Pintar

Estamos em um lugar muito reservado, só eu e você. Aqui, tudo é especial, simples e absolutamente branco. O objetivo é que nada nos distraia. Quero que sejamos destaque. Neste universo, somos a única circunstância que dá vida à hipótese.

Explore. Ande devagar. Veja as paredes. Veja os modestos móveis que preenchem o cômodo. Repare na branquidão. Repare que, apesar de descolorido, o chão em que pisamos é seguro. Perceba que a temperatura é agradável. Perceba que estamos acolhidos, independente de como. Sinta o agradável cheiro de flores. Sinta-se tranquila, e aguce os sentidos.

Olhe pra sua blusa, pra sua calça. Certamente são brancas. Se não se importa, olhe pra minha camiseta, pra minha bermuda. Garanto que são da mesma cor. Brancas como nuvens.

Por aqui, mocinha, apenas nossas peles esbanjam diferentes tons. Acho justo que façamos o seguinte: eu escolho alguns detalhes e pinto, depois, você me diz o que acha e eu passo a vez.

Seu cabelo, pinto de caramelo. Seus olhos, de verde. Suas bochechas, de rosa. Seus lábios, de vermelho vívido.

A partir de agora, é assim que a vejo. Mais linda do que nunca. Espero que você também me veja, e dessa vez, com as cores que escolheu. Sigamos. Sigamos pelo corredor.

Você vê os quadros? Em todos eles, somos nós dois, nos momentos que imaginei compartilharmos. Não há retratos tristes. Improvável que houvesse. Você vê as molduras? Dependurei todas elas com perfeição. Nenhuma delas está torta, nenhuma delas vai cair.

Enxerga aquela porta? Talvez devêssemos pintá-la de diversas cores. Nesse nosso devaneio, ela merece destaque. É a separação que põe de um lado as histórias que consigo contar, e de outro, aquelas que eu e você podemos apenas vivenciar. Convido-te a entrar, e caso entremos, baterei a porta. Daqui ninguém mais passa, pois aqui a história contada termina.