O seminarista primeira parte.

O Seminarista. Primeira Parte.

Tudo começou naquela tarde de novembro, eu ainda não era seminarista e nem pensava em ser, mas foi naquele dia em que tudo começou sem eu saber é claro, apenas o meu coração conhecia ou pelo menos escondeu de mim mesmo o que sentia.

Apenas me chamem de Arthur, esse não é o meu verdadeiro nome mais assim eu desejo ser chamado. No verão de oitenta e cinco na cidade de Lagoa Santa em Minas Gerais começa essa historia. Eu sempre fui um garoto bagunceiro desde menino sempre aprontei de tudo, apanhava da minha mãe e ainda sim continuava a aprontar. Eu tinha muitos amigos naquela época, o Lucas, o Rogerio, o Aguinaldo e o Fernandinho. Eram bons tempos aqueles e tenho tanta saudade das coisas que aprontávamos na escola as professoras ficavam loucas, mas não estávamos nem ai gostava é ver a farra a bagunça. Infelizmente o tempo passou e foi cada um para o seu lado e foi nesta época que a conheci, ou seu nome era Cecilia, uma prima minha, filha do irmão do meu pai, o tio Marcos, no começo brigávamos muito, ela era chata e muito magrela parecia mais a Olivia palito do desenho do marinheiro poupai, e o apelido acabou ficando, ela queria morrer quando eu a chamava assim.

A cidade de Lagoa Santa era muito bonita cheia de verdes e lindas praças, com pássaros belíssimos, e na cidade todos os anos tinha um festival de teatros que as escolas faziam nas praças, naquele ano seria na praça perto da minha casa, e para o meu desgosto eu teria que participar para recuperar a nota, veja só como o destino nos prega peças, vocês entenderam porque digo isso; a peça que seria encenada era Romeu e Julieta de Shakespeare. Tudo bem ate ai o problema era que eu faria o papel de Romeu e Cecilia, ou Olivia palito como queiram, faria o papel de Julieta, fiz de um tudo para escapar da tal peça, mas não teve jeito tive que encarar o desafio e o pior de tudo beijar aquela magrela da Cecilia em praça publica, depois daquele dia fiquei uma semana sem sair de casa tamanha a minha vergonha.

Mas o tempo voou com as asas do falcão, Cecilia foi embora para o estado de São Paulo, enquanto eu fiquei aqui mesmo em lagoa santa, terminei o colegial sem saber o que seria ou qual profissão seguiria certo domingo quando fui a missa com meus pais, na igreja principal de Lagoa Santa que era muito bonita por sinal, estavam lá um grupo de seminaristas Agostinianos, cantaram lindamente os seus cantos gregorianos, me apaixonei instantaneamente pelos cantos, pela forma como eles se vestiam enfim, decidi naquele dia que seria um monge agostiniano, meus pais quase enfartaram, logo eu tão bagunceiro de repente me tornar um monge, mas era o que eu queria naquele momento. Toda minha família foi comunicada, quase todos não levaram a serio, achavam que era mais uma brincadeira minha, mas dessa vez era serio eu estava decidido a fazer a coisa certa, fui em frente. Dois meses depois entre procuras e contatos eu estava finalmente fazendo as malas para ir para o monastério que ficava ali perto de Lagoa Santa.

O dia da minha partida seria no domingo, a família fez aquele almoço de despedida, eu estava serio falava pouco, meio que tentando incorporar o ar de seminarista, um dos monges veio me buscar, almoçou conosco inclusive, Eduardo era o seu nome, muito centrado com respostas precisas a toadas as perguntas que foram feitas, terminado o almoço nos despedimos e fomos embora. Eu estava aflito não via a hora de chegar ao seminário, durante o trajeto conversei pouco com o Eduardo, não demorou nada e estávamos no monastério, que ficava próximo de uma fazenda, ele era enorme, muito bonito todo construído de tijolinhos, fiquei boquiaberto com a beleza do lugar e o tamanho, entramos portão adentro, um monge baixinho e sorridente veio logo abrir a porta do carro para mim.

