Minha Querida Lady Marrison...

-Vamos crianças,digam A,B,C,bem alto,A,B,C

O eco das vozes infantis era tudo que se podia ouvir naquele pequeno vilarejo,a jovem professora tentava fazer com que seus inquietos alunos aprendessem a lição do dia,mas não estava sendo uma tarefa fácil.Ela os fazia repetir,3,4,5 e 6 vezes,mas tudo que ela conseguiam dizer eram sons entrecortados,misturados com os gritos e as gargalhadas.Era exaustivo demais ensinar aquela série,mas não lhe restavam opções,desde que se formara,o único emprego que lhe pareceu mais atraente foi esse,a escola pagava relativamente bem,além disso ela podia está junto dos seus familiares.Seu pai não andava bem e sua mãe parecia está envelhecendo cada vez mais rápido,seus irmãos tinham empregos que não eram suficientes nem mesmo para a sua subsistência e a de suas enormes famílias,restava a ela a tarefa de sustentar a família.Era única que ainda estava solteira dos seis irmãos,filha caçula sempre fora a protegida,a mais cuidada.Os irmãos a rodeavam de mimos e carinhos,sempre protegendo-a dos gaviões que a queriam levar com suas garras,não por acaso,sua beleza era estonteante.Apesar de ser muito magra e aparentemente frágil,ela possuía olhos que segundo seu irmão Dillan, “Eram como gotas do céu em dias de primavera” e uma pele tão bela que invejava as outras moças da cidade.Ela concluiu a lição que arduamente tentou passar aos jovens e arrumou seus cadernos,como sempre,seu irmão mais moço Daniel,a esperava a porta,acompanhado de seu inseparável cão de guarda o pastor alemão Stuart.Ele sempre ia buscá-la,eram as ordens do seu pai,mesmo ela já sendo uma mulher,não podia caminhar pela cidade sem um dos irmãos por perto.Ela se aproximou e beijou a face dourada do irmão.

-Cansado?-Ela segurou o braço que ele ofereceu.

-Sim,as cargas chegaram todas de uma vez,eu e o Dillan as descarregamos sozinhos,e você?-Ele segurava-a ao mesmo tempo que conduzia Stuart pela coleira.

-Um pouco,as crianças são adoráveis,mas,cansam-Ela sorriu.

-Eu sinto muito por isso,você não nasceu para trabalhar,se eu pudesse,tiraria você dessa vida.-Ele deu um pulo travesso e foi parar na frente dela-E te cobriria de joias e lindos vestidos de seda.

-Deixe de bobagens Daniel,eu não me importo de trabalhar,adoro o que faço e não sei se me agradaria ser paparicada desse jeito.-Ela o fez parar de falar,adorava o jeito elétrico do irmão,mas algumas horas tinha que trazê-lo a realidade-Não se ganha nada sem suor Dane.

-Ora,vejo tantos homens e mulheres que tem muito sem nunca terem derramado uma só gota de suor-Ele volta para o lado dela,empina o nariz e faz a sua melhor cara de idealista.

-Pergunte se são felizes.Tem muito,fazem o que bem entendem e como bem entendem,mas muitos não são felizes como eu sou,tendo apenas o meu trabalho e a minha família.-Ela sorri para o irmão que a olha,ele ama a irmã,mas certas horas sente uma enorme vontade de sacudi-la,ela é boa demais.

-Ora Dana,felizes ou não, eles são ricos,e não precisam carregar caixas pesadas para trazer o pão para casa.-Ele volta os olhos para as ruas da pacata cidade.

-Deixe disso Daniel,se queres ser rico,trabalhe e você será-Ela dá tapinhas na boina francesa que ele orgulhosamente carrega na cabeça cobrindo os cabelos dourados quase ruivos.

-Mas do que trabalho?Só se eu desistir de viver e me dedicar só as cargas-Ele puxa a coleira de Stuart que parou para admirar uma cadela que passava.

-Um dia você chegará lá,pode me deixar aqui,sigo só-Ela parou numa esquina.

-Papai brigará comigo,tenho que levá-la até em casa.-Ele segurou pela mão.

-Pare Daniel,não tenho mais cinco anos,posso muito bem caminhar até em casa a partir daqui,só são mais alguns passos,não se preocupe,com o papai eu me entendo,volte para as suas cargas-Ela o beijou na bochecha.

