Como um gato em um telhado de lata quente

Eu o deixei na estação. Eu o deixei na estação do Centro, enquanto te via embarcar na barca e desaparecer na boca do mar. Eu estive lá por quase uma hora, e a praça do Centro de Angra dos Reis ainda era a mesma. Estava sentado com os bolsos cheios de papeis que você provavelmente preencheu com palavras em menos de dez minutos, e então tomou a barca para longe. O sol queimava minhas pernas, a manga da camisa marcava na minha cintura, e eu já não sabia mais o que escondia com os meus óculos escuros, num mundo onde não mais te cabia.

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Você estava do outro lado da grade, enquanto eu embarcava na barca para longe de você e mais perto de mim. O suor escorria pela minhas costas, e eu já não sabia o que era estar só. Te entreguei bilhetes que provavelmente você lerá todos os dias enquanto eu não voltar, e os esconderá dos olhos de curiosos. Você vai segurar suas unidades de paçoca nas mãos, enquanto observar por quase uma hora o Centro da cidade de Angra. E as pessoas vão passar por você, tentando entender o que esconde esses óculos escuros. Eu vou pensar em você e vou querer te mandar mensagens de bom dia, como eu costumava fazer quando nos hospedamos próximo da Lagoa Azul. Mas o telhado está quente agora, e eu não estou mais seguro.

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Volto para o quarto, me deito. Respiro. Estou só. Me levanto e sigo para sentir a areia da Praia Grande. Há duas famílias na praia, e provavelmente, se você estivesse aqui, diria que você teve uma infância como aquela. Eu estaria com os meus olhos fechados, ou observaria, como agora observo, e não há solidão nesse passeio do meio dia. Minhas costas sobre a areia grossa de uma praia de famílias, e estou nervoso como no dia que nos conhecemos: você se escondia atrás do quiosque do ponto final, enquanto me observava rasgar os joelhos da minha mais calça preta reciclável. Você era o mais novo integrante de uma turma de graduação em Geografia, e eu achei engraçado o modo como a tinta vermelha marcou a sua testa.

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Fazia frio a noite quando tentei me esconder de você naquele quiosque oportuno. Você se atrapalhava cortando os joelhos da calça, e eu tentava ler, de longe, o que cobria o nariz da Virginia Woolf na sua blusa. Dentro de mim tudo queimava quando você me olhou e sorriu, e então eu lembrei que estava todo pintado da calourada. Não evitei sair de onde estava, eu simplesmente não conseguia me mover de onde estava. Não me engano, mas há uma coisa que eu lamento, de não ter matado isso dentro de mim. Mas tudo o que faço é esperar.

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L, te esperei por nove noites, e então você voltou com o seu celular no modo "vibrar". De todas as coisas estúpidas que eu disse, nada se comparou ao que eu te disse quando você voltou, mas quando eu senti meu estômago apertar, e minha solidão no passeio noturno vindo novamente, eu não medi as palavras. Às vezes tenho esses sonhos lamentáveis que te fazer ao menos sorrir dos medianos desequilíbrios que é as nossas vidas. Estamos aqui novamente, somando mais uma vontade que talvez não a seja a nossa. Mas gosto do modo como estamos sozinhos.

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Não esqueça tudo sobre isso, Yuri.

Yuri Santos
Enviado por Yuri Santos em 13/09/2016
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