Flertando com Madame

Madame estava só, sentada em um bistrô, admirando a vida noturna na Cidade das Luzes, mal iluminada no momento pelas luzes de postes, mas ainda assim, Paris. Nunca se importou de ter uma mesa só para si, desde que uma taça de vinho e uma boa música a fizessem companhia.

Mas não pôde deixar de notar aquele homem no balcão. Cabelos negros, como a graúna e olhos esverdeados e pidões. “Peça que eu dou” – Pensou consigo mesma, enquanto repentinamente, sentiu o ambiente esquentar e não era a vela, que tremulava a sua frente.

Senhora de si, estufou o peito, tanto que quase desabotoou a blusa que vestia, realçando o seu decote. Piscou para ele, no exato instante, que uma poeira decidiu pousar em seus olhos...

Mesmo tentando se controlar, a ardência levou a uma compulsiva piscadela. Seu mundo embaçou, como um quadro de Monet e lágrimas escorriam compulsoriamente, mais do que em seus momentos mais tristes.

Começou a agitar o ar com as mãos na vã tentativa de expulsar aquele corpo estranho, quando sentiu um solavanco em seu corpo. Dois braços fortes a comprimiam por trás, sufocavam seu diafragma, enquanto uma voz agoniada murmurava: “Senhora, expire fundo”. Não estava engasgada, mas tantos apertos a impediam de explicar. Ainda tentou bater na mesa, como um lutador, que implora o fim do combate, mas inutilmente.

Pareceu uma eternidade, mas quando enfim o terremoto passou, a nitidez retomou e conseguiu balbuciar em seu melhor francês: “Je suis bien”. Finalmente, observou que o homem do balcão não estava mais lá. Diante dela, apenas o garçom, seu pseudo-salvador, com o rosto mais transparente que sua taça. Constrangido, ele tentou se desculpar.

Mas Madame não podia aceitar tamanha impertinência. Resoluta e altiva, lhe disse sem vacilar: “A conta e você em meu quarto”. Saiu bamboleando, sem olhar para trás ou perder a pose. Suspirou intimamente: “Meu herói”.