Cansado de guerra

A parede do meu quarto está cheio de flores cor de rosa. Acho um tom que dá tranquilidade e ao mesmo tempo traz felicidade. Em falar em felicidade, outro dia reli um livro da Katherine Mansfield com essa temática. Eram coisas sobre bambolê, ruas de paralelepípedo, algo vintage demais para retratar uma felicidade. E então eu caí em uma felicidade clandestina, como Clarice Lispector, ou em Lullaby, com the Cure. Tenho escutado bastante as músicas de Robert Smith e seu grupo. Nada me falta aqui, mas e agora?

Tenho sonhado bastante com você nos últimos dias. No último sonho você me olhava desarmado, desprotegido. Eu arriscava um beijo, você retribuía e me olhava como quem queria perguntar "e agora, o que faremos?". Eu tenho como quem quer uma chance, e acaba. Não sabemos como será no próximo dia, ou se será certo ou errado, penso que são expressões pouco compreendidas, mas relativas. Se você analisar bem, o que foi certo para mim não foi para você,e o contrário. Mas o pretérito não está mais aqui, passou. E onde estamos agora?

Conheci um rapaz que me forçou o entendimento das coisas. Eu pude compreender tanto, pude me entender principalmente. O Thiago forçava muitos porquês, e então eu entrei na conclusão de que os porquês só existem porque os colocamos ali. Não me parece muito significativo os porquês agora. Penso que o que me faz falta falta, de fato é você, na pessoa como você é.

Seu aniversário passou esses dias, o oitavo dia do mês de agosto. Quis te ligar, foi um dia duro. Então eu resisti. Acho que você não se importaria muito. Mas penso também que isso pode significar nada, pois eu não quero me colocar em uma situação piedosa. Acho algumas fotos que imprimi, e estamos lá. Lembra da foto que tiramos na entrada da ALERJ, no carnaval? Eu queria muito outro abraço daquele. Pensei na conversa que tivemos sobre sua transmutação de menino para homem. Penso quantas vezes me senti assim. Mas o que é ser homem? Não importa. Estou um pouco cansado.

Retomo meu trabalho em dois minutos. Estou sentado atrás da Candelária. Ouço as pessoas brigarem por uma senha na DPU. Aparentemente muitas pessoas gostam de estar próximas do CCBB/RJ. Acho que me acostumei a esse cenário, assim como eu acostumei ao cenário de você não estar mais preenchendo os meus dias. Ontem, domingo de dia dos pais fiz o nosso almoço da preguiça. O mesmo rizoto de sempre. Eu já não o fazia desde quando nos deixamos. Também era domingo, lembra? Aposto que lembra. Me senti criando referências para a vida. Você indo embora, você ficando, nós nos beijando, você se excitando, você me deixando de vez. Quase morri. Por muito tempo eu pensei que o universo estava me punindo. Hoje penso que sou louco, que não sei como agir diante de tantos acontecimentos. Tem dias que sequer lembro que você existe, mas quando lembro o ar para, penso que não tenho tanta sorte de nunca mais acordar. E então eu durmo, mas não como eu quero, não para sempre.

Estou cansado de brincar nessa guerra. Ontem o carro quase saiu da pista, foi um descuido, eu estava em equilíbrio. Me parecia um dia bom, tinha o rizoto, meus amigos, e você estava no pensamento, mas eu estava bem. Vi um filme, já não o fazia há alguns meses. Ouvi algumas músicas, também não o fazia há alguns meses. Fiz bolos, sucos... Um fato novo sobre mim é que adquiri um gravoso gosto por frutas. Tenho feito muitos sucos. No café da manhã criei o hábito de querer sentir o gosto da laranja chupada descendo pela minha garganta, fundindo-se ao café. O dia parece começa e acabar ali. Então eu paro, respiro, abro as janelas de casa, o ar gelado entra, as folhas se reorganizam no quintal, a Urca grita. Eu mantenho firme outro dia.

Yuri Santos
Enviado por Yuri Santos em 13/08/2018
Reeditado em 13/08/2018
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