INOCENTE CORAÇÃO - PARTE I

Zé Florêncio era um homem simples. Morava na bela e pacata cidade de Ribeirão de Minas, localizada no interior de Minas Gerais. Tinha uma bela paisagem, cachoeiras deslumbrantes e um povo acolhedor. Zé Florêncio morava em um pequeno sítio. Sempre foi criado no mato. Gostava de cuidar dos animais, ouvir o doce e aconchegante canto de ternura dos pássaros e sentir o cheiro da natureza. Porém, o amor maior de sua vida era Dalva, sua esposa. Amava muito aquela mulher, e ao lado dela vivia os momentos mais felizes de sua vida.

- Ô Dalva, acho que agora essa televisão funciona- disse Zé Florêncio do alto do telhado.

- Desce daí Zé. Já melhorou aqui a imagem – gritou Dalva.

- Tô descendo – respondeu Zé, já com os pés no degrau da escada de madeira.

- Agora eu posso vê a novela Zé. Eu gosto por demais da Rosalina, mais ficar indo assitir a novela na casa dela todo dia não da não.

- Eu faço de tudo pra vê ocê feliz Dalva. Te amo por demais.

- Também amo ocê Zé. Vai lavar as mão que já vou colocar a almoço na mesa.

Enquanto Zé higieniza as mãos, Dalva preparava a mesa.

- Dona Dalva. Eu preciso falar uma coisa pra senhora – disse Manoel com a voz ofegante.

- Que foi Manoel? Parece que viu assombração – respondeu Dalva.

- Foi pior dona Dalva, foi pior que isso. Os homi do coronel tão vindo ai, eu vi eles lá na estrada. E eu ouvi eles falando o nome do seu Zé viu. Coisa boa não é não – disse o menino Manoel.

O menino Manoel era vizinho e amigo de Dalva. Era uma espécie de pombo correio. Estava sempre dando notícia de tudo.

- O que tá acontecendo Dalva? – perguntou Zé Florêncio.

- Aquela história de sempre. Os homem do coronel tão vindo aqui.

- Diacho! Será que isso não vai ter fim mais não? – perguntou Zé a si mesmo.

Os homens do coronel chegaram ao sítio de Zé, acompanhados do delegado.

- Delegado? O que trás o senhor aqui?

- Eu vim a mando do coronel dona Dalva. Tenho ordens dele pra prender o seu marido.

- Prender eu? Uai mais prender eu por quê? Eu não sou bandido.

- O senhor deve saber que não precisa de motivos pro coronel mandar prender alguém seu Zé Florêncio. Mas coisa boa o senhor não fez, porque ele falou da sua pessoa com os olhos sedentos de sangue viu. O homem ta bravo.

- Não, eu não vou pra delegacia coisa nenhuma.

- Por favor Zé, não dificulte as coisas. Você sabe o que acontece com quem ousa descumprir as lei do coronel.

- Ô Zé, vai com o delegado. É melhor assim. Você não tem culpa de nada mesmo.

- Tá bom Dalva. Eu vou porque ocê que ta pedindo viu. E olhe, eu não vou demorar. Me espera aqui.

- Deus te acompanhe Zé.

Depois de ser algemado, Zé entrou na viatura e foi em direção a cidade.

Dalva olhava aquela cena da porta da cozinha. A lenha queimava vagarosamente no fogão enquanto a fumaça cinzenta saia pela chaminé. A fome da mulher foi dispersa por aquele momento indigesto.

Mais tarde...

Dalva foi até a delegacia visitar o grande amor de sua vida. O delegado queria impedir sua entrada, porém acabou mudando de idéia ao ver nos olhos da mulher a tristeza pela qual sentia naquele momento. Penácio era um delegado que fazia a linha durão, mas não podia ver alguém chorando que também sofria junto.

- Ô Zé. Me parte o coração te ver ai atrás dessas grade, feito um bicho dentro de uma jaula.

- Dalva! – disse Zé surpreso – Você veio. Eu pensei que ocê...

- Deixe de bobagem homem. Imagina se eu ia deixar tu aqui sozinho, sem vim te vê.

- A mior muié desse mundo todo é ocê Dalva. Eu amo por demais da conta ocê.

- Trouxe um bolinho de fubá pra você, do jeitinho que eu sei que você gosta. Todo mundo sabe que a comida daqui é uma gororoba neh. E você não pode ficar sem comer.