-Está bem,mas tome cuidado,essas ruas andam perigosas,ainda mais para uma moça como você-Ele a olhou preocupado,estava receoso de deixá-la,mas precisava voltar ao trabalho,puxou Stuart pela coleira e embrenhou-se pelo mesmo caminho de onde vieram,agora ia em direção ao depósito onde trabalhava com o resto da família.Ela seguiu pela viela,a rua estava calma,a cidade parecia um deserto,as únicas lojas que haviam fechavam as seis horas,as janelas das casas estavam quase todas fechadas e as únicas vozes que se ouviam eram dos homens do cassino que ficava no fim da rua.Ela começou a caminhar,com as vistas baixas e passos lentos foi tomando o rumo da sua casa que ficava a alguns minutos dali.Ela andava sempre distraída,nunca parava para observar nada e nem ninguém,o que não significava que não estivesse pronta para possíveis surpresas,sua distração era apenas uma forma de proteger-se das perturbações que pudesse encontrar.Continuou caminhando,mas em certo ponto,algo a impediu de continuar,algo tão grande que a fez dá alguns passos para trás num impulso.

-Desculpe-me-Soou a voz masculina.

-Ora,não olha por onde anda?-Ela tentou esquiva-se irritada.

-Creio que a senhora que não anda muito atenta-Ele sorriu enquanto colocava-se diante dela.

-Senhorita, e deixe-me passar agora-Ela não o olhava,ele lhe pareceu bastante mal educado para ser alguém que merecesse sua atenção.

-Calma senhorita,para que tanta pressa-Sua voz suave era quase como um sussurro-Não acha que deve pedir-me perdão?Afinal,foi a senhorita que me atacou-Ele sorriu enquanto apoiava-se na sua elegante bengala de madeira francesa.

-Se não me deixar passar gritarei,direi que está tentando me atacar-Ela o encarou agora,seus olhos azuis se encontraram com os turquesa dele e fundiram-se de forma avassaladora.

-Espera que alguém a ajude?-Ele deu um sorriso que deixou a mostra seus belos dentes alvos- A rua está vazia,só há eu e a senhorita.

-Senhor,saia da minha frente-Ela falou decidida.

-Está bem,foi um prazer conhecê-la-Ele deixou que ela passasse,sorriu ao vê-la partir contrafeita,jamais havia visto beleza tão forte como aquela,balançou a cabeça e seguiu,quando pisou no chão,notou que seus pés esbarraram em algo,olhou e viu que se tratava de um caderninho,abaixou-se e pego-o,abriu e viu que se tratava de um caderno de lições.

-Professora?!-Sorriu-Adoro professoras-Ele guardou o caderno e seguiu.

Ela andou o resto do caminho com os olhos baixos e as faces fogueadas pelo rubor,aquele homem,aquele maldito homem a fez perder a paciência,mas sua voz era tão suave e seu gestos tão delicados, “Provavelmente um aproveitador tirado a lorde”,pensou enquanto caminhava para o portão branco que enfeitava a entrada da modesta casa que ela divida com os pais e com quatro de seus irmãos e suas esposas e filhos.Como de costume,o cheiro do café de sua mãe veio recebê-la,ela aguçou o olfato para sentir melhor o aroma doce da bebida,entrou e encontrou seus sobrinhos na sala,os meninos ocupados com os brinquedos e as meninas animadas em ajudar a por a mesa,suas cunhadas,cada uma com um dos menores nos braços,ela não compreendia aquelas mulheres que tinham a vocação para serem apenas mães e esposas,mas achava bonito vê-las nesses cuidados que a vida lhes dera.Andou por entre os brinquedos espalhados pela sala,debaixo dos protestos dos meninos e chegou até a cozinha onde sua mãe preparava o jantar.

-Demorou a chegar-Não tirou o olho das panelas.

-Tive um pequeno problema com um aluno-Levantou a sombrancelha,se aquele homem fosse seu aluno,lhe ensinaria além do BaBa algumas lições de boas maneiras.-Como está o papai?

-Bem,melhor do que ontem,perguntou por você o dia todo-Ela parou para coar o café.

-Ele vai acabar se acostumando com a ideia de que a caçula cresceu-Ela sorriu e foi para o seu quarto,antes passou pela oficina onde seu pai costumava ficar,mexendo naquilo que ele carinhosamente chamava de “seus cacos”,ela o beijou.

-Onde está o seu irmão que não a trouxe?-O velho não tirou os olhos da madeira que habilmente manipulava.

