Quando ela entrou em minha sala, senti pena; uma moça bonita, jovem, mas acabada; faltava um brilho, uma energia, que deve existir em mulheres com menos de trinta anos.

-'Em que posso lhe ajudar?'

-'O senhor empresta dinheiro, não é?'

Bem, sou agiota. Empresto grana a juros; baixos, comparados com os dos colegas. Confirmei. Ela pareceu aliviada.

' Preciso de dinheiro... mil reais...'

' Posso saber pra quê?'

Nunca antes havia perguntado. Mas a cara dela, tão desfeita, me atiçou.

-'Pra comprar uma arma... ' – e riu, como se fosse uma piada – 'Quero dar um tiro na cabeça...'.

Fiquei pálido. Um arrepio percorreu minhas costas e estendi a mão, para tocá-la. Em vão. A mesa, larga, a deixava a léguas de distância.

'Tá doida? – falei, zangado – Acha que vou lhe emprestar grana pra uma desgraça dessa?'

'Você não é agiota?' -  ela insistiu, surpresa.

 
'Mas não sou trouxa...'  – ri, irônico – 'Quem vai me pagar, depois que você morrer?'

Ela ficou me olhando, depois riu, leve, depois mais forte, até gargalhar. Fiquei quieto.

'Você tem razão... e agora?'

' Que horas são?'

'Dez pro meio dia!'

'Quer almoçar?'

Ela aceitou. Depois fomos ao cinema. No final do ano, casamos.

Ossos do ofício.

Como disse, meus juros são bem baixos.