A casinha do Mangabinha

Eu não concebia gente fora de casa. Embora capaz de passar horas no quintal, bater bola na rua nua frontal e até frequentar a escola, que distava uns duzentos ou trezentos metros, sentia aquele aconchego mesmo era entre as quatro paredes e teto único nossos: fossem da sala, dos dois quartos, da copa ou da cozinha.

E quer saber mais: do banheiro, pra ficar um lar inteiro, ainda que debaixo do chuveiro.

Assim, quando um menino vizinho, o Chico do Duca, acho, me falou que o Mangaba tinha brigado com a família e estava fazendo uma casinha só pra ele, rente à mureta do campinho de volei do povoado, eu fiquei encabulado: afinal o Mangaba era aquele menino atracado e encardido, que vez por outra aparecia no nosso

vilarejo acompanhando a mãe, esmoler - e nunca ex-mulher - e uma penca de irmãozinhos menores, de quem se dizia que sempre o pai diferia.

E agora, sem mãe nem a irmandade, lá estava o Mangaba amontoando folhas de pita - o agave, pra quem pita não apita - pra fazer sua própria casinha.

Comecei a pensar em cousas estranhas, como a falta de um quintal, de uma luz pra alumiá-lo e até de uma privadinha que na certa não disporia aquela casinha.

Mas foi só idéia minha. Nem saiu pela boca, nem da cacholinha, só de dó do Mangabinha.

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 08/11/2014
Reeditado em 13/06/2022
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