CARTAS ESCONDIDAS

Mauricéia e Waldemir herdaram a fazenda que fora dos seus antepassados. Eram pra lá mais de 100 alqueires de terra, muitos hoje já invadidos. Aquelas terras que um dia foi plantio de café e cacau, muitos passaram e trabalharam por ali. Provavelmente escravos sofredores a servirem o Coronel, a Sinhazinha, seus filhos, netos e parentes mais próximos. Hoje tudo acabado, eram terras abandonadas a perder de vista. A família foi morrendo, os filhos, dos filhos, dos filhos, atraídos pela modernidade das cidades, foram perdendo o interesse pelo grande patrimônio.

Não se sabe ao certo quantos anos tinha a casa da sede da fazenda. Possuía 8 quartos, um banheiro grande com uma banheira, onde o lodo se achava no fundo formado por um filete de água que teimava em escorrer, assim como na pia. A cozinha com o fogão de lenha, ainda tinha restos de lenha antiga com a cinza velha, e também um fogão de ferro a brasa. A mesa enorme com as cadeiras compunha o ambiente. Panelas dependuradas, os pratos ainda no armário e nas gavetas os talheres de prata, e os copos de cristais ainda bem arrumados no seu canto.

A casa estava fechada há muitos anos. A poeira grossa acumulava nos móveis, espelhos, armários, louças e no chão. As folhas secas e os excrementos dos morcegos, pombos e de outros bichos que passaram a ser os habitantes se via por todo o lugar.

Quando os dois herdeiros conseguiram abrir a enorme porta de entrada que rangeu pelo chão como se os de dentro não quisessem ser incomodados, olharam esbugalhados para aquele cenário que nunca tinham visto e um arrepio correu pelas veias e todo corpo ao sentirem o cheiro daqueles que tiveram suas vidas vividas naquele local.

Quantos sorrisos, lágrimas, amores bem ou mal vividos, momentos e histórias que somente cada coração que palpitou por lá viveu e levou para ninguém saber contar...

Mas no meio disso tudo Mauricéia encontrou em um dos quartos, que deveria ser de uma jovem, escondido atrás de um tijolo solto na parede uma caixa com várias cartas de amor, de Julieta para Romeu, de Romeu para Julieta, assim eles se denominavam. Era um romance proibido, por ser “Julieta” de família abastada, e “Romeu” filho de um dos escravos da casa que conseguiu aprender a ler e escrever. Eram cartas bem românticas, com juras de amor, com encontros escondidos no meio dos cafezais e banhos pelados na cachoeira. Em uma das cartas, percebe-se a despedida deles, o pai havia arranjado um casamento para ela com o filho do dono de uma fazenda que criava gado, lá pelos lados do sul do país. E ela foi embora, deixando suas cartas enterradas para sempre na parede, mas bastou-se que retirasse o tijolo e elas tomaram vida novamente nas mãos de Mauriciéa, que com cuidado e carinho as guardou como história.

Com a chegada da família de Mauricéia e Waldemir a vida retornou na fazenda, ressuscitaram as flores, pessoas transitando, crianças correndo, o amor novamente vibrando, até quando seus ocupantes novamente se forem...

Ana Amelia Guimarães
Enviado por Ana Amelia Guimarães em 20/02/2016
Reeditado em 21/02/2016
Código do texto: T5549947
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