SINAL VERDE

A chuva fina congelou meus ossos. Enquanto batia dentes de frio

pisava nas poças de água, sentindo-me um idiota apaixonado.

Minhas calças encharcadas, o tecido molhado grudou na minha pele, fazendo eu lembrar das caricias dela. Toques rápidos, inseguros atribui isso a nossa diferença de idade. Talvez incomodasse um pouco. Para mim, não! Empresto minha juventude se ela quiser.

“À noite, parado no ponto de ônibus, encolhido ou caminhando, evitando os pingos”. A chuva me fez lembrar o rosto dela. Estava molhado, eu mesmo joguei agua brincando na beira da lagoa. Estava morna, assegurei que podia entrar.

Passou outro ônibus, embalou a agua de um bueiro pingando nos meus pés. Fiquei olhando feito bobo. Ela fez isso no primeiro encontro, querendo chamar minha atenção. Acelerou numa poça...

Furioso, não foi bem a palavra que usei naquele dia, soltei foi um baita de um palavrão. Ela não ouviu, ia longe, espiando pelo vidro retrovisor. Rindo. Acho que me apaixonei naquele dia.

Nossa! Um trovão clareou o céu e eu aqui. O pessoal na parada se amontoou. A claridade que durou alguns segundos me fez lembrar do beijo que dei nela. O primeiro. Meu claro! Foi rápido, o mesmo tempo do trovão, eu apavorado. Achando que morderia o lábio dela. A verdade é que senti medo daquele sentimento.

Dias depois ela disse que também temia por causa da diferença de idade.

Passou um carro e buzinou me assustei, mas eram uns engraçadinhos acenando. A chuva diminuiu, as horas passavam e eu continuava esperando...

As ruas se preparavam para dormir, chegou outro ônibus, todos subiram, eu fiquei. Coloquei as mãos no bolso do casaco, os roncos dos motores não incomodavam tanto quanto os do meu estômago.

Meu, que fome! Caiu um pingo na minha testa, olhei para cima, rindo.

Encharcado, com fome, o sono apressado empurrando minhas pálpebras, a chuva recomeçava mais forte. E ainda por cima uma goteira na cabeça.

Ela disse que eu parecia um pinto molhado, quando combinamos de sair e choveu. Guarda-chuva não combinava com temporal me arrisquei por amor e ela riu. Fiquei magoado, sim! Mas quando aquelas mãos maduras começaram a me secar, esqueci-me de tudo.

Esqueci que gastei minha mesada num perfume do Boticário, meu pai deu uma tapinha no meu ombro todo orgulhoso. Quando souber que a minha gata tem a idade da mulher dele! Por acaso minha mãe vai ter um infarto! Um trovão. Outro, a chuva, tantos pingos batendo no calçamento respingando minhas calças, meus sapatos úmidos.

Alguém corria no meio da Avenida para me fazer companhia de longe evitando os buracos cheios de agua, parecia dançar. Não tinha nada de engraçado na cena, mas eu ri. Claro, lembrei-me da gente comemorando o nosso amor. Perguntei num momento de profunda bobeira, se ela não estava querendo provar alguma coisa. Besta, ofendi a mulher. Ficou irada me largou e saiu quase correndo. Fui atrás, cheio de desculpas, não disse nada, meus olhos falaram apavorados.

Sempre achei que minha primeira vez fosse com uma gata tão inexperiente quanto eu. Foi o melhor engano da minha vida. Passou outro carro, a pessoa continuava arriscando-se tentando atravessar. Balançando os braços para cima assustado com o movimento rodopiou quase caiu. Parei de rir.

O sinal abriu. Verde, ela disse que meu amor era um sinal aberto para o sofrimento dela. Não entendi.

Pensei um pouco dizendo que o vermelho fechava qualquer duvida, ela riu. Chamando-me de sonhador, acho que sou mesmo, já passa da meia noite eu aqui duro de frio. Querendo que a minha professora jogue tudo para o alto. Venha comigo viver da minha mesada, esperando eu me formar, trabalhar e assim sustenta-la e aos filhos.

A chuva parou de repente, o céu se encheu de estrelas, um carro passou bem devagarinho. Não deu para ver o rosto, só sei que olhava para mim. Enquanto chutava todas as pedras que encontrava.

Não tinha sentido ficar no ponto do ônibus esperando-a. A calçada vazia dava a sensação de abandono, eu fui abandonado.

Pisei firme numa poça queria que respingasse no meu rosto e se misturasse com meu choro. O carro voltou diminuindo a marcha, parecendo não querer me perder de vista.

Devia ser alguém que como ela, não teve coragem de se arriscar.

RÔCRÔNISTA
Enviado por RÔCRÔNISTA em 11/03/2012
Reeditado em 11/03/2012
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