PODEROSA BORRALHEIRA

Sentado no hall de saída de um grande shopping center, aguardo que meu amigo termine de fechar a sua loja.

O suave perfume do ar condicionado deixa de circular e os lojistas começam a dispor nas vitrines as mercadorias para o dia seguinte.

Os clientes, bem vestidos e sorridentes, saem conversando animados e carregando sacolas.

Depois, são substituidos pelos funcionários, cansados e apressados em retornarem para as suas casas.

Na minha frente, num quiosque de crepes, três funcionários atendem com presteza e simpatia alguns fregueses retardatários.

São dois rapazes e uma moça, impecavelmente vestidos de azul, vermelho e branco.

Algumas luzes dos corredores são apagadas e, como um sinal, as últimas pessoas se apressam para irem embora.

A moça e os rapazes encerram o expediente, lavam louças e utensílios, fecham gavetas e armários e recobrem os equipamentos com lona protetora.

O baile no grande palácio do consumo está no fim.

Os rapazes despedem-se da moça e ela examina o cumprimento dos procedimentos de fechamento.

Satisfeita, rapidamente percorre os arredores com os olhos e vai em direção aos cestos de lixo.

Saca do bolso duas sacolas plásticas e começa a separar latinhas de alumínio, com presteza reveladora de longa experiência.

Jovem e bonita, leva no pescoço discreta correntinha e simbólicos pingentes delicados, orgulho de sua maternidade precoce.

Com as duas sacolas lotadas de lata seu rosto se ilumina de satisfação.

Guarda em um canto seguro e desaparece no corredor.

Apagam-se mais algumas luzes e as alas são isoladas pelos seguranças.

Pouco depois ela retorna, rebolando suave, vestida com bom gosto e simplicidade.

No ombro esquerdo uma bolsa discreta combinando com tudo e nos pés arrasadores sapatos salto agulha.

Com elegância ela apanha com a mão direita as sacolas com as latas, empina o delicado nariz e pisa forte.

A festa e a metamorfose terminaram.

Ela moldou a fábula a seu gosto e inverteu o final, de borralheira se fez princesa.

Pela escada não lhe acorre nenhum principe encantado e, lá fora, não lhe espera nenhuma fada madrinha.

Poderosa ela abre a porta e, numa linda passada, sai da fantasia e pisa firme na realidade.