O LAVA PÉS - carta 099

0 LAVA-PÉS

Um padre gaúcho, amigo e humilde, pede subsídios para a

pregação da Semana Santa.

Meu caro companheiro,

A narrativa bíblica Jo 13

1 Antes da festa da Páscoa, Jesus sabia que tinha chegado a sua hora. A hora de passar deste mundo para o Pai. Ele, que tinha amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim.

2 Durante a ceia, o diabo já tinha posto no coração de Judas Iscariotes, filho de Simão, o projeto de trair Jesus.

3 Jesus sabia que o Pai tinha colocado tudo em suas mãos. Sabia também que tinha saído de junto de Deus e que estava voltando para Deus.

4 Então Jesus se levantou da mesa, tirou o manto, pegou uma

toalha e amarrou-a na cintura.

5 Colocou água na bacia e começou a lavar os pés dos discípulos, enxugando com a toalha que tinha na cintura.

6 Chegou a vez de Simão Pedro. Este disse: “Senhor, tu vais lavar os meus pés?”

7 Jesus respondeu: “Você agora não sabe o que estou fazendo. Ficará sabendo mais tarde”.

8 Pedro disse: “Tu não vais lavar os meus pés nunca!” Jesus respondeu: “Se eu não o lavar, você não terá parte comigo”.

9 Simão Pedro disse: “Senhor, então podes lavar não só os meus pés, mas até as mãos e a cabeça”.

10 Jesus falou: “Quem já tomou banho, só precisa lavar os pés, porque está todo limpo. Vocês também estão limpos, mas nem todos”.

11 Jesus sabia quem o iria trair; por isso é que ele falou: “Nem todos vocês estão limpos”.

12 Depois de lavar os pés dos discípulos, Jesus vestiu o manto, sentou-se de novo e perguntou: “Vocês compreenderam o que acabei de fazer?

13 Vocês dizem que eu sou o Mestre e o Senhor. E vocês têm razão; eu sou mesmo.

14 Pois bem: eu, que sou o Mestre e o Senhor, lavei os seus pés; por isso vocês devem lavar os pés uns dos outros.

15 Eu lhes dei um exemplo: vocês devem fazer a mesma coisa que eu fiz.

16 Eu garanto a vocês: o servo não é maior do que o seu senhor, nem o mensageiro é maior do que aquele que o enviou.

17 Se vocês compreenderam isso, serão felizes se o puserem em prática”.

(Jo 13, 1-17)

Inserido nos últimos ensinamentos de Jesus (dali a vinte e quatro horas ele já estaria sepultado), o lava-pés traz consigo uma vigorosa mensagem de amor e desprendimento que vara os séculos, sempre e cada vez mais, com a mesma atualidade e capacidade de interpelar. Não é o discurso de um homem amedrontado, mas de um Senhor, um kyrios consciente de sua missão que, em pleno vigor moral vai ao encontro da vontade do Pai.

Os grandes biblistas católicos, assim como a maioria dos protestantes, classificam o episódio do lava-pés como o grande portal de uma história de pathos (paixão). Por esta razão, seu valor teológico não pode ser minimizado. Ao contrário, carece de ser acrescido à narrativa histórica e aos aspectos culturais do judaísmo.

Hoje, a celebração litúrgica do lava-pés não passa de uma encenação meramente teatral que se repete a cada ano, quando o bispo ou o padre lava os pés de alguns “escolhidos”, em geral coroinhas ou egressos das elites paroquiais. E fica nisto. Não há a interiorização, e o gesto pedagógico que Jesus realizou, esvai-se logo ali, na saída da igreja. Sem interiorização não há mudança, não há compromisso nem conversão. Para ser real, eficaz e tocante, o lava-pés precisa estar encarnado na vida do povo, privilegiando o exemplo ao invés da representação. Ação que transforma, no lugar das palavras vazias de conteúdo.

Nesse particular, recordo, com emoção, uma cerimônia da qual participei, em 1983, em João Pessoa da Paraíba, na Catedral Nossa Senhora das Neves, quando o então arcebispo, dom José Maria Pires (hoje emérito) organizou um lava-pés classista (e mais esclarecedor), onde o maior devia ajoelhar-se aos pés do menor. Nessa cerimônia, o bispo lavou os pés de um padre; este, de um coroinha. Um militar lavou os pés de um subordinado; o gerente, de um funcionário do banco; o professor colocou-se a serviço de um aluno; a dona de casa, da empregada; o patrão ajoelhou-se aos pés do balconista mais humilde da loja...

