Em uma aldeia muito distante, morava a alegre e vibrante cigana Wilca, dona de uma personalidade forte e olhar decidido, era o verdadeiro esteio sentimental e psicológico daquela aldeia. Todos a respeitavam, veneravam e a intitulavam rainha.
Nas noites de lua cheia, Wilca dançava encantando a todos, as mulheres desejavam ser como Wilca e os homens a veneravam como a lua, não a desejavam em repeito a Barô, líder daquela aldeia, marido de Wilca.
Certo dia apareceu na aldeia um jovem professor viajante encantando a todos com suas histórias contadas, trazia a magia do verbo bem expressado. Recebeu hospitalidade pelos dias que lá permanecera.
Wilca ouvia às moças que enfeitiçadas com a inteligência do jovem suspiravam e  sonhavam    freneticamente com  casamento.
Em uma típica cerimônia de noite de lua cheia todas as ciganas dançavam expressando discreta sensualidade para o jovem viajante e como de praxe a rainha encerrava a dança com apresentação solo, encantando com sua maestria. Naquele dia o jovem viajante ficou extasiado com a apresentação daquela mulher, a qual até aquele mágico momento, só  conhecia pelo nome.
Enquanto dançava, Wilca expressava sua gratidão à lua por considerar o maior elo com o sagrado, isso a fazia ainda mais radiante, seu olhar penetrava e lia a alma daqueles que a assistiam e por um instante seu olhar cruzou com o do jovem viajante que apreciava e expressava puro desejo no olhar. Neste instante a rainha sentiu um calafrio em sua espinha como sinal de dias contados de sua vida e ao mesmo tempo um imenso desejo lhe atraia para aquele olhar fixo e penetrante. Um clarão se fez presente naquelas almas, anunciando a explosão de mútuo desejo.
Passaram-se os dias e Wilca não conseguia tirar da cabeça aquele jovem, escutava a conversa das jovens ciganas e ficava atordoada. Nas reuniões da aldeia se entreolhavam, mas não arriscavam  trocar palavras e no silêncio, através de olhares selaram um pacto de paixão. Todas as noites se imaginavam um nos braços do outro. A distância dos corpos não impedia a paixão e o desejo daquelas duas almas. Mas com o passar do tempo só imaginação não bastava, precisavam trocar carícias, afagos, beijos, abraços, unir seus corpos. Ambos sabiam o risco de morte que corriam.
O Jovem viajante através de um bilhete entregue por um mensageiro à rainha propôs fuga, mas Wilca recusou tal ato, jamais trairia sua aldeia a ponto de fugir. A troca de bilhetes amorosos expressando os mais ardentes desejos passou a ser uma constante, tendo como aliado o menino mensageiro que vibrava com a adrenalina do perigo, e retribuindo o favor, o jovem professor passava horas contando-lhe histórias.
Eis que um dia, Barô descobrira os secretos bilhetes de sua um dia amada, agora odiada e resolvera tomar as providências cabíveis ao adultério, zelando pelo código de honra da sua aldeia que rezava justiça e fidelidade. A morte da rainha não era castigo suficiente, pois acreditava que encerrando a vida na matéria, todos voltariam para as estrelas, lugar que deixaram para habitar a terra, sendo para rainha um premio e não o merecido castigo pela traição.
O jovem viajante ao saber da captura da sua amada, fugira na calada da noite sem deixar rastros.
Wilca pejorada por toda aldeia como devassa e traidora, desprezada por seus quatro filhos e marido, foi julgada e condenada a passar o resto da vida em isolamento total.
Durante aqueles dias de clausura não conseguia pensar em outra coisa que não fosse o olhar distante e triste daquele jovem viajante, sua boca, o contorno do seu rosto, os bilhetes apaixonados... Lembranças que embalavam seus dias.
Com o passar do tempo, Barô elegera sua nova esposa, uma jovem e linda cigana que dançava e encantava a aldeia com seu olhar meigo e suave. Mas a lembrança de Wilca dançando prevalecia no oculto das mentes, ela fora única.
Wilca cada dia mais fraca, seu corpo frágil, sua alma ferida, sem forças não reagia aos sintomas da doença que avançava em sua matéria. Até que piedosa com a situação, a jovem rainha pedira autorização a Barô para visitar Wilca, o marido não negara o pedido da bela jovem que era suave como a brisa.