-Ele teve que voltar para o deposito papai,não brigue com ele,eu que pedi para seguir o resto do caminho sozinha-Ela deu as costas para sair.

-Esta cada vez mais difícil-O velho falou de forma solta.

-Difícil o que papai?-Ela parou para ouvir.

-Acreditar que vocês cresceram e que eu e sua mãe já estamos velhos e logo seremos pesos nas suas costas.

-Não diga isso papai,vocês nunca serão pesos-Ela se agaixou junto a cadeira onde ele estava-Eu te amo e sou muito grata por vocês me darem todo esse amor que me dão.

-Filha,prometa que se eu me for,você não irá desamparar a sua mãe.-O velho a olhou com seus olhos escuros-Prometa Dana.

-Não diga bobagens papai,o senhor ainda viverá por anos e anos,acha que vai morrer antes de me levar ao altar?-Ela sorriu.

-Apenas prometa Dana-O velho a olhou firmemente

-Prometo o que quiser,desde que deixe de falar bobagens-Ela o beijou e saiu,seu coração estava apertado,sabia que o pai estava cada vez mais doente e que logo os deixaria,mas não gostava de pensar nisso,o amava demais para pensar na sua morte,foi para seu quarto e atirou-se na cama que dividia com uma de suas sobrinhas mais moças.Seus pensamentos passearam pelos acontecimentos daquele dia e acabaram por fixar-se nos olhos azuis turquesas do homem misterioso que se batera com ela.

-Quem será ele?-Ela olhava para o teto tentando encontrar a resposta.-Algum desses galanteadores baratos com certeza-Sacudiu a cabeça para afastá-lo dos seus pensamentos-Ora Dana,pare de pensar nele,você tem mais o que fazer,corrigir as tarefas dos alunos por exemplo.-Ela deu um pulo da cama e catou os cadernos que deixou na pequena mesa que ficava em seu quarto e que ela também dividia com a sobrinha,que estava se preparando para os exames para ingressar na Universidade,queria seguir a carreira da tia,professora.Ela sentou-se e pegou os cadernos,começou a folhear as páginas,foi passando caderno,por caderno,até que ao buscar o último sua mão apalpou o vazio.

-Ora,onde está o caderno do Rian?-Ela olhou nas suas coisas,vasculhou tudo e não encontrou-Será que deixei na escola?Mas não é possível,me lembro bem de ter trazido todos os cadernos-De repente ela parou e lembrou-se do encontrão daquela tarde.-Maldito,além de ser um bastardo ainda me fez perder um dos cadernos,o que vou falar para o Rian amanha?-Ela balanço a cabeça-Penso nisso amanha.Resolveu sair para tomar um café,abriu a porta do quarto e foi para a cozinha.

Do outro lado da cidade,Felipe descansava estirado no canapé do seu luxuoso escritório,ainda trazia o sorriso bobo de quem havia descoberto um grande amor,seus olhos turquesas,brincavam a admirar o caderno que ele folheava como se estivesse lendo uma obra de Shekspeare.Aquela jovem o havia hipnotizado de tal maneira que ele até se esquecera que jamais poderia pensar em relacionar-se com ela,nem mesmo nos seus sonhos.Seus pais o deserdariam sem nem pensar duas vezes.Mas pela aquela beleza,até que valia a pena empobrecer.Ele apertou o caderno contra seu peito e fechou os olhos,poi-se a imaginar como seria estar ao lado dela todos os dias.Cada vez que pensava,mais a queria.Abriu os olhos e levantou-se.

-Irei entregar o caderno,pelo menos poderei vê-la.-Sorriu com a ideia de poder encontrá-la de novo.Quem sabe se eu a convidar para um passeio-Ele passou a mão pelos cabelos castanhos,quase negros que lhe caiam no rosto,era um jovem bonito e elegante,tinha olhos encantadores,sua pele morena meio clara,contrastava com o azul do terno inglês que o trajava com elegância.Suas mãos grandes,são ornadas por anéis de ouro,um deles traz o brasão da sua família,os outros foram presentes das suas “mulheres”.Seu rosto é moreno e ornado por um bigode fidalgo.Um príncipe,sem máculas,perfeito.Ele caminhou pela imensa sala a imaginar como seria o encontro-E se ela achar que sou um aproveitador?Não quero que pense isso,talvez seja melhor apenas entregar o caderno.

Continua...

Carol S Antunes
Enviado por Carol S Antunes em 03/10/2012
Reeditado em 26/05/2015
Código do texto: T3914888
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