uma carta que escrevi para meu melhor amigo falecido

São Paulo, 05 de março de 2024

Querido Seu Benedito,

Eu só precisava falar com o senhor agora. E dói não poder fazer isso. Hoje, uma menina chorou na minha aula porque eu falei o quanto eu amava as estrelas e ela me disse que o avô dela ensinou todas as constelações, mas que ele faleceu uns dias atrás. Seu Benedito, eu não chorei com ela por pouco. Mas eu olhei no fundo daqueles pequenos olhos, de uma criança inocente, mediante a imensidão assustadora da vida e da morte, e disse: “Querida, eu sei como se sente. Eu também perdi alguém importante pra mim, que me ensinou muitas coisas.”. E ela limpou os olhinhos e foi lavar o rosto.

Seu Benedito, chorei na missa hoje, falando pra Jesus te dizer o quanto sinto a sua falta. O quanto queria te contar sobre as minhas alunas. O quanto elas são inteligentes e têm um brilho nos olhos de curiosidade.

Muitas delas choraram na minha aula, e isso me marcou profundamente. Eu só pedi que pensassem sobre seus sentimentos. Teve uma que chorou porque sua irmã tinha fugido com o namorado. Outra chorou porque o pai batia na mãe e agora se divorciaram e ela não pode vê-lo por medida protetiva. Tantas coisas tão me marcando. Ser professora dessas meninas é aprender todos os dias.

Seu Benedito, só me sinto sozinha. Sinto que chego em casa e a noite é longa, dura. Sinto falta dos meus irmãos. Da minha mãe. Do meu pai me contando de um filme ou fazendo uma piada aleatória. Sinto falta das minhas amigas.

Isso não significa que estou triste aqui, não estou. Eu gosto da minha vida aqui. Ela tem muito mais sentido aqui, sinto que estou mais feliz e menos presa em mim mesma, que estou doando tudo que tenho para meninas que realmente precisam. Mas, quando volto para casa do trabalho… parece que toda felicidade se esvai e eu caio num abismo que me faz perceber o quanto estou fugindo de pensar.

Seu Benedito, o que eu estou fazendo? Eu não sei. Para onde eu deveria ir? Eu também não sei.

Você não me reconheceria totalmente, eu acho. Eu mudei um pouco. Eu comecei a tomar álcool para esquecer dos meus problemas, como todos adultos idiotas fazem e que eu julgava tanto. Comecei a pensar em dinheiro, em contas, em “o que posso fazer para ter mais dinheiro”. Eu virei uma adulta ridícula, como as pessoas grandes do Pequeno Príncipe que veem números em tudo.

Seu Benedito, é mentira. No fundo, eu ainda sou aquela menininha que te pedia ajuda. Porque eu preciso de você mais do que qualquer pessoa agora. Eu só precisava ouvir sua voz serena e segura, e com sua mão apertando o meu pulso. Eu ainda sou aquela menininha inocente que acredita no amor. Que acredita que a vida foi feita para encontrar o amor. Eu acredito nisso ainda, mas acredito mais que, no fundo, eu fui feita para amar e para terminar no Amor. Mas, talvez, não para ser amada.

Eu sinto que Deus me ama, mas que só vou sentir isso plenamente quando encontrar-me com Ele no Céu. Aqui na Terra, eu só preciso amar o suficiente para encontrá–Lo no Céu. E encontrar com você no Céu. Acho que é isso que está me movendo ultimamente.

“O que te move?” você me perguntava tantas vezes, e cada vez eu respondia alguma coisa. A maioria das respostas durava umas cinco horas.

“O amor”, seria minha resposta hoje.

Essa resposta dói. E não quero pensar no porquê essa resposta dói.

Mentira, talvez porque eu responderia: “Dinheiro” ou “Ambição”.

A menos se você me perguntasse. Eu diria a verdade. Eu diria que, no fundo, tudo que eu faço é por amor. E só você entenderia isso.

Seu Benedito, eu queria que ainda estivesse vivo. Desculpa por não aceitar a sua morte. Por querer que esteja aqui. É a pior coisa que poderia querer para você. Eu sou tão egoísta. Mas estou tão sozinha.

Sinto sua falta.

Leninha.