Toco Cru Pegando Fogo (Uma Estória Que Minha Mãe Contava)

Em um reino distante, morava um Rei, muito bondoso e generoso, junto com a sua amada esposa, a rainha.

Eram adorados e respeitados pelo seu povo.

E assim reinava o bom Rei, praticando sempre a bondade e a justiça para com o seu povo, e vivam todos muitos felizes nesse reino.

Só faltava algo ao bom rei e a sua amada rainha.

Eles não eram totalmente felizes, pois o destino lhes privara da coisa mais importante para a vida de um casal, um filho, assim queria o rei, para herda e perpetuar sua linhagem, ou uma filha, assim queria a rainha, para que pudesse lhe pentear os cabelos e vestir lindos vestidos que ela mesma criava e costurava, junto com suas aias.

Mas, ambos, Rei e Rainha aceitavam o que o bom Deus lhes concedesse, queriam mesmo era uma criança, para alegrar ainda mais a vida daquele feliz reino.

Um dia resolveram dobrar os joelhos, e apelar para o amor do grande Deus, e nas orações assim falou o rei.

- Grande Deus misericordioso, tenho sido um bom Rei para o meu povo, e tenho tratados a todos com amor e caridade, mas nos falta um herdeiro, e se até mesmo Tú tens um Filho, permita nos termos o nosso, não precisa ser perfeito como é o seu, ou como são os filhos do meio reino, peço apenas que seja fisicamente e mentalmente perfeito.

Assim terminaram suas orações e foram praticar, porque como ter filhos se não praticar não é mesmo?

Passaram se os meses e para a alegria do rei e de todo povo do reino a barriga da rainha começou a crescer, e nove meses depois, que é o tempo certo de se ter um bebe, eis que nasce uma linda menina, olho verde e cabelo dourados, parecia um anjo, sim anjo e não anja, porque anjos não tem sexo. E passam se os anos e a menina cresce cada dia mais linda, mas... para tristeza de todos, a menina nunca chora, não ri e nada fala.

Que tristeza para o rei, para a rainha e todo o reino, faziam de tudo, davam lhes de tudo, mas nada, a princesa não falava e nem fazia nada.

Lembrou-se então o rei das suas orações e muito se lamentou, não devia ter pedido assim, orou errado.

Então chamou a rainha e voltaram para o quarto e se colocaram novamente de joelhos e orou assim o rei.

- “Pai celestial, obrigado por ouvir minhas orações, obrigado pela filha linda e maravilhosa que nos presenteou, obrigado por nos fazer tão felizes, Mas o Senhor também sendo Pai, deve entender a dor que é ver uma filha, tão linda sem sorrir e sem falar, conceda-os mais esse desejo, de ouvir a voz de nossa filha, dizendo qualquer coisa que seja, mas que fale”.

Dias depois dessa oração, pela manhã, na hora da refeição matinal, a rainha, sentada á mesa, olha pra filha e sem se dar conta pergunta,

- Filha o que você quer comer nessa manhã”

E ela nada responde.

- Fala filha, diga alguma coisa, o que você quer?

- "Toco cru pegando fogo” diz a menina.

A rainha quase cai de costa, tamanha a surpresa e a alegria.

Todos na sala ouviram e gritaram maravilhados.

“ a princesa falou” , “a princesa falou”

Chamaram o rei que veio correndo.

- Fala filha, fala com o papai fala, qualquer coisa filha, fala...

- Toco cru pegando fogo - repete a menina.

O rei não acredita, e pensando ser uma brincadeira,

Abraça a filha, grita, ri, pula. Abraça a rainha, abraça a todos.

- A minha filha falou, minha filha falou - Repete o rei.

- Calma querido, assim você assusta a menina.

E a princesa, impassível, assiste a toda algazarra, sem entender.

- Tem razão, diz o rei, e também não entendi nada o que ela falou.

O rei senta na cadeira, coloca a filha nos joelhos, olha nos seus olhinhos verde esmeraldas e diz.

- Fala filha com o papai, o que você falou mesmo?

- "Toco cru pegando fogo” diz a menina.

- O que é isso minha filha?

- Você falou muito rápido e o papai não entendeu nada.

- Fala de novo fala!

- “Toco cru pegando fogo” repete a menina.

- Ai meu Deus, o que foi que eu fiz! Lamenta o rei, lembrando-se da oração que fez.

E assim, passaram se os anos, a menina já com 20 anos continuava sem sorrir e quando falava só saia àquela frase, louca e sem sentido.

- “Toco cru pegando fogo”

O rei se reúne com sua esposa e tomando uma decisão baixou um decreto.

DECRETO DO REI

A PESSOA, DESSE REINO OU DE OUTRO REINO, QUE CONSEGUIR FAZER A FILHA DO REI FALAR E SORRIR GANHARÁ PARTE DO REINO, E SE FOR HOMEM GANHARÁ TAMBÉM A MÃO DA FILHA DO REI EM CASAMENTO.

