Dois refrigerantes, como sempre

 

     Numa Faculdade em Noracity, um jovem casal deixou a sala de conferências ao mesmo tempo, eles andaram pelos corredores da universidade por alguns minutos e depois deixaram o campus lado a lado.

     Ao olhar ao seu redor, o jovem rapaz avistou uma pequena lanchonete com seu terraço meio ensolarado e convidou a bela senhorita para tomar refrigerante.

     Eles se sentaram frente a frente em uma pequena mesa redonda de mármore falso e forrado com plástico, as cadeiras eram de ripas de madeira bastante desconfortáveis, do garçom, ele pediu dois refrigerantes e dois canudinhos, pois naquela época, era somente isso o que ele poderia oferecer. Os jovens se entreolharam intensamente. Eles conversaram sobre a faculdade, o curso e seus professores. O jovem rapaz pediu a conta e pagou. Eles deram alguns passos juntos, suas mãos se tocaram num primeiro olhar face a face, deram um último sorriso, se separaram e partiram cada um para a sua direção.

     Depois daquele dia o encontro dos dois se tornou uma rotina. Cada vez que saíam da sala de aula eles se encontravam em volta daquela mesa, ou de outra, mas no mesmo terraço da mesma lanchonete. Pediam os dois rigerantes e aguardavam com seus olhares contemplativos e seus sorrisos em êxtase.

     Os encontros e as conversas se tornaram mais pessoais e mais íntimas com o passar do tempo. Naquela lanchonete eles falavam sobre suas vontades, suas vidas e seus sonhos. Eles conversavam sobre si mesmos, ele, ela, os dois juntos. E um dia eles conversaram sobre o amor.

     Aquele terraço da lanchonete com suas mesas de mármore falso e cadeiras de madeira tornou-se o local de encontros preferidos. Reunião em pares, reunião cara a cara, reunião para enfrentar o amanhã e, às vezes, até para planejar um pouco mais, até o dia em que ficaram à frente dos dois copos vazios por um longo tempo. Então, eles conversaram sobre morar juntos, sobre um apartamento para dois. Enfim, eles conversaram sobre um futuro a dois.

     Aquele estabelecimento os viu planejar suas mudanças, revisar seus exames, repetir suas oralidades e celebrar seus diplomas juntos.

     Dias depois eles casaram e após o casamento, eles adquiriram o hábito de se estabelecerem no mesmo terraço da lanchonete, até que um dia tiveram que enfrentar uma nova situação, pensar em fazer um empréstimo bancário, encontrar um emprego em potencial, consideraram a compra de um carro. Aquele era o lugar ideal para reflexão, discussão, e, muitas vezes outras decisões.

     Passados alguns meses cada um chegava por conta própria. Ele saia do escritório, ela do consultório médico. Ele tenso, impaciente. Ela radiante e animada. De uma só voz, eles pediam os refrigerantes habituais e de repente, ela disse que estava grávida fitando nos olhos dele. Ele permaneceu em silêncio por um longo tempo, pegou as mãos dela, e afogou-se em seu olhar...

     O tempo passou. O terraço, a mesa, as cadeiras eram sempre o lugar especial, quase que um ritual para eles. É ali que eles resolviam a maioria dos eventos importantes de suas vidas, em torno dos dois invariáveis copos de refrigerantes.

     Dez meses depois eles pegavam mais duas cadeiras para colocar o moisés com o bebê. Outras vezes, eles só ficavam ali por alguns instantes, não mais que por tradição, eles bebiam, pagavam e saíam rapidamente. Algumas palavras apressadas e depois diziam: “conversaremos sobre isso hoje à noite”, e saíam quase que correndo de volta para casa.

     Cinco anos se passaram, dia após dia e ele ainda se lembrava do primeiro encontro em torno daquela mesa, ou talvez de outra. Mas foi naquele mesmo local depois das aulas onde tudo começou. Ontem, ele olhou de longe para o grande arco de entrada da universidade, lembrou-se do caminho até ali, lado a lado com aquela moça, sem uma palavra e com as mãos trêmulas, ele tomou uma Coca-Cola sozinho. Então, seu olhar ficou confuso e ele voltou para casa.

     No dia seguinte, o campus, a rua, o terraço em si, tudo ficou embaçado pelas lembranças já bem distantes. Ele colocou os cotovelos na mesa, colocou a cabeça entre as mãos e pensou que cinco anos se passaram, cinco anos vivendo com ela, casaram-se e tiveram um filho. E então, na noite anterior, ela anunciou a ele que estava saindo e que o estava deixando…

     Ele não soube o porquê, não escutou ou não quis entender. Hoje, ainda pela manhã, o garçom veio e colocou dois refrigerantes sobre a mesa porque ele pediu exatamente dois refrigerantes como antes ele pedia.

Foi então que ele viu que não havia mais razão para dizer: “Garçom, dois refrigerantes, como sempre”.

 

 

Fim.

 

 

 

 

Aronedla
Enviado por Aronedla em 18/03/2024
Código do texto: T8022907
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