Histórias Para Lembrar

[Olá, esse é meu primeiro texto não argumentativo ou poema. Então já começo me desculpando por alguma falha, seja nas falas, no passar do tempo no texto e na falta detalhes.]

Uma grande nuvem entrou na frente do sol e causou uma grande sombra. Pedro aproveita a chance e aperta o passo para chegar logo em casa. Ele carrega na mão o resultado que acabara de buscar no hospital, por achar bobo o motivo da consulta, ele nem se dá ao trabalho de abrir lá mesmo e espera para abrir na frente de seus pais e de Luiz que tanto pediram e lembraram para ele fazer o bendito exame.

Ao chegar no portão de casa, ele agradece em mente pela curta distância de lá ao hospital, até mesmo agradece o tempo que estava nublando. Cumprimenta as visitas de sua mãe na sala e a chama para junto de seu padrasto, abrirem o resultado com eles. Ao abrir com toda ansiedade, Pedro lê em voz alta o aquilo que deveria ler para si e depois revelar para seus pais, mas ele lê rápido e alto apenas dois pontos:

”RESULTADO CONFIRMADO”

”CAUSAS: PERDA DE MEMÓRIA”

E ao terminar de ler aquilo e levar as mãos ao rosto, deixando o exame cair na mesa, Pedro vê em segundos boa parte de sua infância com sua família, das viagens e do tempo de escola, dos amigos e de seus momentos com Luiz. Enquanto abaixa a cabeça na mesa, tenta sem chances agarrar esses momentos para que eles nunca se percam.

– Mas o que isso quer dizer? Como podemos tratar? – Diz seu padrasto Tom com um tom beirando a preocupação enquanto aquecia as costas de Pedro.

Então Pedro levanta a cabeça e percebe as visitas correndo de volta para sala e os rostos de seus pais, ainda em choque porém confusos.

– Eu acho que…não sei, só peguei o diagnóstico…achei que não ia ser…não contem para o Luiz sobre isso.

– Filho – disse sua mãe com o maior tom de doçura – nós te amamos, o Luiz também e todos vamos te dar o apoio que precisar.

Houve uma pausa e um aceno da cabeça de Pedro que pediu um tempo para pensar e ir deitar. As visitas ainda sem entender o cumprimentaram mas ele continuou seu caminho para o quarto.

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Acordou. Viu-se deitado agarrado das pelúcias de infância e observou o quarto azul cheio de fotos reveladas com seus amigos, familiares e é claro, Luiz. Olhou por uns 25 minutos que foi deduzindo enquanto observava como se tivesse intenção de guardar cada detalhe daquele lugar e guardar para si o resto da vida. Já deveria ser 7:30 horas da noite e só lembrava de seus pais lhe dando apoio hoje mais cedo, então por um momento, sentiu-se tão confortável e esperançoso que tudo deveria ficar bem, que quase não se importou com o diagnóstico. Fingiu que era uma matéria de jornal que ele só iria ler em anos.

Já estava na hora de dar sinal de vida, seus amigos estavam o esperando responder as mensagens, porém o medo de contar a verdade e ser cercado de tantas preocupações, curiosamente o preocupava. Não queria alugar ninguém com suas coisas, não achava estar bem na hora para contar, porém sarcasticamente diz a si mesmo que se não for em breve, ele acaba esquecendo de contar.

Desce e vai para a sala e olha seus pais como se nada tivesse acontecido, abre as mensagens e começa a responder como se aquele fosse um dia normal e típico. Ao ser perguntado se já teria contado para Luiz, ele pensa por um momento: ”Depois de tanto que lutei para ficarmos, vou perdê-lo? Depois de tudo de lindo que fizemos e as coisas que enfrentamos, vou esquecer de tudo?” e com uma falsa calma ele responde que ainda não.

Então o chama para conversarem, embora estive meio tarde, eles moravam bem próximos e qualquer coisa se a conversa estendesse, eles podiam dormir juntos e ir para o colégio juntos já que sempre se encontravam no ponto de ônibus. Voltou para o quarto e foi para a janela onde estavam seus vasinhos de flores, seu sonho era deixar o lado de fora de sua casa, parcialmente coberto por plantas e flores.

Luiz chegou todo ensopado da chuva que do nada começou, chegou em casa já tirando os chinelos e cumprimentando seus sogros e perguntando por Pedro, mesmo notando um clima meio diferente, o sorridente garoto brinca e vai ao encontro de seu namorado. Ao abrir a porta e entrar sem fazer barulho, ele para o lado da porta e observa como era lindo a visão de Pedro olhando para a janela, que de repente ele se vira e o chama para lá.

– Como foi hoje, amorzinho? E o exame hein? – ele pergunta com seu típico sorriso bobo de lado.

– Ah eu peguei, pois é, foi bom e o seu? – diz Pedro desconversando.

