O DIA QUE O DEFUNTO FALOU

Em tempos passados as péssimas condições das estradas somadas à precariedade do meio de transporte tornavam longínquas as pequenas distancias. Uma viagem do campo para a cidade levava horas, dependendo da distancia até dias, no caso do carro de boi, por exemplo. O meio de transporte mais rápido limitava-se ao lombo do cavalo que conduzia no máximo duas pessoas. Quando surgiram os primeiros veículos motorizados para o transporte de cargas foi uma verdadeira conquista. O creme de leite produzido nas fazendas passou a ser recolhido por caminhões, dando trégua aos animais que o transportava. Uma boa opção interligando campo e cidade. O veiculo andava sempre abarrotado de produtos e produtores do campo para a cidade.

Zé do Rancho era morador na divisa de uma fazenda, tinha lá meia quarta de terra nada mais que isto, além do rancho mal conservado. Vivia mais da caça e da pesca do que do próprio trabalho no cultivo de lavouras. Despreocupado nunca imaginava que um dia a morte poderia surpreendê-lo e ceifar sua vida. E foi o que aconteceu, sofreu um treco à tardinha e bateu as botas. Avisados pelo ocorrido, os vizinhos se reuniram para velar o Zé. Constatou-se então que o pobre Zé era bem mais pobre do que se imaginavam Nenhum recurso financeiro no seu casebre foi encontrado. Se fosse aos remotos idos do passado, até que poderiam sepultá-lo por ali mesmo, mas as coisas já estavam evoluindo e já não se permitia um sepultamento sem um registro de óbitos. O recurso era levar o Zé para a cidade.

Liderados pelo vizinho fazendeiro, que cedeu seu cavalo de sela para a viagem, os amigos decidiram ratear as despesas entre eles, ficando acertado que mandariam um mensageiro á cidade e providenciaria o funeral. Escolheu o Maneco um cabra destemido, acostumado a cavalgar longos percursos, altas hora da noite, teria que chegar a cidade antes das oito, horário que o comercio baixava suas portas, Chico da Inhá era o carpinteiro que fabricava caixão. Na manhã seguinte no romper da aurora eles trasladavam o corpo do Zé numa padiola de madeira roliça. Chegariam á cidade por volta do meio dia e encontraria o caixão já preparado, era só abrir à sepultura e consumar o enterro. Aconteceu que Juvenal motorista do caminhão que recolhia o creme das fazendas, encontrou o Maneco, mensageiro responsável pelo funeral. Ao tomar conhecimento do ocorrido; sendo ele muito prestativo se oferceu para levar o caixão ao encontro do grupo, uma vez que iria mesmo pelo trajeto cumprindo seu trabalho. Assim facilitaria e o defunto estaria mais protegido da chuva fina que caia desde a madrugada.

Foram até a casa do Chico o caixão quase pronto, daí a poucos minutos o carpinteiro fez o arremate final. Ajeitaram o vasilhame à frente na carroceria e colocaram o caixão na traseira. Maneco resolveu acompanhar indo ao encontro do cortejo fúnebre. Deixou o cavalo num pastinho que o carpinteiro mantinha para estas ocasiões na periferia da cidade. Como não havia espaço na cabine ele entra na carroceria. Meia hora após a chuva começou a engrossar, ele entrou no caixão, para se proteger, e acabou adormecendo abatido pelo cansaço do dia anterior. La pelas dez horas Juvenal encontra o grupo pela metade do caminho, desceu, nem deu pela falta do Maneco, imaginado ter ele se juntado ao grupo. Subiram no caminhão e foram descer o caixão. Alguém logo reclamou: - poxa fizeram o caixão de madeira verde tá pesado pra diabo! – Pesado nada! O diabo sou eu! Respondeu o Maneco que abava de acordar com a movimentação. Não ficou um pra contar o caso. Esparramaram todos na capoeira, até o Juvenal correu, meia hora após Maneco conseguiu convencê-los a voltar desfazendo o mal entendido e puderam seguir o cortejo.

Geraldinho do Engenho
Enviado por Geraldinho do Engenho em 09/05/2011
Reeditado em 09/05/2011
Código do texto: T2958179
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.