Um Conto de Natal

Paulo odiava ouvir um marmanjo falar de Papai-Noel ao seu filho. Dizer que tivera uma infância difícil não era cabível de verdade. Na realidade, até que fora criado com muitos mimos e conforto. Porém, não suportava, e nem admitia a seus filhos, o acesso a contos de fadas e a mundos encantados. Muito menos lhes permitia o direito à crença inocente de que Papai-Noel existia.

Certa vez, seu filho Carlinhos, na época com quatro aninhos de idade, apareceu com um embrulhinho de presente que ganhara na escolinha onde estudava. Contou todo feliz ao pai que ganhara do Papai-Noel, que chegara de trenó na escolinha. Paulo não teve dúvidas: arrancou o presente das mãos do filho e o quebrou em mil pedaços, prometendo que no outro dia iria ter uma conversa séria com a diretora do prezinho, pois não admitia de maneira alguma que seu filho sofresse esse tipo fútil de influência. Nem precisa dizer que o menino chorou feito um doido ao ver seus sonhos de criança destruídos em coisa de segundos.

E assim era aquele sujeito. Grosso, estúpido, tapadão, ignorante e mais uma porção de adjetivos não muito virtuosos.

Seu irmão Agenor, que ele, por sinal, odiava, era exatamente o contrário. Religioso, criou os filhos com todos os direitos a Papai-Noel, Cinderela, Aladim, Branca de Neve e aos demais seres imaginários que as mentes sãs criaram. Uma vida toda construída dentro de um castelo de encantos e magias, apesar de ser simples a sua morada.

Os filhos cresceram. Ana Paula, a filha mais nova do humilde Agenor, hoje com 26 anos, é secretária do diretor de uma multinacional. Eduardo, o mais velho, é auditor em uma multinacional, também.

Do outro lado da linha, Paulo, não teve muita sorte com os filhos. Carlinhos, o mais novo, envolveu-se com uma porção de coisas erradas, e acabou sendo morto por traficantes. Julinho o mais velho, tornou-se alcoólatra e perambula pelas ruas feito mendigo.

O Paulo, coitado, ficou tão desgostoso com essa sina tão devastadora, que há pouco tempo sofreu um derrame e agora anda amparado por uma bengala.

Dias destes, deu dó de ver: parou em frente a uma loja de brinquedos onde um Papai-Noel, sentado em sua poltrona vermelha, presenteava as crianças com guloseimas. Viu um menino loirinho no colo do Papai-Noel, enquanto seu paizão, todo orgulhoso, tirava uma foto do pirralho. De imediato, lembrou-se do seu pequeno Carlinhos. Uma lágrima desceu-lhe pelo rosto e resvalou, ao cair, na camisa de cambraia que ganhara do Agenor.

Ficou parado ali alguns minutos, talvez arrependido de algumas atitudes que tomara durante sua grotesca existência até o momento. Depois, voltando à realidade, continuou a sua trôpega caminhada em direção ao posto de saúde, onde iria buscar seus remédios para o coração. Coração seco, retorcido, de quem nunca acreditou em Papai-Noel.