O DEFUNTO E A CLARINETA

 

Versão dum Conto Popular

 

Havia numa cidade do sertão dois afamados clarinetistas. Mas os músicos não eram, nem um pouquinho, amigos. Eram, sim, rivais; tocavam em bandas diferentes e andavam sempre de rusgas. No entanto, a ponto de não trocarem palavras, lá isso, nunca estiveram; sustentavam sempre boa política.

Uma vez, encontraram-se num boteco da cidade e pegaram a conversar com os freqüentadores.

Um deles disse aos demais:

— Acabo de tocar a poucos dias numa festa do Senhor do Bonfim, em tal cidade.  Quando a procissão saiu, nossa banda tocava um dobrado tão lindo, que meti a clarineta na boca, compadres, com tal gosto... Foi um espanto geral! Todo mundo admirava e nenhum outro instrumento sobressaia ao meu. Foi então, que se viu o Senhor do Bonfim mover-se no andor, como que a subir ao céu, admirado dos sons que saiam de minha clarineta. Os padres, a irmandade, o povo, tudo estava voltado para mim e de boca aberta diante daquele milagre. Foi preciso parar o dobrado para que a procissão continuasse a marcha e o Senhor do Bonfim ficasse quieto no andor!

O outro músico ouviu, pacientemente, aquele “papo” do rival. Por fim, pediu a palavra e saiu-se com esta:

— Isso não é nada em comparação com o que se passou comigo na cidade Fulana. Fui tocar no enterro de um ricaço. Tinha gente como formiga! Começamos a marcha fúnebre. A minha clarineta chorava que dava gosto. O povo estava apatetado, olhando para mim, como a minha música fosse uma coisa nunca vista, vinda do céu. Não havia quem não chorasse ao som de minha clarineta, que não havia igual em toda a redondeza. Eu continuei, e quando ia ao melhor da marcha fúnebre, o caixão começou a mover-se, a tampa abriu-se e o defunto, ao som do meu instrumento, foi-se levantando, até que ficou de pé. E voltando-se para mim, gritou entusiasmado:

— Vá tocar clarineta... no diabo que te carregue!

____________________

Agradeço a leitura e, antecipadamente, qualquercomentário.

Se vocêencontrarerros (inclusive de português), porfavor, meinforme.

Ricardo Sérgio
Enviado por Ricardo Sérgio em 05/03/2008
Reeditado em 15/07/2008
Código do texto: T888600