– Trabalhando na loja, mais uma bicicleta, menos uma…tudo na mesma? Como estão as coisas? O que o médico disse?

– Não disse, acabei pegando o resultado com a assistente dele, acho que ele teve que sair – e apara ao ser interrompido.

– E o que ela disse? – Luiz pergunta com certa preocupação.

– Não disse, eu peguei e vim correndo – Ele fala com nervosismo.

– Você pegou o exame e saiu, tá bem…e o resultado, bebê?

– Sim, o resultado diz que tenho alguma doença que causa perca de memória…

– Perca de memória? – Luiz o corta rapidamente.

– É…não é louco isso? Uma doença e ”pá” formata tudo da cabeça…

– E seus pais?

– Ah, eu contei e eles disseram que vai ficar tudo bem e tal.

– Sabe se isso é de família?

– Não… – respira de forma pesada como se tivesse evitando dizer algo – na minha família não tem histórico de doenças, de nada…por favor me abraça.

Parecia que o melhor lugar para ambos era dentro de um abraço, daqueles sem vontade de sair ou de ser rápido. Os meninos sentaram a cama para conversar melhor e depois deitaram. Quando se calaram apenas ficaram ouvindo o barulho da chuva, desejando que toda aquila história de doença fosse levada embora.

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Já haviam se passado alguns meses desde que a doença que causaria perca de memória em Pedro foi revelada. Toda sua família e seus amigos, estavam empenhados em lhe ajudar com tratamento e é claro, muitos momentos divertidos e fofos para se ter antes que ele começasse a esquecer, mas como a tia Lurdes de Pedro passou a repetir e usar como mantra:

– Não tem problema esquecer, o que foi bom a gente conta repetidas vezes…o que foi…aaaah a gente grava um vídeo contando para não chorar mais.

Embora soubesse que a doença só viria a afetar Pedro em alguns anos, Luiz resolve comprar um caderno que a capa era azul, a cor favorita de Pedro. Lhe presenteou no seu aniversário de 23 anos:

– Eu achei linda a capa, achei o amarelado das folhas bem pastel…vai dar um ar de cult para suas memórias…

– Um caderno? Memórias? Luiz, o que você tá aprontando? – Pergunta enquanto recebe um abraço de Luiz.

– Não tô aprontando nada ué, vejo todo mundo lembrando as coisas para você…queria que anotasse as coisas importantes.

– Para não esquecer de nada, não é?

– Para não se esquecer do porquê te amo.

Após ouvir aquilo, saberia que se pudesse escolher as coisas que jamais queria escolher, eram coisas daquele dia: o abraço de Luiz e o caderno vindo com prova de amor. Ele nem mesmo pensava mais no que tinha lido em sites, sobre crises na qual até sua higiene pessoal seria problema em breve. Ele sabe agora que para sempre poderia contar com a ajuda de seu amor verdeiro.

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Mesmo dando os primeiros sinais de sua doença, Pedro trabalhava e saia bastante com seus amigos. Não ficava muito tempo sem frequentar seus pais, agora que ele morava junto a Luiz. Apesar de continuar anotar sem parar nos caderninhos que comprava, algumas vezes seus amigos o ajudavam quando saiam. Perguntava bem baixinho (”- Qual o nome dele mesmo?” ”Conhecemos de onde, eu não lembro?” ”Tem amigos em comum? Se sim, fala rápido.”. Sorte ter a companhia fiel de amigos feito Felipe para sempre o ajudar, afinal ele odiava ter que se explicar a cada nova pessoa.

Odiava ter que ouvir as mesmas coisas mesmo quando eram ditas de coração, cansado de ser o homem de 33 que tinha uma doença, que o faria esquecer de tudo. Porém, seus dias estavam delicados, Pedro começava a apresentar lapsos de memória no seu trabalho o que vinha o comprometendo. Contudo, sua equipe de amigos sempre o guiavam para que isso não parecesse tão ruim. Pedro poderia ficar tranquilo por lá.

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O anos se passam, 20 anos depois e a família de Pedro continua com o costume de lhe contar histórias que eles não sabem que estão sendo escritas nos misteriosos cadernos que ele vai guardando nas gavetas da cômoda. Com 54 anos, atenção dele vai ficando cada vez mais deslocada, mais lenta. Algo que espantava até mesmo os médicos. Afinal, a doença descoberta estava progredindo cada vez mais mostrando resultados.

Haviam dias em que num simples passear com seus sobrinhos, ele se perdia. Quase não poderia mais andar sozinho, afinal só lembrava o endereço completo de sua casa. E por não querer causar discussões, ele passou a sentar na praça em frente a casa, ficando lá por horas.

– De uns dias para cá, temos que ir buscá-lo porquê ele acha que acabou de chegar…mas é de noite, Luiz. Ele fica por horas lá mas nem se lembra mais…

– Seu irmão está ficando cada dia mais esquecido, quero largar do serviço para passar mais tempo com ele.