_Olá meu nome é Frederico, seja bem vindo e nosso mosteiro, você é o novo candidato ao monastério, grandes surpresas o aguarda meu jovem.

_Olá, respondi, meu nome é Arthur, fico feliz por conhecê-los.

_Venha Arthur vou lhe mostrar o seu quarto e o restante do monastério, temos muitas coisas para fazer.

_Tudo bem vamos então, pequei minhas malas e segui o Frederico ate onde eram os quartos.

O local parecia um castelo medieval, o silencio a sensação de paz era maravilhosa e ainda podia se ouvir bem ao fundo o som dos cantos gregorianos, fiquei encantado com aquilo e naquele momento era tudo o que eu queria, acabei me desligando de tudo e de todos, nos dias que se seguiram eram uma novidade atrás da outra, e tudo me agradava, ate os estudos que eram bem puxados me agradaram e acabei por acostumar com eles.

A rotina no mosteiro começava bem cedo, às cinco da manhã, acordávamos e uma das primeiras coisas a fazer era a barba, tinha que fazer a barba todos os dias, depois vestia, nossa vestimenta que era uma túnica preta, uma capa curta, e um capuz. Nossa ordem deriva de Santo Agostinho, seguimos um código de regras elaborado por ele, não somos eremitas, ou frades como muitos chamam, estes foram instituídos pelo papa Alexandre IV em 1256. Os votos não são obrigatórios, mas a posse de propriedades é proibida, por isso não temos nenhum bem pessoal, vivemos para o estudo e ajudar na educação da igreja e comunidades. Temos um café logo depois de orarmos, na igreja aqui dentro do seminário mesmo, saímos da oração diretamente para o refeitório, tudo isso feito em ordem e silencio total, só depois do café é que trocávamos as primeiras palavras.

No começo estranhei e demorei a acostumar com o silencio, eu que era o tipo de pessoa que falava o tempo todo, foi difícil, mas sãos poucos e com a ajuda do irmão Frederico fui me acostumando, era assim que nos chamamos de irmãos. As primeiras visitas aconteceram três meses depois, eram sempre no horário da nossa missa, tínhamos missa todos os dias e a fazíamos em latim, só nos domingos que não, por que geralmente tinha visitantes. Na minha primeira visita veio o papai e a mamãe, eles choraram quando me viram no meio dos monges. Era incluído na nossa dura rotina de estudos um dia de folga, onde geralmente saiamos em passeios com outros monges, sempre tinha um superior nos acompanhando, para evitar contratempos coisas desse tipo, não que os monges sejam tendenciosos a desvios, mas precaução era necessária, sem dizer que era uma exigência do reitor do monastério.

Conheci muitos lugares legais, muito verdes, cidades, comunidades religiosas diferentes, tais como os franciscanos e tantos outros, tudo estava indo muito bem, eu estava já habituado as minhas tarefas e rotinas, meus pais sempre vinham me visitar, somente eles, mas houve um dia em que tudo começou a mudar, coisas que eu nunca pensei que um monge pudesse sentir, me ocorreram.

Era a tarde de novembro, o mesmo novembro, do começo dessa historia, era domingo, eu fui um dos escolhidos para cantar um dos salmos da bíblia em latim, era o salmo vinte e três, aquela missa tinha muitos convidados todos parentes dos monges alguns vinham de longe, a missa havia começado, tudo como planejado, chegou a minha vez de cantar o salmo, eu ainda não havia visto nenhum parente, nem pai nem mãe, certamente não tinham chegado ainda, abaixei a cabeça e comecei a cantar o salmo.

_Quod Dominus pascit me et nihil mihi deerit,

Effunde me in montem, ad eum, et super flumina praeparavit,

Ascendant in montem domini, deduxit me super semitas iustitiae propter nomen suum,

Et si ambulavero in medio umbrae mortis, nom timebo mala, virga tua et baculus tuus ipsa consolabuntur me,

Hic accipiet benedictionem a domino et coram inimicis inpinguasti in óleo caput meum et cálix meus redundat,

Sed et benignitas et misericórdia subsequetur me omnibus diebus vitae meae et habitabo in domo domini in longitudinemdinem dierum.

