Romper de Eos

Estes dias de outono têm sido tão frios que tenho a impressão de que não há roupas capazes de me aquecer.

Isso me fez pensar em como gosto do verão ameno da minha cidade, tão diferente daqueles verões abafados em que o asfalto parece evaporar e deixar o cheiro da civilização evidente demais quando a chuva finalmente despenca das nuvens.

Aqui o calor é aplacado por deliciosas brisas de árvores fincadas em montanhas que cercam toda a cidade e elas balançam quase que dançando quando a chuva se precipita.

Definitivamente, o verão é uma estação que me traz conforto.

Hoje, estive divagando sobre como seu cabelo claro poderia ser fundido com o brilho do sol de uma dessas manhãs de verão...

Pensei na possibilidade desse fogo solar queimar incessante e nunca se apagar, me senti confusa sobre se isso é bom ou não.

Minha única certeza era de que eu já estava tão encantada pela imagem das nuances douradas dos seus fios se misturando àquela luz áurea, ao tempo em que observava o seu semblante sério, escondendo o seu senso de humor espetacular.

Eu não poderia te ver com olhos melhores do que esses. Estes lampejos vinham em ondas de saudade que me levavam diretamente àqueles sonhos que havia comentado com você, extremamente vívidos e intensos.

Percebi a aproximação do outono, por acaso, quando apontei ao céu e disse para a minha mãe que não havia estrelas visíveis. Ela deu de ombros como se eu estivesse fazendo uma dedução boba de tão corriqueira.

Eu acho que as pessoas deveriam olhar para o céu com mais frequência.

Senti como se um dos meus desenhos de criança tivesse sido rejeitado por ela com um comentário do tipo: “é.. bonitinho, guarda lá na gaveta para não fazer bagunça”.

Essa constatação ficou suspensa no ar e notei que, além de tudo, o céu estava cinza e tudo aquilo ressoava com o que se passava dentro da minha própria consciência.

Um dia atrás estava assistindo muitos vídeos sobre praias negras, geladas e isoladas no mundo.

Aquilo tudo soou como um prenúncio de que eu estava para entrar novamente no olho de um furacão, prestes a observar o mundo girar e se desfazer em partes que podiam me atingir mortalmente, enquanto eu permanecia inerte vivendo todas as estações do ano ao mesmo tempo, mas agarrada ao meu cálido sonho de verão.

Cassia Hecari
Enviado por Cassia Hecari em 29/03/2024
Reeditado em 29/03/2024
Código do texto: T8030457
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