Quando o amor acontece

Atravessou a Presidente Vargas desviando dos carros apressados. Na outra calçada, uma dezena de bares com as portas abertas. Ofuscada pelas luzes coloridas, caminhou três quarteirões. O salto do scarpim enroscava nas pedras soltas do calçamento. A bolsa seguia abraçada ao peito.

Buscou na memória a última vez que tinha saído sozinha. Só encontrou as lembranças dos dias felizes. Passeios de mãos dadas à beira-mar. Promessas de um amor que seria para sempre. O nome de Sérgio tatuado em seu peito, marcado na pele amadurecida de seus quarenta e tantos anos.

Como tinha se enganado outra vez? Nunca se cansava de quebrar a cara? “Quero viver outras coisas”, ele havia dito.

Escolheu “O Cafofo”. Precisava mesmo se esconder, se enfiar em algum lugar onde pudesse mergulhar na solidão que pulsava dentro dela e doía.

Antes de entrar, alisou o cabelo desbotado com as pontas dos dedos. Procurou na bolsa o batom preferido, olhou para trás. E se ele aparecesse, dizendo que tinha se arrependido? Se pedisse pra reatarem? Suspirou. Dois meses já, assim como os outros, ele não voltaria mais.

Passou entre as poucas mesas ocupadas. Sentou junto ao balcão de pedra e madeira envernizada. Um cantor de voz rouca, cantava músicas românticas. Pediu uma cerveja. Depois quis algo mais forte.

Na terceira dose de vodca, jurava para si mesma que tinha sido a última vez, convencida de que amor não era pra ela. Viveria para o trabalho e a família. Tinha um pai doente, uma irmã com depressão profunda.

Demorou a notar o homem na ponta do balcão, olhando em sua direção. Só percebeu quando ele sorri, oferecendo uma bebida.

Virou a cabeça para o outro lado, quase derrubou o copo. O garçom tocou seu braço.

- O rapaz lá da ponta pediu seu telefone.

Jogou o cabelo para o lado, coçou o queixo, quando deu por si, rabiscava o número do celular num pedaço de papel. O rosto iluminado, outra vez.

E se ele fosse o homem de sua vida?