Amor? Balela

“O que é o amor? Talvez eu acreditasse em todas as suas formas, menos uma; o amor romântico. Eu tinha a resposta para essa pergunta, o amor machuca, é como uma rosa cheia de espinhos que só pode ser observada, jamais colhida. Uma rosa que se você ousar pegar vai abrir feridas e sangrar, e talvez sangre muito.

Muitos me chamam de fria, mais ninguém nunca quis saber porque eu não acredito no amor. Ninguém nunca se interessou, queriam apenas me rotular. Diziam que no lugar do coração eu tinha mandado exportar um pedaço da geleira do pólo norte para colocar no lugar. A verdade é que eu já acreditei no amor e isso me jogou no abismo, quase destruiu a minha vida.

Há alguns anos eu era noiva e estávamos prestes a nos casar, já havíamos começado a organizar os preparativos para a festa. Um dia eu acordei e ele simplesmente não estava mais lá, havia me deixado apenas um bilhete, um mísero bilhete escrito as pressas em um pedaço de folha de caderno. Ele me disse que não conseguiria fazer aquilo, que não poderia se casar. Me recusei a ler a parte que ele falava que sentia muito.

Me lembro que chorei durante toda a semana sem parar. Pedi demissão da faculdade que dava aula de biologia molecular e me tranquei em casa, me sentindo um lixo, destruída por dentro. Lembrar de tudo que ele me disse, de todas as promessas que havia feito, fazia meu estômago revirar, sentia ao mesmo tempo nojo e uma dor que nunca pensei que fosse sentir.

Eu nunca entendi porque ele me disse tantas coisas lindas para simplesmente abandonar. Por que ele me fez amá-lo se não tinha intenção de ficar? Quando se entra na vida de uma pessoa você também é responsável pelos sentimentos dela. Ninguém jamais deveria brincar dessa forma.

Por seis longos meses a única coisa que fiz foi chorar e me perguntar onde eu tinha errado, se era minha culpa minha vida ter se tornado um caos. Eu levei muito tempo para entender que o problema não estava em mim e mais tempo ainda para começar a seguir em frente. Me mudei para o interior, deixei aquela Adriana para trás e jurei que nunca mais amaria de novo. E consegui, até encontrar uma pessoa.

A conheci em uma feira de ciências na escola que eu dava aulas. Eu estava acordada desde às cinco da manhã correndo de um lado para o outro com os experimentos dos alunos, arrumando salas e respondendo a perguntas intermináveis de alunos ansiosos. Às nove horas quando ela ela chegou eu já estava exausta e havia pelo menos mais três horas de feira pela frente.

Ela conversava com um dos meus alunos quando me aproximei.

“Professora”. Ele tinha um sorriso no rosto e o cabelo bagunçado como sempre.

A mulher se virou na minha direção. Ela tinha os olhos verdes como os dele.

“Eu não sei que milagre você conseguiu fazer, mas a sua matéria é a única que ele leva realmente a sério.” Ela me disse, seu tom de voz parecia aveludado.

“Ele é um bom aluno.”

“Viu só, tia, eu sou um bom aluno.”

“Nessa matéria, e nas outras?

O sorriso sumiu do rosto dele e mostrou um careta para ela. Não consegui segurar o riso.

“Foi um prazer te conhecer.” Estendi a mão em sua direção, olhando para a bancada ao lado.

“Meu nome é Michely.”

“Adriana.”

Nos encontramos por mais três vezes depois desse dia, não combinávamos nada, apenas coincidia de nos encontrarmos. Nas duas primeiras vezes tivemos uma conversa bastante amigável, mas nada muito demorado, já na terceira vez, como dizia minha mãe, o caldo entornou.

“Eu acho tão bonito quando um casal consegue ficar juntos por tanto tempo sem deixar o amor morrer.” Ela me disse ao ver um casal de idosos atravessar a calçada, pela janela.

Já passava das seis horas e estávamos em uma padaria tomando café. Eu olhei para aquele monte de cabelos brancos ambulantes e senti uma pontada de inveja.

“Talvez não se amem, talvez estejam juntos para cumprirem o acordo que fizeram um paro o outro.”

Ela me olhou como se eu tivesse dito a maior blasfêmia do mundo.

“Ninguém fica junto por tanto tempo sem amor.”

“É ai que você se engana.”

“Como você pode não acreditar no amor? Não tem sentimento mais bonito que esse.”

“Isso para você. Só porque você coloca o amor acima de qualquer coisa, não quer dizer que os outros façam o mesmo.”

Ainda me lembro da naturalidade com que falava tudo isso e da expressão horrorizada que ela me olhava.

“O que seria mais importante que o amor?”

“Ter um trabalho digno, comida na mesa, um teto para morar.”

“Isso parece tão… banal.”

“Se comer for banal, então não coma.” Não consegui segurar a risada e isso a deixou ainda mais irritada.