Levantei a cabeça lentamente, e lá estava bem a minha frente os meus pais, mas dessa vez tinha uma terceira pessoa, eu não sabia se era parente ou não, mas naquele momento fui do céu ao inferno em poucos segundos, pois era uma moça, linda, como eu nunca vi antes na vida, mesmo no seminário eu já havia visto muitas mulheres bonitas, mas como aquela jamais, algo de errado estava acontecendo fiquei tão pasmo e boquiaberto, que o Frederico que estava atrás de mim teve que me cutucar para que eu voltasse em si novamente, fiquei perturbado, me sentindo um monstro, pois em meu coração deixei algo novo toma-lo, seria aquilo o amor, mas logo eu, um monge, dedicado a vida eclesiástica, não era possível aquilo não poderia estar acontecendo.

Terminado a missa cada monge se dirigiu a sua família, eu fui para a minha com as pernas tremulas, realmente eu não entendia como um ser feminino, podia em questão de segundos mexer tanto assim com uma pessoa, só podia ser coisa do demônio não tinha outra explicação, mas eu fui assim mesmo, jovem inexperiente que nunca havia namorado antes, era de se esperar tal coisa, mas eu não estava preparado para aquilo.

_Olá meu filho que saudades de você, eu e o seu pai nos emocionamos vendo você cantar em latim que coisa mais linda, chorei feito criança.

_Olá mamãe e papai, que bom revê-los.

_A meu filho que falta de educação a minha, lembra-se da Cecilia, sua prima, filha do marcos, ela está morando conosco agora, esqueci-me de apresenta-la a você. Ela está linda não é mesmo.

_Olá Cecilia, mil perdoes por não reconhecê-la, já faz tanto tempo. Minhas mãos estavam suadas e o coração parecia que ia sair pela boca, as pernas continuavam a tremer, minha sorte é a túnica que não deixa ver o tremor nas pernas.

_Oi Arthur, embora você tenha se esquecido de mim, eu nuca me esqueci de você, lembra-se da peça, Romeu e Julieta, na praça, nunca me esqueci.

Aquilo só poderia ser coisa do demônio para me desviar do meu caminho, logo a peça que ela tinha que lembrar meu Deus, mas ela não era aquela Olivia palito de outrora, ela tinha se transformado na tentação em pessoa e beleza, para disfarçar o meu nervosismo, chamei-os para um passeio pelo monastério, assim o tempo passava mais rápida e meu suplicio terminaria logo. Caminhamos por quase vinte minutos, enquanto meus pais falavam de seus planos da aposentadoria, Cecilia apenas me olhava, os seus olhos eram verdes, sua face irradiava luz e seu lábio carnudo com um batom vermelho me deixava quase louco, tive vontade de sair correndo dali, e a bendita hora não passava. Finalmente chegou a hora da despedida, beijinhos de mamãe e papai, um adeusinho, mas, ela tinha que me beijar no rosto, colocou as mãos quentes sobre os meus ombros e me beijou no rosto, parecia que minhas roupas fossem pegar fogo, fiquei mais vermelho que o batom dela, mamãe bem que percebeu minha aflição, sorriu e deu de ombros.

Na parte da tarde do domingo após as missas nos reuníamos, em um salão enorme, e ali ficávamos conversando ate a noite, era como uma tarde de folga, mas nesse dia eu fui correndo para o meu quarto, inventei uma desculpa para meu amigo, o Frederico, e me tranquei no quarto eu queria esquecer a imagem da Cecilia, e me apavorava a ideia dela voltando novamente, com meus pais, eu estava em sérios apuros e não sabia como resolver a minha situação.

Tiago Pena
Enviado por Tiago Pena em 05/01/2015
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