De outra feita, em uma comunidade de bairro em Canoas, RS (Paróquia Santo Antônio), na entrada da Semana Santa, feita a motivação, os participantes do “círculo bíblico” lavaram os pés uns dos outros, com o desprendimento e a alegria de quem sabia o significado do gesto. É claro que mesmo nessas circunstâncias o rito não fugiu do aspecto sim-bólico (que une). Mesmo assim, ficou plantada a semente, foi deflagrado o processo de reflexão no sentido da erradicação do egoísmo, que não é virtual, mas eminentemente dia-bólico (que separa)

O lava-pés está inserido no grande bloco joanino (caps. 13–17) que revela uma unidade, na qual a Ceia e a Oração de Despedida de Jesus se interpenetram. Esse contexto, exceto o lava-pés não tem ação, mas discursos ricos em espiritualidade, capazes de suscitar futuramente na Igreja que estava nascendo, uma atitude de acolhida, amor e serviço desprendido. Há aí uma ponderável riqueza, teológica e ontológica.

Por estar inserido na abertura do “segundo livro” (13–21), o acontecimento do lava-pés é aberto com um conjunto de frases majestosas:

Antes da festa da Páscoa, Jesus sabia que tinha chegado a sua hora. A hora de passar deste mundo para o Pai. Ele, que tinha amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim. Durante a ceia, o diabo já tinha posto no coração de Judas Iscariotes, filho de Simão, o projeto de trair Jesus. Jesus sabia que o Pai tinha colocado tudo em suas mãos. Sabia também que tinha saído de junto de Deus e que estava voltando para Deus (vv. 1-3)

O texto revela que Jesus tinha ciência da gravidade daquela hora. Essa ciência é atestada pela repetição do verbo saber (Jesus sabia), nos vv. 1 e 3. Trata-se de um enunciado cristológico solene que vincula o Filho ao Pai e a seu projeto. A segunda parte do quarto evangelho nos mostra o Filho encerrando sua missão, sob o duplo signo da volta ao Pai e do amor extremo por seus amigos. Tudo começa a ocorrer em um jantar...

Durante a ceia...

Uma menção temporal de ponderável abrangência teológica,“...Antes da festa da Páscoa...” atua como pano de fundo do conjunto 13–21, pois a Páscoa passa a ser o maior ponto de interesse a partir daqui. Pois é nessa “grande festa” que será imolado o “cordeiro pascal”. Estava chegando a hora, tantas vezes anunciada.

Levando ao extremo seu propósito de amar até o fim, na cruz, antes de morrer, Jesus brada: tudo está realizado! tudo está consumado! Esta afirmação equivale a dizer que chegou a hora, tudo foi bem feito, a obra do Pai foi realizada, que foi pago o que era devido, e que a humanidade está definitivamente reconciliada com Deus.

Pois, havia “chegado a hora”... era preciso ultimar as coisas. O Pai havia posto tudo nas mãos de Jesus: poder de julgar (cf. Jo 3,35) e – sobretudo – salvar (cf. Jo 3,16). Em sua missão salvadora, Jesus é investido, da parte do Pai (cf. Mt 28,10; Jo 5,20) de poderes reais, totais e abrangentes, que só ao Filho de Deus é concedido. A hora de Jesus ocorre entre o veio de Deus e o para ele voltava..., isto é, aquela páscoa do Senhor, em que o plano divino estava se realizando. O que fora instaurado na encarnação, começava agora a tomar corpo e a se auto-explicar. Jesus sabia a importância dessa hora.

...e o que vou dizer? Pai livra-me desta hora? Mas foi precisamente para esta hora que eu vim (12,27).