Ao deparar-se com a antiga musa da aldeia, a jovem rainha ajoelhou-se aos seus pés, pedindo-lhe perdão por ter casado com seu marido. Wilca em um gesto de compaixão afagou-lhe os cabelos e a fez levantar. A Jovem foi tomada por um choro compulsivo assistindo no que se transformara aquela mulher que um dia tão bela passara a ser um caco humano desprezada por todos e pensou como injusta era a vida, Wilca parecendo ler seus pensamentos imediatamente replicou:
-Não condene a vida linda jovem, estou colhendo as consequências de minhas escolhas.
- Não é justo minha rainha, você nada fez, não consumou o fato, retrucou a jovem.
- Não fui fiel às convenções da aldeia e estou pagando por isso.
- Você está arrependida? Perguntou a jovem.
- Não, faria tudo novamente, os momentos que vivi e as lembranças que trago no meu coração, compensa qualquer dor e sofrimento. Eu vivi a magia do desejo, da paixão... estava escrito no meu mapa, “Maktub”. E dizendo essas palavras, Wilca foi tomada por um acesso de tosse constatando hemoptise. Sem forças com a ação violenta da tosse, desmaiou. A jovem rainha desesperada entre gritos e prantos deixou o local clamando por socorro e misericórdia.
Barô ao ouvir o estardalhaço da jovem correu para socorrê-la e ouviu os apelos para que salvasse a vida da rainha, chegando ao local chocou-se com a terrível cena, foi consumido pelo remorso e aos prantos implorou-lhe perdão e a retirou dali, levando-a para casa e deitando-a em uma confortável cama, ordenou que chamassem o médico.
Ao abrir os olhos, a rainha percebeu que estava novamente no conforto de sua cama e percebeu os olhos marejados por lágrimas de Barô e seus filhos que estavam em volta da cama. Do lado de fora os ciganos desesperados  e arrependidos pelo julgamento,imploravam a Deus que não levasse a eterna rainha.
Ao vê-la de olhos abertos Barô, pediu-lhe perdão.
- Você não tem motivo para sentir-se culpado, meu Senhor, foi honesto com seus sentimentos, o seu coração ordenou para que tomasse essa atitude e você cumpriu a ordem.
- Eu não suportei a dor da rejeição, a dor de ser trocado, de ter perdido o seu amor, explicou Barô.
O corpo e feições de Wilca estavam irreconhecíveis de tão frágil, mas o olhar continuava  com a mesma intensidade  fitando Barô :
-Eu nunca deixei de amá-lo meu Senhor, acatei sua decisão, porque sabia das ordens do seu coração e das Leis da Aldeia. Ah! Quão cruel  é a Lei dos homens que nada entendem do amor. O amor que sinto por vocês jamais foi dividido, ele continua aqui muito forte. Amo meu povo, minha aldeia, meu Senhor, meus filhos, aquele que partiu assustado também estará para sempre no meu coração. O amor não é posse, é um sentimento único que cabe todos dentro, é a essência do ser humano.
-Mas aquele canalha, covarde, moleque não estava presente para te defender, fugiu!!!! Retrucou Barô
-Ele seguiu as ordens do coração, preservando a própria vida. Ao dizer isso, Wilca fitou com seu olhar penetrante cada um dos que estavam ali desesperados e continuou: Não se torturem, todos foram fies aos próprios sentimentos, às convenções e mais uma vez estão repetindo a fidelidade, arrependidos choram pelos atos cometidos, esta atitude é prova de amor. Somos impuros e errantes, estamos aqui para evoluir e o reconhecimento das nossas falhas é o primeiro passo para a evolução. O importante é que estejamos sempre analisando nossas atitudes sem trair nossos sentimentos, não encarem a minha partida como represália ao julgamento de vocês, procure daqui por diante entender os motivos que levam às decisões, não julguem o próximo com tanta rigidez, deixem essa missão para o Pai, pois o julgamento só traz sofrimentos. O amor é a essência da vida, dele nós viemos e com ele partiremos. Ao falar isso, Wilca deu seu último suspiro e partiu na carruagem de fogo visível somente pra ela, em direção às estrelas.
Os moradores da Aldeia afirmam que a estrela avermelhada que brilha intensamente no céu é a morada da rainha e de lá acalenta todos com seu imenso Amor. 

 
HILDA STEIN
Enviado por HILDA STEIN em 23/04/2014
Reeditado em 24/04/2014
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