As casas

Acordei num local completamente novo. Mil coisas se passaram pela minha cabeça confusa. No começo, achei que tivesse morrido e ido para uma daquelas camadas inferiores. Depois, notei que as paredes daquela casa eram de um vermelho intenso e que essas se moviam continuamente, enquanto de grandes conduítes transparentes corria um líquido da mesma cor das paredes. Logo notei que podia ver tudo aquilo graças a uma lâmpada que ficava no teto e que iluminava todo o ambiente, da qual saía uma luz instável como a de uma vela ao vento. Andei um pouco mais pela tal casa e num dos cômodos, encontrei uma grande caixa. Ela tinha 7 fechaduras e, felizmente, ao lado dela estavam as 7 chaves que a abriam. Não demorei muito para descobrir o que nela havia e me surpreendi ao ver que havia fotos dentro dela. Comecei a analisá-las e percebi que aqueles eram rostos conhecidos. Eram amigos meus; mais do que isso: eram amigos que eu e o meu amor tínhamos em comum. Comecei a ligar os pontos e, enquanto a ficha caía, achei uma foto minha, que por sinal era a última. Lá estava eu, com aquele sorriso bobo da juventude e sem me importar muito com a antítese da situação, uma lágrima de emoção e saudade rolou do meu rosto. Então, eu juntei as fotos, devolvendo-as à caixa, e, já imaginando onde poderia estar, eu andei mais um pouco por aquele ambiente quente e aconchegante. Havia vários quadros nas paredes. Os que mais me chamavam atenção eram os retratos de pessoas amadas. E a sensação de insegurança foi diminuindo cada vez mais. Entretanto, os pensamentos ainda estavam embaralhados. Como eu poderia estar ali? O que aquilo tudo significava? E várias outras interrogações foram surgindo sem uma explicação sequer. Acima de todos aqueles quadros, lá estava o do meu amor, com os dizeres: “Esse é o meu coração. Aqui é onde eu guardo todas as coisas que gosto e as pessoas mais importantes da minha vida: meus filhos; meus poucos, mas verdadeiros e sólidos amigos e o meu amor, que mesmo longe de mim, ainda tem cadeira cativa aqui dentro. E essa foto representa um dos dias mais felizes pra mim.” A tal foto me remeteu ao dia em que fomos juntos à praia pela primeira vez e eu, meio sem jeito, roubei-lhe um beijo inocente, seguido por outro mais quente e demorado. Meu coração batia acelerado pela emocionante experiência de estar no coração de quem eu tanto amo e saber que ainda estou nele. Surpreendentemente, não havia sinais de mágoa; talvez pela limpeza do tempo e da distância... Assim que li aquilo e me lembrei de mais algumas coisas, eu caí num sono profundo e acordei na minha cama. Acordei de coração leve, mas um tanto inseguro sobre o que fazer diante daquilo. Então, eu liguei para o meu amor. E do outro lado, aquela voz gostosa derramando carinho pela linha. Como ainda podia haver amor? Eu mesmo não entendo, mas talvez não seja isso algo fácil porque o coração tem razões que a própria razão desconhece. Meu convite para irmos à praia foi aceito e assim que nos vimos, a tal chama reacendeu. Tudo se resolveu num abraço, que fez com que “nossas casas” batessem no mesmo compasso. E, verificando a minha, notei que ela também estava lá; sem dúvida um dos retratos mais lindos na minha parede.

Tom Cafeh
Enviado por Tom Cafeh em 04/03/2017
Reeditado em 31/07/2018
Código do texto: T5930503
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