“Você é fria.” Ela me mostrou uma careta.

“Se ganhasse um real para cada vez que escutei isso estaria rica.”

Eu olhei na direção da janela e fiquei em silêncio, ela me olhou o tempo inteiro.

“O amor não é tão importante assim quanto você pensa. Muitos conseguem viver sem amar alguém.”

“Mas essas pessoas são felizes?”

“Felicidade é um conceito relativo. Felicidade para você com certeza não é a mesma para mim.”

“Não tem como conversar com você sobre isso.” Ela cruzou os braços sobre o peito e se jogou para trás na cadeira.

“O amor nunca leva ninguém a lugar nenhum.”

“Você é uma cética e amorosamente rabugenta.”

“Rabugenta é a sua mãe!” Me levantando irritada.

Dei as costas para ela e sai logo em seguida. Aquele comentário me irritou de tal forma que mesmo depois de ter chegado em casa ainda fiquei por um bom tempo remoendo aquela conversa. Se for mesmo verdade o que dizem que quando a orelha esquerda começa a esquentar tem alguém falando mal de você, a orelha dela deve ter pegado fogo.

Ficamos por três meses sem conversarmos e nem ver uma a outra, até o dia que ela me ligou. Relutei em atender a ligação. Ela ficou muda por alguns instantes e pensei em desligar, mas não o fiz.

“Oi, eu queria pedir desculpas por aquele dia. Eu não devia ter falado aquilo para você.”

Joguei o livro que estava lendo sobre a mesinha de centro. Lembro que meus dentes estavam trincados naquele momento.

“Você deve ter seus motivos para pensar dessa forma e eu não tenho o direito de te julgar.” Continuou.

Ela parecia estar realmente arrependida.

“Ninguém tem, mas todos julgam mesmo assim.” Disse de maneira seca.

“Me desculpe por isso.”

“Tudo bem.”

“Será que a gente pode se encontrar?”

Levei algum tempo para responder.

“Eu tenho algumas provas para corrigir essa semana, mas na sexta eu já estou livre.”

“Eu posso ir até a sua casa se quiser.”

“Vou te passar o endereço.”

Eu não costumava fazer isso, mas fiz. Encerrei a ligação, joguei o celular sobre o sofá e deitei, olhando para o teto

Ela foi extremamente pontual, às oito a campainha tocou e ela apareceu com o cabelo preso da mesma forma que havia visto na feira de ciências, um “rabo de cavalo” alto com uma mecha fina pendurada no lado esquerdo do seu rosto.

Michely se sentou e eu fui até a cozinha pegar alguma coisa para a gente beber, só havia suco de laranja na geladeira. Me esqueci completamente de comprar alguma coisa.

“Você gosta de suco de laranja?” Perguntei ao retornar com os dois copos em mãos.

“Gosto.”

“Eu esqueci de comprar outra coisa.”

“Não tem problema.”

Eu entreguei o copo a ela e Michely deu um pequeno gole, em seguida colocou o copo sobre as pernas e o segurou com as duas mãos, olhando-o.

“Eu sinto muito pelo que disse aquele dia.”

“Você já se desculpou.”

“Eu sei, mas precisava fazer isso pessoalmente.”

Seus olhos verdes me encaravam e confesso que fiquei sem saber o que falar.

“Eu não costumo agir assim, não sei o que deu em mim.”

“Você não precisa se explicar.” Eu segurei seu braço, mas rapidamente puxei minha mão de volta.

“Eu preciso fazer isso. Talvez eu quisesse que você acreditasse no amor, talvez não, eu queria que você acreditasse no amor.”

“Mas por quê?” Isso não faria qualquer diferença para você.”

“Faria.”

Eu a olhei um tanto surpresa e assustada, e ela continuou.

“Eu me apaixonei por você.”

O silêncio preencheu toda a sala.

“Por favor, diga alguma coisa.”

Eu realmente não sabia o que dizer. E foi ai que fiz uma coisa que jamais pensei que fosse fazer. Eu a beijei! Quando nossos lábios se separaram foi a vez dela me olhar assustada. Sua boca estava entreaberta e ela parecia querer me dizer alguma coisa, mas talvez não soubesse o que e nem como.

“Não diga nada.” Eu disse, colocando os copos sobre a mesinha de centro.

E a beijei mais uma vez. Michely me fez acreditar, me devolveu a esperança e eu decidi agarrar. Hoje eu posso dizer com toda a certeza que o amor sempre vale a pena.

Recadinho: Sou estudante de roteiro e estou começando a dar meus primeiros passos na elaboração de roteiros, de curta e longa metragem. Se alguém tiver interesse em fechar uma parceria, tamos ai 😉. Se conhecerem alguém que precisa de roteirista e puderem me indicar, agradeceria muito.

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Alice Moraes
Enviado por Alice Moraes em 20/12/2018
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