percebeu que não ganhara nada, mas mesmo assim abraçou o pai e disse:

- Ainda te amo papai!

Seria seu décimo aniversário. Para muitos o sonho das bonecas já haviam acabado, mas para Júlia estava apenas começando. Eis que chega o grande dia. Júlia estava mais do que preparada, caso seu pai não trouxesse nada. Na verdade já sabia que seria mais um ano vazio de presentes, mas cheio de amor. Em um casebre bem no fundo do Beco do Brás, o casal se ostentava havia mais de vinte anos. Seu Antonio trabalhava em uma empresa de refrigerantes, mas Júlia só sentia o sabor nas datas especiais. Sim, o aniversário dela era muito especial, mas não para o dono da empresa. Cinco horas da tarde e nada de seu pai chegar. De dez em dez minutos ela olhava para a janela (se é que podemos chamar aquilo de janela) para ver se o pai de aproximava. Mas tudo em vão. Até que lá pelas oito horas ele chega. E para a felicidade de Júlia com um embrulho nas mãos. Com um enorme pulo ela abraça o pai e rasga o presente.

- Calma filha! – diz a mãe, emocionada ao ver a felicidade dela.

- Se rasgar o papel dá mais sorte – respondeu uma Júlia extasiada.

Lá estava a boneca. Não era uma Barbie Cabeleireira, mas ainda sim era Barbie.

- Que Barbie que é?

- Não sabemos filha. A loja já estava fechando. Não deu tempo para perguntar.

Os três se abraçaram e choraram de emoção. E como de costume, Júlia diz:

- Amo vocês, são os melhores pais.

Mais do que depressa, Júlia corre para seu quarto, a fim de brincar com sua nova amiga. Mas lá de baixo, Antonio e Lúcia ouvem um grito. Apavorados correm para ver o que aconteceu e vêem Júlia aterrorizada com a boneca do outro lado do quarto sem as roupas.

- O que houve filhinha?

- A Barbie tem dois furos nas costas. Atiraram nela.

- Aquilo não são tiros, são parafusos.

- Como pode, a Barbie é perfeita. Agora sei que Barbie que é essa.

- E qual?

- Barbie Monstro.

A partir daquele dia, Júlia tornou-se uma mocinha e nunca mais brincou com bonecas.

Eduardo Costta
Enviado por Eduardo Costta em 04/02/2009
Reeditado em 04/02/2009
Código do texto: T1421783