- Nem é preciso contar quantas pessoas apareceram para tentar.

Bruxas, bruxos, príncipes, caçadores, mendigos, palhaços, mágicos e bobos da corte, médicos e tantos e tantas que davam voltas no palácio. Mas nada conseguiam.

Existia no interior do reino um rapaz, muito bonito e inteligente, filho de uma família muito pobre, ajudava seus pais trabalhando na roça, capinando e plantando, sua diversão era tomar banho de rio e ficar olhando os viajantes que passavam em seus cavalos e carruagens, e seu sonho era poder um dia ir pro palácio ser soldado do rei, mas isso, todos os rapazes queriam.

Um dia, sentado na beira do rio, chegou um cavaleiro, elegante na suas roupas reais, e contou que era um príncipe de um reino distante, e veio pra casar com a filha do rei, e contou a história da moça, crendo que a sua beleza e riqueza faria a moça sorrir e falar.

Pedro Malazarte, esse era o nome do jovem pobre, entendeu na hora que não era isso que faria a moça falar, e depois de conversar com seu pai e a sua mãe, saiu caminho a fora, com suas roupas surradas e um embornal (tipo de bolsa de pano), com um pedaço de pão pra comer pelo caminho e uma cabaça com água, caso sentisse sede.

Depois de um bom tempo de caminhada, encontrou na beira do caminho um ninho cheios de ovos, pegou uns, colocou no imbornal pra comer no caminho.

Mais umas horas depois encontrou um pedaço de pau, engraçado,

porque era fino de um lado e grosso do outro e meio torto, parecendo um colher de pau, só que torta. Guardou também o pedaço de pau no imbornal e seguiu.

Quase chegando ao palácio do rei, encontrou um montinho de bosta de boi, já bem seca, e sem nem mesmo saber o porquê, guardou aquilo também no embornal.

Chegando ao palácio viu a grande fila de pessoas na frente do portão do palácio, todos pra tentarem a sorte, entre eles estava o príncipe que lhe contara a história e sua caravana.

Sabendo que demoraria a ser atendido, e já com muita fome, aproveitou a carroça que saia com os barris de dejetos reais, e quando os lacaios colocavam os barris vazios de volta na carroça, Pedro entrou dentro de um, e assim entrou na frente de todos no palácio.

Ao sair do barriu estava fedendo demais, mas como era promessa do Rei, foi levado até a sala real.

Todos torciam o nariz e faziam caretas, tamanho era o fedor do rapaz, mas a princesa, nem os olhos piscavam.

Mas ao chegar perto da princesa e se curvar, Pedro quase encosta nela, e era tanto o fedor que os olhos da princesa lacrimejaram, o espanto da rainha foi tanto que ela também chorou.

O rei, apesar da surpresa, já que sua filha nunca chorara, mandou o rapaz andar logo, pra acabar com o fedor.

Pedro, olhando pra princesa falou.

- Porque uma princesa tão linda assim como você esta chorando, posso saber?

A princesa queria dizer que era por causa do fedor de Pedro que os olhos dela ardiam de fazê-la chorar, mas quando abriu a boca saiu a já conhecida frase.

- "Toco cru pegando fogo”

E Pedro se curvando ainda mais, chegando bem perto da princesa pergunta.

- O que você disse mesmo?

Demonstrando irritação pelo fedor que emanava do jovem, e pela proximidade que ele estava dela, repetiu.

- "Toco cru pegando fogo”

Metendo a mão no embornal, Pedro retira um dos ovos, e estendendo a mão em direção da princesa diz.

- Então me frite esse ovo?

No que a princesa responde.

- E com que eu mexo?

E Pedro novamente enfia a mão na sacola e retira o pedaço de pau.

- Use esse pauzinho torto.

- Você fede a mérda. Diz a princesa.

Pedro enfia a mão novamente no embornal e retirando a mérda de boi responde.

- Não seja por isso, porque temos aqui uma já seca.

Não se aguentando com as respostas e o fedor do rapaz a princesa solta uma gostosa gargalhada.

E grita já enjoada e irritada.

- Por favor, tirem essa coisa fedorenta e nojenta daqui.

O rei e a rainha se abraçam de alegria, enfim parecia que a sua filha se tornara uma pessoa normal. Choraram abraçando a filha felizes.

Mandaram então seus lacaios levarem o rapaz, darem lhe banho e o vestirem com roupas de um príncipe.

Quando Pedro se apresentou novamente no salão real, parecia mesmo um príncipe, sua beleza e elegância encheram de alegria os olhos da princesa que imediatamente o amou.

E assim com uma festa que durou vários dias o rei e a rainha realizaram o casamento de sua filha com o jovem, que se tornou herdeiro do reino e do trono, e lhes deram muitos netos.

E assim foram felizes para sempre (que é assim que se terminam histórias de príncipes e princesas).

FIM

Antonio Candido Nascimento
Enviado por Antonio Candido Nascimento em 26/02/2014
Reeditado em 26/02/2014
Código do texto: T4707123
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