Dentro das expectativas

Quase no início da noite você me liga. O celular toca, e você pode me ouvir numa voz de felicidade como se fosse meu esse filho. Te falo sobre a chegada de uma criança nova na família. Meu primo de quase um ano mais novo que eu será pai. A casa está em comemoração. Minha mãe me olha com um olhar de repreensão. Ela sabe que nunca chegará a minha vez. Sabe que não há espaço para esperança em mim. Que é com você que estou falando. Desço as escadas em absoluto êxtase. Você me dá de cinco à dez segundos, não ouço bem. Corro para meu quarto. Você diz que não dá mais, que sente muito, pois me ama muito, mas não aguenta saber que outra coisa possa me dar felicidade. Diz que nunca vai mudar, que não sirvo para ter alguma felicidade. Meu coração despara. Em algum momento a senssação de alívio pode vir. Do outro lado das paredes as pessoas que estão comemorando a chegada da nova criança, me ouve pular, gritar, e finalmente cair em prantos. Sabem que nunca vou sair desse quarto.

Você diz que não dá mais, pois não aguenta ver minha tristeza, que nunca vai mudar, e que se nós permanecermos juntos, nunca serei feliz. Você não pode me ver triste, não pode me ver feliz. Tudo em mim, minha existência te causa agônia. Você sabe que nunca viverá sem mim. Mas meu coração se questiona sobre viver com você. É tarde. Você desliga o celular no meio de uma frase minha. Respiro fundo, porque toda a casa pode me ouvir. Meu irmão mais velho bate na porta e entra para saber como estou. Sabe quem é você, sabe qual o seu poder sobre mim. Ele diz que você é como sua decendência. Sua cunhada acaba de ter um bebê as preças. Ela tem medo de ficar sem seu irmão mais velho. Sabe que viverão juntos por muito tempo sobre a infelicidade que é participar da história da sua família.

Em alguns segundos, dentro das espectativas o seu número piscará na minha tela. Peço que meu irmão saia, que não comente para ninguém. Todos te odiarão, se souberem que mais uma vez você intervendo nesse momento de felicidade privada. Antes que ele saia, o celular toca. É você. Ele sabe quem é. Olha para baixo e diz que me ama mais que qualquer outra coisa. Que sou de sua família. A porta fecha, e eu atendo o celular. Você diz com grosseria que devo parar de chorar. Você diz: Quem me garante que você não está na casa do Diego? - digo: Eu garanto. Você deve confiar em mim. - Você desliga, porque está ficando nervoso. Sua culpa te consome. Te torna um traido. Essa palavra nunca terá um peso sobre você. Traidor... Delator das suas próprias vontades. Tudo se normaliza, porque me acostumo sobre construir um futuro em você.

Passados dois dias, aproximadamente às dez da noite, eu te liguei. Durante todo esse dia, eu senti uma angústia conhecida. Ela vem pela manhã. Se programa, e eu me acostumo. No trabalho todos sabem o que está acontecendo. Entro em síntomas bipolares. Sinto todo ódio do mundo dentro de mim. De repende choro, e peço que R. não me deixe naquele minuto. Ele pergunta: O que está acontecendo? - Não sei o que dizer. As horas passam e tudo o que sei é que você morreria por uma nova causa. Essa causa está longe de mim. Não sofro mais como em dois anos atrás. Não sou demasiadamente certo como em dois anos atrás. Desço as escadas. O turno acabou. Não vou para a universidade hoje. Está ficando frio. Ando um pouco, e vou até uma loja de departamentos. Digo para todas as pessoas que me cumprimentaram naquele dia, que você nunca me deixará. Que você é fiel ao nosso amor. Não tenho certeza disso, mas preciso convencer as pessoas. Compro uma calça, e duas blusas de um número menor. Sei que a doença logo chegará. Como algo. Estou só na multidão que guia por um lado contrário. Ligo para a Tain. Ela me atende. Conversamos durante toda a viagem de trêm. Falamos de você. Chego em casa. Subo as escadas já com a certeza da agonia. Te ligo quase dez da noite. Você redireciona meu número para a caixa de mensagem. Espero você retornar. Você retorna. Não pergunta nada, não quer saber como foi meu dia, ou se estou bem. Diz: Precisamos conversar. - Paralizo meus sentidos. Você não se importa. Continua... - Precisamos conversar. - digo: Você quer terminar?... - Você diz: Sim! - Não há reticências. Você pede para que eu não te odeie. Me pede desculpas, e pede para que eu não fique doente, entre alguns pedidos mais. Penso que está feliz. Se me visse no mento que disse aquelas palavras se surpreenderia.

Subo para meu quarto. Digo que você não me ama o suficiente. Me corrijo. Digo que você não me ama, que nunca me amou, ou que nunca irá me amar. Digo que está tudo bem. Você não prolonga a conversa e diz: Tá. Tchau. - Não sofro. Como algo, canto. Apago nossas fotos do meu celular.

Estaria surpreso se soubesse o que se passa na minha cabeça. Não tento entender. Dois anos atrás eu morreria, pegaria o primeiro vôo de encontro a você. E então você me trataria como em uma exclusão social. - Gargalho desses pensamentos. Não sei o que se passa. Talvez você esteja construíndo um futuro. Penso na sua última frase conclusíva. "Acho melhor... Acho melhor...". Idiota.

Yuri Santos
Enviado por Yuri Santos em 21/11/2012
Reeditado em 14/03/2013
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