O Homem e o Mundo - O NASCIMENTO

Ele andava com determinação pela vegetação da caatinga... lembrava da história que seus pais contaram tantas vezes que parecia que ele também presenciou tudo. De como ele foi abandonado pela sorte no dia em que nasceu, lá naquele casebre de pau a pique coberto de palha de coqueiro, no interior pernambucano. Seus pais sempre trabalharam arduamente na roça, eram pessoas simples, religiosas, mas embrutecidas como somente o tempo e o sofrimento, oleiros do destino, são capazes de moldar. Evitavam multidões, a vida isolada os transformou em criaturas “anti-sociais”. Falavam pouco. Apenas quando o assunto era sério demais as palavras pulavam o cercado do silêncio e galopavam pelos campos do diálogo. Seu nome era incomum, na verdade uma raridade que surgiu de uma quase tragédia nordestina. Sua mãe Maria do Rosário estava no nono mês de gravidez e ele teimava em não nascer. Houve uma complicação no parto. O cordão umbilical deu um laço em seu pescoço. Sua mãe sentia muitas dores e o garoto custava a nascer. A parteira da região se chamava Dete e era quem aparava todos os recém nascidos daquelas bandas. Contudo seus esforços pareciam ser inúteis, e todas as suas técnicas haviam falhado. Não adiantou muito soprar numa garrafa, nem tampouco arrudiar com arruda a barriga dela. Por mais que fizesse o menino não vinha e pouco a pouco a situação se agravava. Estavam condenados, mãe e filho, não passariam daquele dia, caso um milagre não se manifestasse. Desesperados seus pais fizeram ao mesmo tempo uma promessa silenciosa e finalmente a graça chegou e o garoto nasceu. Abriu na mesma hora o maior berreiro. O conteúdo da promessa? Seu pai prometeu que se os dois escapassem mãe e filho, daria ao menino o nome do maior santo dos céus: Deus. Sua mãe prometeu que se seu filho nascesse perfeito e com saúde receberia o nome da parteira para nunca esquecer a pessoa que ajudou a botá-lo no mundo. E agora? Duas promessas feitas simultaneamente que nome o garoto teria?

- Se chamará Deus! (disse o pai).

- Isso é sacrilégio homem, se chamará Dete! (retrucou a mãe).

- Dete? Mas isso é nome de mulher!!!

E agora o que fazer, pois cada um estava certo que sua fé fora responsável pela bem aventurança. E nessa pendenga silábica, passou-se três horas. Já sem argumentos, o cercado das palavras estava vazio, ambos concordavam que o menino precisava de um nome e nenhum deles queria quebrar a promessa. Foi quando a parteira sugeriu:

- Porque não colocam Deusdete?

- Deusdete? (grunhiram os dois ao mesmo tempo).

- É e assim sendo a promessa dos dois será paga.

Os pais se olharam aliviados porque nenhum dos dois precisaria quebrar a promessa. Estava decidido. Se chamaria, Deusdete!