A nova residência

– A mãe anda meio confusa! Ouviu a frase no meio de uma conversa, e, nos últimos tempos, aquela frase vem-lhe à cabeça, de vez em quando, sem que a busque, uma espécie de mantra que a persegue em determinados momentos, uma espécie de onda que a inunda, depois se retira e deixa-a na expectativa de que em breve a mesma sensação desconfortável voltará, fazendo-a perder o pé.

– Mãezinha, eu gostaria de te levar para a minha casa, mas, tu sabes como é… Sim, pensa a contragosto, ela sabe como é, o genro se mostra agradável nas relações sociais, o homem bem-falante que sabe tratar dos seus negócios, que se desvencilha dos problemas que o acometem, mas, no fundo, reconhecem os familiares, tem um gênio bastante difícil. Ela própria reconhece que não gostaria de conviver, quotidianamente, com ele. Se ainda fosse do seu sangue… Puxa um suspiro, ser professora não deixa de ser complicado, pode dificultar muito a vida, em matéria de fundos.

Teria preferido permanecer em casa, usufruir do quintal e das plantas que aprendera a amar, e a cuidar, no trato com o marido. Aqueles tempos constituem, à medida que passam os anos, um tipo de fantasia, que cria e recria a seu bel-prazer. Sempre se lembra dos filhos pequenos, as crianças com seus alvoroços, as brincadeiras, as leituras que com eles fazia… Agora, impera o celular, seu domínio abarca tudo, engolindo o melhor do tempo. Procura resistir, mas muitas vezes termina ocupando-se com ele, interagindo com amigos virtuais.

A televisão não a seduz muito. Recusa-se a passar os dias sentada à varanda, vendo os passantes na rua. Recusa-se a perder a identidade naquela casa de repouso, que escolheram para ela, dizendo das suas vantagens. Gosta de sair com a filha, arruma-se com esmero quando ela vem, levando-a para algum passeio. Tem saudades do filho, que aparece raramente na cidade, por ocasião de suas férias. E, no mais, conversa com um e outro, principalmente com o seu amigo, forasteiro, que surgiu por lá, como um sopro de vento no ambiente estagnado.

– Senta aqui, vamos conversar. Ele a solicita, sacode o marasmo com sua prosa inteligente, suas pitadas de humor. Por que está mesmo ali? Talvez pelos mesmos motivos que ela, solidão, necessidade de cuidados. Tem um carinho especial por ele, a pessoa com quem consegue plasmar o tempo que se estende indefinido, rir e brincar como adolescente. E, num desses impulsos momentâneos, encosta a cadeira na dele. – Tu me dás um beijo? - pede com um ar satisfeito. Ele estala um beijo no seu rosto. E ambos sorriem, enlevados.

(Relançamento)