084 - O DIÁRIO DE MADALENA...

O José Tenório há alguns anos ficara viúvo, mas não estava morto, saia à noite a rodar, das vezes estava com sorte arrumava um rolo aqui, outro ali assim ia levando a vida até que seus olhos depararam com os belos olhos azuis da Madalena que só tinha aqueles olhos por beleza, era de estatura média, gorda, mas muito gorda, gordas bochechas, barriga volumosa, larguras de traseira, arfava no caminhar, derramava suores de cansaço para carregar todo aquele peso. Logo logo ela se arranchou na casa do Zé Tenório que era nosso vizinho, e ele estava realmente apaixonado, quando nos visitava, acompanhado da sua querida Madalena, ela sempre tentando disfarçar toda aquela gordura, vestidos largos, cabelo curtinho, mas tudo em vão, deslocava o ar quando caminhava, um roderão de mulher, já fora casada teve quatro filhos, o marido a abandonou assim que foi acumulando larguras pra todos os lados.

O nosso vizinho, cuidadoso, contratou uma nutricionista para cuidar da sua amada, que resolveu encarar com toda seriedade o tratamento e começou a perder quilos e mais quilos de gorduras, logo precisaram de um cirurgião plástico que a cada operação arrancava dezenas de quilos de pelancas.

A Madalena começou a se destacar, foi recuperando parte de uma formosura que um dia já tivera, aprendeu a dirigir carro, aliás, reaprendeu, roupas modernas, desfilava pelas ruas, mas quase sempre sozinha, pavoneou, comprava roupas chiques, caríssimas, preocupando financeiramente o nosso Zé Tenório, logo as más línguas deitaram a falar que a Madalena tinha um caso com um rapaz que era mais jovem que o seu filho mais jovem, a mulher passou a mandar e desmandar na casa, em nada obedecia só queria guiar o carro pela noite e também pelo dia, nosso vizinho cabisbaixo, quando abria a boca para reclamar das suas constantes saídas, ouvia sermões e mais sermões, que ele deveria confiar mais na sua amada, que era inveja todo aquele falatório e tantas outras coisas mais. Em uma noite um carro em alta velocidade colidiu violentamente com um poste de luz, e para surpresa de todos em meio daquelas ferragens torcidas e retorcidas retiraram a Madalena e seu amante, um rapazinho ainda imberbe, que guiava o veículo apesar de não possuir a bendita carteira de habilitação.

Mesmo amargurado o Zé Tenório foi solidário com sua esposa, pagou todo o seu tratamento no hospital, ela agora claudicava visivelmente no caminhar, ao retornar pra sua casa encontrou no portão malas e mais malas com tudo que lhe pertencia, recebeu uma boa quantia em dinheiro e cada um seguiu o seu destino.

O José Tenório estampou na face uma profunda melancolia, viveu mais algum tempo, tempo suficiente para ver a Madalena recuperar o antigo peso de uma maneira surpreendente, e em uma tarde qualquer um infarto o matou.

No seu velório a Madalena timidamente apareceu sendo imediatamente destratada de forma humilhante e desumana, baixaria pura, foi praticamente expulsa do local por um dos filhos do falecido que a acusava de ser ela a responsável pela morte prematura do pai!

E o tempo passou, agora a Madalena já sem dinheiro, abandonada por todos, raramente saia de casa, passou por extremas necessidades, quando não tinha com que se alimentar mandava recados para minha mãe que prontamente lhe enviava tudo que precisava, e quase sempre me encarregavam de ir até a sua casa para entregar os mantimentos. Das vezes ela me pegava para ouvinte, sempre fui um bom ouvinte, ela lamuriava dos seus atos impensados ou pensados e praticados malandramente e que tantos sofrimentos acrescentaram ao seu viver.

Um dia ela também descansou, os vizinhos notando que janelas e portas permaneciam fechadas, que não aparecia no portão da casa, lá adentrando a encontraram morta.

Passados alguns dias do seu enterro, apareceu em nossa casa um dos filhos da Madalena que simplesmente me entregou um diário, uma lembrança, O Diário de Madalena, disse que o lera, e eles, os filhos, não foram citados em nenhuma daquelas páginas e que acharam por bem deixá-lo conosco e os relatos se iniciavam no tempo em que ela fora morar na casa do Zé Tenório até seus últimos dias de vida, neste diário em muito agradecia a minha mãe que tanto a ajudara mesmo sabendo do seu comportamento nada exemplar...

Assim que o rapaz partiu, avidamente fui lendo o diário, lágrimas e mais lágrimas a Madalena foi transformando em palavras ao relatar a sua profunda amargura por ter tão tardiamente compreendido o verdadeiro sentido do amor...

Magnu Max Bomfim
Enviado por Magnu Max Bomfim em 19/07/2011
Reeditado em 26/07/2011
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