– Mas sem dinheiro? E os medicamentos? Podemos contratar alguém.

– Eu sei, Elis, por isso meu medo. Ele se lembra de tão pouco e estou trabalhando quase o dia todo, fico com uma sensação ruim.

Pedro começou a ter crises de pânico algumas vezes por mês. Numa simples hora, ele simplesmente não se lembrava de nada e começava a chorar e gritar por isso, muitas vezes não lembrando de quase ninguém. Após recobrar parte das memórias, ele ia ficando mais calmo e paciente. Luiz que nunca se cansava de tentar ajudá-lo, fica o tempo todo que podia abraçado a ele.

Por causa da doença, optaram por não terem filhos. Apesar de considerarem os sobrinhos e afilhados de ambos como os seus filhos. E também foram morar na casa de Elis, com os pais de Pedro. Assim Luiz achou melhor, já que ele trabalhava e em casa teria mais pessoas para distraí-lo.

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Depois de muitas pesquisas, foi lançado comercialmente um novo remédio que poderia suavizar o problema de memória de Pedro. Toda a família se juntou para poderem comprar já que custava tão caro e era tão pouco. Eles sabiam que o esforço valeria a pena, afinal se piorasse, Pedro poderia vir a óbito.

3 meses após começar com o tratamento com o novo remédio, ele já apresentava melhoras surpreendentes. Estava cada vez melhor e voltara a ter o mesmo sorriso de quando era jovem. Já não esquecia tanto e curiosamente voltara a ler seus cadernos guardados na cômoda.

– Ora, Pedro. São 6hrs da manhã, você não foi dormir? – Pergunta Luiz chegando na cozinha.

– Eu me lembro! – Disse Pedro suavemente.

– Lembra de que? Você precisa ir dormir. – Diz Luiz preocupado.

– Lembro do nosso primeiro café da manhã na cozinha dos meus pais, eles estavam tão orgulhosos que finalmente eu encontrei um amor, lembro de você ter escondido os ovos na páscoa mas eu acabei descobrindo antes, lembro até mesmo da sua formatura que eu cheguei atrasado…

– Pela morte da sua avó…eu lembro e lembro do quanto te amo – Diz ele quase chorando.

– Eu anotei toda minha vida nesses cadernos. Eu hoje posso lembrar de tudo sem precisar ouvir, você me deu isso, você me deu o que vinha depois de tudo. Eu te amo.

E os dois se abraçaram como talvez nunca tão emocionados em anos. Como se uma parte que faltava neles, tivesse voltado com tanta força e com tanta glória.

Então Luiz abre um sorriso e pergunta:

– Todas essas coisas você tinha anotado ai? Não quero ler o que escreveu de mim hein, sabe que sou tímido.

– Escrevi todas as memórias. Porém duas coisas em especial:

E abre um caderno azul que rapidamente lembra Luiz de ser o primeiro, o caderninho que presentou pedro em seu aniversário.

– Abre na primeira pagina – Disse Pedro sorridente.

Ao abrir, Luiz viu uma foto sua ainda jovem, tinha seu nome completo e dados de quando tinha 19 anos, estavam rasurados e pelo visto Pedro tinha consertado.

– Olha atrás – Aconselhou Pedro.

Ao virar a pagina ele viu uma foto de Pedro e dados na mesma características que a sua estava, leu atrás da folha de ”perfil”:

AMOR DA MINHA VIDA, SE NÃO LEMBRAR, AME-O COM TODAS AS FORÇAS

E já chorando ele vira a pagina do ”perfil” de Pedro e lê também:

Esse é você, sou eu no caso…VOCÊ É O GRANDE AMOR DO LUIZ

Ao deixar o caderno cair, eles se beijam e abraçam. Descobriram que o que faltava neles, esteve por ali o tempo inteiro. Agradeceram por nunca terem abandonado um ao outro, agradeceram por nunca terem deixado de ser amar em todas as oportunidades. Porquê mais valia as boas memorias esquecidas e anotadas do que todos os dias desperdiçados sem amor, apenas sozinhos e sem terem feitos coisas boas um para o outro.

Essa história, é de quem esquece dos mínimos detalhes. Dos nomes, endereços, números, referências mas não se esquece de querer estar em família, estar com quem se ama e sempre buscar um meio para tudo continuar bem. Sobre dedicação e sobre esperar o melhor por vir.

TEXTO E REVISÃO: Raphael Maitam

Nota: A doença, assim como o remédio para combate dela são fictícias. Elementos usados para dar fundo a determinadas partes do texto. Embora haja o remédio, no ”universo” da história, Pedro não se cura totalmente e volta ao estágio de início da doença. :)

Seja bem-vindo para ler esse poema e mais outros no meu livro disponível no wattpad: https://www.wattpad.com/story/96435471-versos-por-aí