- Gradecido Dalva.

- Mas... O Zé, você não pode ficar aqui não. Você é inocente. Eu sei que é. Fala logo tudo o que cê sabe pro coronel e fica livre disso tudo.

- Eu já disse pro cê Dalva. Sei de nada da filha do coronel não. Nunca mais eu vi aquela moça pelas redondezas.

- Tem certeza Zé? Você sabe que o coronel é um homem muito poderoso. Ele é capaz de tudo Zé. Por isso de você souber de alguma coisa, qualquer coisa sobre a moça é melhor ocê abrir a boca.

- Parece que ocê não confia neu Dalva. Tenho nada pra falar não.

- Olhe Zé. Eu te amo mais que tudo nessa vida. Eu nem sei viver sem você do meu lado não. Só de pensar no que pode acontecer com você...

- Vai acontecer nada não. O coronel não vai ter coragem de fazer nada comigo não. Pode ficar sussegada.

- Deus te ouça viu, Deus te ouça. E que Ele tenha piedade do cê –disse Dalva.

Dalva e Zé trocaram beijos entre as barras de ferro um pouco enferrujadas da cela onde o caipira estava preso.

No outro dia...

O coronel visita Zé Florêncio na delegacia e exige saber de Lindinha.

- Ora, mas eu vivi pra ver esse dia. Enfim a justiça foi feita.

- Eu quero saber quando eu vou sair daqui.

- Você pode sair daqui sim. Basta você me dizer que fim levou a minha querida filha.

- Mas eu já falei pro senhor, eu não sei nada da sua filha. Nunca mais eu vi ela depois daquele dia.

- Olhe bem Zé. A minha amada filha era a única pessoa que eu tinha na vida. Desde que ela se escafedeu por ai eu nunca mais tive paz sabe. Não durmo direito, não tenho vontade de comer. Eu fico o dia todo olhando pela janela na esperança de um dia ver ela voltar.

- Eu sinto muito pelo coronel, mas eu não posso fazer nada não.

- Você se enrabichou pro lado da minha filha. A coitadinha vivia suspirando pelos cantos da casa, estava apaixonada por um caipira maldito que vive feito bicho no mato. Tanto partido bom na cidade e ela foi logo se engraçar com você.

- O senhor me respeite coronel. Eu gostava da Lindinha, mas ela sumiu sem dar notícias. Se era isso que a sua pessoa queria saber, pode ir embora e mandar me tirar daqui.

- Acho que você não entendeu com quem está falando. Eu sou o coronel. Eu mando e desmando nessa cidade. Essa correntinha aqui era da minha menina e estava a sua casa. O que você me diz?

- Eu nem sabia de correntinha nenhuma. O coronel tá vendo coisa onde não tem.

- Tá certo. Eu dei todas as chances pra você falar. Você vai se arrepender disso seu caipira miserável.

O coronel deixou a cela onde Zé estava e foi decidir o que iria fazer com ele.

No passado, Zé Florêncio teve um romance passageiro com Lindinha, a filha do coronel de Ribeirão de Minas. A moça desapareceu misteriosamente da cidade e nunca mais ninguém a viu pelas redondezas. Ninguém nunca soube o que aconteceu. O coronel colocou toda a culpa pelo sumiço da filha em cima de Zé.

Enquanto isso na igreja...

- Ô Padre Mundinho. Eu preciso muito falar com o senhor viu – disse Dalva.

- É sobre o Zé não é? Eu já soube do ocorrido minha filha. As notícias correm rápido por aqui – disse o padre.

- Eu to numa aflição danada padre. Eu não sei mais o que fazer. O Zé diz que não sabe nada dessa moça, mas o coronel não vai descansar enquanto não dar cabo da vida desse pobre homem.

- Sente aqui minha filha – disse o padre apontando para o primeiro banco de madeira da igreja – O Zé é um homem de bem, eu tenho certeza que ele não fez nada pra essa moça. Vamos entregar nas mãos de Deus, ele sabe o que faz e não desampara nenhum de seus filhos. Tenha fé.

- Ô padre, só o senhor pra dar um pouco de sossego pro meu coração viu – disse Dalva segurando com força as mãos do padre.

Continua...

Luccas Nascimentto
Enviado por Luccas Nascimentto em 16/02/2017
Código do texto: T5914216
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