A moça do cântaro vazio

Lá vinha ela com o cântaro na cabeça.

Sempre sorrindo.

Um lindo sorriso ainda que tímido.

Uma moça simples, mas de uma beleza bem brasileira.

O vestido que ela usava era como um embrulho de seda em volta de joia tão delicada.

O cabelo cacheado brilhando ao sol, descia como uma cachoeira negra sobre seu belo corpo, exalando perfume de flores por onde passava.

Ele rápido se apressava tentando achar alguma coisa para fazer perto do portão.

Só pra ver ela passando, ainda que a olhasse de um jeito disfarçado.

Boa tarde moço, ela sempre dizia.

Ele respondia do seu jeito costumeiro.

Tarde moça, acenando com a mão suja de graxa.

E lá ia ela em direção a caixa d'água da vila, sempre no mesmo horário.

E ele ficava pensando, ainda peço um gole de água pra ela ou quem sabe um beijo.

Mas ele logo tratava de tirar tal pensamento da cabeça por pensar que moça tão linda jamais daria conversa pra ele.

Se aquieta coração ele dizia.

A moça é de família e eu sou um rapaz direito, jamais me engraçaria pro lado dela.

E, seguia com seus botões.

Imagina se uma moça tão bonita iria ter algum interesse num simples mecânico que nem eu. Bora trabalhar, ele resmungava.

E ia entrando na oficina quando percebia de canto de olho ela voltando.

As crianças da vila corriam e pulavam em volta dela pedindo água.

De um gole de água pra gente moça, elas diziam.

Não posso dizia ela, se desvencilhando deles sem derramar uma gota no chão.

Era até estranho pra ele, ela negar água pras crianças.

Mas esse pensamento logo passava e ele fingia estar ocupado com alguma coisa, até  ouvir a voz delicada.

Até amanhã moço.

Até, respondia ele com um sorriso acanhado.

E, lá ia ela com o cântaro na cabeça e o sorriso no rosto.

E ele ficava ali, que nem bobo, serviço por fazer e ele esperando ela sumir na distância.

O coração apertava, mas ele jurava a si mesmo que não era amor, era só afeição.

E voltava a seus afazeres com a moça no pensamento.

Mal sabia ele que ela passava ali, não era pra buscar água.

Era só uma desculpa, pra poder ver o moço de quem gostava.

Um moço simples, porém trabalhador, que lhe roubara o coração.

O moço de quem sonhava um dia ser namorada.

Buscar água era só um pretexto.

Porque ela sempre voltava com o seu cântaro vazio.

Mas,

      o coração,

                esse sim voltava transbordando,

                               se derramando 

                                                            de amor.