Gabriel

Não vejo graça nas coisas que sustentam a terra. Eu deito sob o sol, sinto a grama, o cascalho... Sinto o vento. Olho para o lado, vejo você, tão lindo, livre, de olhos fechados, com o sono leve quase como o da terra cansada de guerra. Sinto a sua pele grossa, seu cheiro. Vejo os seus sinais, e a sua história nas marcas da pele, como um mapa. Percorro suas costas com as pontas dos meus dedos, um caminho único, quase que de uma sabedoria infinita e intensa. Seu cheiro passa pelos meus dedos, percorre sobre mim, sinto o fundir ao meu desejo de estar aqui. Meu coração bate com força, e lento simultaneamente para indicar essa paixão. Sua penugem se arma, e consigo ver o seu sorriso.

Seu ombro descascado do sol, se arma, você se espreguiça na sua confiança. Talvez seja o dia de sol, ou Petrópolis. Aqui guarda um segredo ancestral. Talvez os nossos, ou não.

Eu não guardo muitas promessas. Tenho pensado no agora, na fé, em mim. Em como tenho me sentido, na vida após os trinta, na sua vida após os trinta e sete. Na nossa conversa escorado, fugindo da chuva, e em como você demorou para sentir estar na idade em que se encontra. Te vejo livre, como disse, mas cheio de regras, de futuros desaguados, e a falta de perspectiva, mas sempre se agarrando a fé, com medo.

Digo a mim, que tenho pensado em você, e acho que isso não é mais um segredo. Te digo que gosto de você, e que acreditava isso ser um segredo. Você sorri e diz que gosta mim, e que não é oculto. Eu penso sobre o medo, mas acho que é a forma como o futuro se molda. Penso que o medo pode ser um freio, e que às vezes isso pode ser bom.

Me pedo muitas vezes confuso, mas concluo que não preciso ser forte o tempo todo, ou um auto saber absoluto de mim. Até porque, nós mudamos os movimentos todo o tempo, ou deveríamos. Aprendi a gostar do novo. Tenho tentado não focar mais tanto no dentro, e também olhar para fora. Percebi que olhar tanto para si às vezes vezes a vida fica chata, assim, cheio de eus. E aqui, nessa grama não existe só eu. Mas, também você, ali, deitado do meu lado, dormindo com os pés buscando os meus, talvez vulnerável, e é só. Eu tenho aprendido sobre como afastar o que ainda nem veio, e tentado te olhar como você é, com esse sorriso confuso, e que parece estar no mesmo barco, tentando se encontrar e me encontrar no meio disso tudo. Te digo que queria ser diferente, mas que não consigo. Talvez essa diferença seja em você me notar bem da forma como eu sou, sem medo de erros ou acertos. Só sendo eu. Acho que é assim que o medo surge, da minha falta de vulnerabilidade.

Não quero ter mais medo, mas eu nem sei que medo é esse. Na verdade, acho que sei, e tenho mais medo ainda de aceitar. Eu procuro no profundo, porque estou sempre em busca do palpável. Mas ao mesmo tempo, eu acredito que o que é material nem existe. Você ri, e me diz que isso é uma coisa muito doida. Eu concordo. Olho para cima, vejo as nuvens corajosas, que passam. Penso que talvez seja mais fácil ser um nuvem, e quando eu gostei do que foi fácil?

Yuri Santos
Enviado por Yuri Santos em 15/11/2022
Reeditado em 03/12/2022
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