Mudar o mundo

Jonas estava frustrado, riscou um fósforo e acendeu uma vela.

Era seu aniversario o quadragésimo, isso não o empolgava mais, afinal cada aniversario significava que estava ficando mais velho, isso era depressivo. Ele sempre ansiou fazer algo notável, admirável e grandioso, assim seu nome ecoaria pela eternidade nas lembranças da posteridade, mas isso não havia acontecido ainda.

Quarenta anos, isso o irritava amargamente, aos 33 Jesus havia mobilizado milhares de pessoas para um ideal aparentemente ilógico, provocou Roma, os poderosos fariseus e morreu como mártir, sendo até hoje homenageado e cultuado, enquanto Jonas não havia convencido nem o filho a ser homem.

Tentou se consolar, o exemplo de Jesus era pesado, afinal era dotado de milagres, logo lembrou de Alexandre, O Grande, o exemplo era destrutivo, aos 19 anos era chefe do exército macedônico, aos 32 havia conquistado quase todo o mundo conhecido na época, era idolatrado por seus homens e até nos tempos atuais a cultura helênica mantém seus vestígios evidentes na sociedade. Bem, já Jonas com muito custo conquistou sua mulher que agora era ex-mulher, a batalha se desenrolava sim, nos tribunais com pedidos de pensão.

Sentou, começou a pensar em uma possível oportunidade de tornar a sua existência em algo incrível, talvez não fosse necessário abalar os pilares da sociedade para realmente valer a pena e de tanto pensar no assunto começou a perceber que o seu desejo de fazer algo notável não era nada altruísta, estava mais preocupado com a fama e repercussão do que com o próprio feito, questionou em segredo se os notáveis homens da história queria ser notáveis ou o eram apenas pelas ações inconscientes impulsionadas pela desejo sincero de fazer o que tinha de ser feito, mas isso soava predestinação.

Ficou atordoado com o raciocínio, Jonas pegou o violão, ensaiou alguns acordes, como um estalo na cabeça lembrou de Mozart. Mozart aos 4 anos tocava cravo, aos 12 compôs sua primeira ópera, aos 13 foi nomeado violino-mestre e aos 17 era considerado veterano e lecionava, enquanto Jonas não conseguia nem fazer direito a porcaria da pestana no violão, Mozart não tinha necessidade de ser genial, e foi porque era, simplesmente incrível.

Estranho, intrigante, pessoas incríveis nasciam incríveis ou se tornavam incríveis ? Apesar que, talvez fosse possível que nenhuma pessoa fosse incrível, pois heróis eram heróis porque alguém atribuiu este valor a eles, um valor dado ou depositado por pessoas anônimas, Cristo, Alexandre, Buda, Maomé, Napoleão, Bismark, Hitler e tantos outros só foram o que foram porque pessoas os elevaram e acreditaram neles, sem desmerecer a genialidade de nenhuma desses, as circunstâncias foram essenciais. Besteira, tudo uma bobeira, Jonas estava querendo justificar sua inércia, mas tinha um pouco de lógica, nenhum general ganhava batalhas sozinho, soldados os heróis anônimos, que mesmo assim só puderam contar suas história de vencedores porque uma mente genial os guiou ao triunfo.

Como explicar a genialidade de Aristóteles, Platão, Plínio, Kant, Hegel, Michelangelo, Da Vinci, Donatelo, Bocaccio, Camões, Rosseau, Voltaire e a enorme lista que segue, embora todos correspondessem apenas as correntes de pensamentos vigentes, seus parênteses sublinharam a história.

Jonas parou diante da sua janela, sentiu uma profunda amargura, ninguém era genial, eram apenas mais sensíveis, outros mais esforçados, dedicados, abnegados e embora um nome o intrigasse mais que todos, Mozart. Abaixou a cabeça e ficou triste, o que não se pode crer, descremos, creditando ao arquivo de lendas. Jonas fez assim, e acabou por descrer na sua capacidade de fazer algo genial. Ao encanto de Mozart que genial como foi encantou sem nada destruir.

Fugiu dos pensamentos, Jonas chegou a conclusão de que devia fazer o que devia ser feito, saiu da casa e mandou as máquinas voltarem ao serviço. Era dono de uma das maiores madeireiras instalada na Amazônia, entendeu que já estava fazendo muito para mudar o rumo da humanidade, não da forma como idealizou, mas do jeito que devia ser feito.