Carta para mim mesmo daqui a cinco anos (A resposta)

Querida B. de cinco anos atrás,

Devo começar essa resposta a sua carta dizendo que fiquei muito comovida pelo tom melancólico e otimista de sua carta. Espero ter conseguido ser a mulher que você almejava que eu fosse a essa altura da nossa vida. Você saberá a resposta ao ler as singelas linhas que escreverei a ti. Prometo responder todas as tuas perguntas.

Sim, você ainda pode me chamar de menina. Eu ainda pareço muito com a menina que fui a cinco anos atrás. Pelo menos fisicamente. Já emocional e mentalmente eu devo confessar que já não sou aquela menina ingênua e otimista de antes. Eu estou calejada. Cinco anos cobraram seu peso sobre mim. Mas, em alguns momentos, ao olhar o espelho, eu ainda vejo muito de você e agradeço por isso.

Hoje tenho 25 anos e sou oficialmente uma adulta – apesar de você já ser uma adulta a cinco anos atrás. Mas eu entendo não se sentir uma anos atrás. Você ainda estava tateando o universo adulto, se adaptando a vida acadêmica, ao trabalho que havia começado poucos meses atrás. Você foi uma guerreira. Estou orgulhosa por ter prosseguido. A mulher que me tornei hoje deve tudo a você e sua garra, mesmo em todos os momentos difíceis que enfrentamos ao longo desse tempo.

Respondendo a sua pergunta se me tornei a mulher que você desejou que eu fosse ou me reinventei, posso te dizer, com orgulho, que eu sou, sim, a mulher que almejou. Todavia, eu também me reinventei muito, sobretudo no ano passado, em que passei tanto tempo em casa. Aproveitei esse tempo para pensar em mim e buscar melhorar como ser humano. Sou a mulher que você desejou: sou forte, inteligente, leal, honesta, trabalhadora e feliz – mesmo que eu ainda traga o mesmo ar melancólico que você tinha.

Eu me formei há quase dois anos e foi um momento muito emocionante. Eu pensei que não iria conseguir, mas a sua garra nos impulsou e conseguimos. É nossa conquista. Mesmo não totalmente convencida da nossa vocação nessa área, eu estou feliz. E quero te contar que estamos prestes a começar o curso que você sempre quis fazer. Estou tão animada. Nós vamos conseguir, de novo. Estamos bem, viu?

Quanto ao emprego, estamos no mesmo. Mas estou feliz. Amo meu trabalho. Eu passei por uma mudança, passando a trabalhar na minha cidade, mas vou voltar a trabalhar onde trabalhava na época da sua carta. Contudo, estou bem. Saudade dos colegas e tudo tem um propósito.

Não há tantas novidades na minha vida. Voltei a ler bastante, assim como lia na adolescência. Eu sentia faltar de ler. Livros continuam sendo a minha paixão. Também tenho escrito bastante. E tenho me aperfeiçoado a cada dia mais. Confesso que passei um tempo sem escrever muito após a sua carta, mas eu me encontrei nas palavras nos momentos em que me sentir tão perdida. Sofri muitas decepções ao longo desses cinco anos, mas também tive muitas alegrias. A minha fé em Deus se fortaleceu bastante e a minha autoestima melhorou muito com o tempo.

Ainda sou uma garota comum, como você nos descreveu há cinco anos: 1,70m, muito magra, com cabelos cacheados cheios, óculos grandes – nosso problema de visão piorou com o passar dos anos. Ainda pareço mais menina que mulher. Mas sou uma mulher. Sou linda, maravilhosa e surpreendente assim – suas palavras. Meus defeitos são gritantes, minha personalidade é forte, ainda tenho discussões internas ferrenhas, tenho opinião sobre tudo – como alguns parentes gostam de dizer, mas adoro o meu jeito, assim como você adorava. Sou largada, mas não tão leve como antigamente. Há sempre algo me preocupando, porque a nossa vida não tem sido fácil, mas não devemos reclamar, só agradecer. Sou livre para ser quem sou. Muitos tentaram nos calar, nos diminuir, mas resistimos. As pessoas ainda me acham muito diferente, mas eu não me importo. Eu conservei muito de ti em mim.

Gosto da minha própria companhia. Aproveito para ler, escrever, assistir séries, ouvir podcasts – hábito da quarentena. Comecei a tomar álcool – mas especificamente vinho tinto. Aprecio as conversas de madrugada, regada a vinho, na companhia da minha melhor amiga. Aprendi a ser mais vulnerável, a não me fechar tanto em mim, como eu fazia. Ainda não sou totalmente aberta. Ainda prefiro guardar o que sinto, penso e sonho para mim, mas entendi que ser forte não precisar ser uma rocha. Tenho tentando ser mais sensível. Ou melhor, tenho demonstrado toda a minha sensibilidade, minha intensidade para quem realmente quer saber quem eu sou.

Não exalo tanto felicidade como você, há cinco anos. Tenho sido mais contida. Já não cometo mais a gafe de rir quando não deveria ou tenho rido tão exageradamente. Sou uma pessoa mais séria. Os momentos de alegria são mais raros, mas não menos felizes. Todavia, eu conservo a empatia em mim. Falo com as pessoas sem julgá-las. Me coloco no lugar do outro, para entender sua dor. Não gosto de injustiças e acredito na igualdade. Acho que ainda sou uma sonhadora como você e tudo bem. Sabe, as pessoas ainda nos acham grossa, mesmo que a intenção não seja essa. A minha doçura está balanceada pela amargura da vida. Sou muito prestativa, ávida a aprender e ensinar o que sei, mas não me considero uma pessoa inteligente. Tenho amigos que são verdadeiros crânios.

Ah, claro, você tinha que me perguntar sobre o amor, né, sua danadinha. Caramba! Nisso eu acho que não me sai tão bem quanto você gostaria. Desculpa. Mas você deveria saber que eu carregaria o medo de me apaixonar nesses cinco anos. Eu gosto de ter tudo sobre controle. Eu tenho medo de deixar as pessoas me amarem. Só que eu me abri, mesmo que relutantemente. No entanto, não foram as experiências mais incríveis da minha vida. Eu quase me apaixonei nesse mesmo ano em que escrevi a carta, mas não foi recíproco. Demorei a me recuperar e estava focada demais em viver um dia de cada vez. Só que o amor bateu de novo a minha porta, mas eu fiquei apavorada e recuei. Eu fui estúpida e covarde. Agora é tarde demais. Mas eu acredito no amor. Sei que a minha pessoa chegará. Ela só está tão atrasada quanto eu. Não deu certo até agora porque não era para ser.

Enfim, nós merecemos a felicidade.

Nossa! A carta ficou longa, mas foram cinco anos. Eram tantas coisas para contar. Espero ter respondido todas as suas perguntas, minha menina. Mas, acima de tudo, eu espero que você esteja orgulhosa de mim, como estou de você.

É isso.

Beijos.

À sua B. cinco anos depois.

Belinda Oliver
Enviado por Belinda Oliver em 02/02/2021
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