Com relação à hora de Jesus, pode-se afirmar que, exceto em Jo 2,4 (Caná), “hora” refere-se ao momento de glorificação na cruz. Trata-se então da morte? Não exatamente! A morte, sim, mas com ela a ressurreição e tudo o que o conjunto paixão/morte/ressurreição significa no plano salvífico de Deus. Pois a hora precisa ser vista como a elevação e a glorificação do Filho (cf. 12,32). Sua explicitação ocorre com o ato de passar deste mundo para o Pai. Jesus viera do Pai e agora iria retornar,

O evangelista, como vimos, sinaliza que estava próxima a páscoa... Observa-se ali uma ambigüidade propositadamente colocada para fazer pensar. Qual seria esta páscoa? A dos judeus? ou a de Jesus (hora de passar deste mundo para o Pai)? Mais do que memorial, histórico e temporal dos judeus, a páscoa de Jesus é o grande sinal de quem deu a vida pelos seus amigos, sacrifício de perpétua memória (cf. Jo 10,10.17; 15,13). A pasxa de Jesus substitui a pesach dos judeus.

Em meu livro “Os sinais de Jesus”, eu coloco o episódio do lava-pés entre os sinais de Jesus. Há sinais miraculosos (estes são descritos no “Livro dos sinais” do evangelho de João 2,1 – 12,50) e sinais pedagógicos, descritos em todos os evangelhos, ali colocados propositadamente para a nossa edificação. Edificação esta, que deve ocorrer na vida social (material) e transcendente (espiritual). O v. 1 serve como um título que aponta para segunda parte do evangelho (vv. 18-38), onde se destaca:

• anúncio da traição (v.18);

• mandamento novo (vv. 34s);

• profecia da negação de Pedro (v. 38).

Ele, que tinha amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim (v. 1b).

Jesus já sabia que sua hora estava chegando. Era preciso inaugurar a passagem, a páscoa dos mortais para a casa do Imortal. Por causa de um amor sem medidas, o Pai havia entregue tudo em suas mãos (cf. 3,35). A obra da salvação era um feito sobrenatural que só o Filho podia fazer. O gesto do lava-pés representa o dom extremo que Jesus dá de si mesmo, e serve de paradigma à conduta de tantos quantos queiram ser seus discípulos. A hora de Jesus não se limita à sua morte, mas refere-se, privilegiadamente, como vimos acima, ao conjunto da escatologia. Ela é o marco da elevação-glorificação do Filho do Homem (cf. 12, 32). Ele ama, não só os seus, mas toda a humanidade, pois imolou-se por ela.

Essa passagem para o Pai é uma páscoa, como a travessia pelos hebreus do Mar Vermelho, fato que levou Santo Agostinho a dizer: “Ecce Pascha, ecce transitus” (“Eis a Páscoa: eis a passagem!”). A passagem une dois pólos: este mundo (o lado imperfeito) e o Pai (a perfeição). Jesus age com o poder que vem do Pai, por isso ele sabe o que faz. Começa como o logos de Deus, aquele que “veio ao mundo” (cf. 1,9), e termina como aquele que completou a obra (cf. 19,30).

Diante do mundo que planeja matá-lo, Jesus, luz desse mesmo mundo, lava os pés dos discípulos (inclusive os de Judas), como sinal de amor, perdão, comunhão e serviço. É por isso que o evangelista destaca de forma enfática: amou-os em plenitude, até o fim, amou-os “apesar de tudo o que ia acontecer”; amou até as últimas conseqüências. Este amor é a tônica dos capítulos 14, 15 e 17. Amar alguém até o fim implica em assumir suas expectativas, fazer história junto, querer e realizar seu bem, mesmo expondo-se a trabalhos modestos e de risco. Jesus tornou-se servo, obediente até a morte (e morte de cruz!) como ensina São Paulo (cf. Fl 2, 8). Jesus dá a vida pelos seus amigos (cf. 15,13). O ato real de lavar os pés dos discípulos adquire um sentido simbólico bem claro sob a moldura da revelação de um Deus-amor, feita através de Jesus, seu Cristo.

O “amou até o fim” é o que se poderia chamar de “fio condutor” que perpassa toda a mensagem contida nos capítulos 13–17. No contexto do evangelho de João, amar até o fim é uma resposta àqueles que não o receberam (cf. 1,11). Amar os seus é dedicar afeição àqueles que acolheram e acolheriam a missão de anunciar a boa notícia, por todos os tempos. O amor de Jesus pelos seres humanos foi demonstrado em toda a sua vida, mas é mais claro através da entrega de sua vida na cruz, e de sua presença, constante, efetiva e cotidiana no meio de sua comunidade (cf. Mt 28,20).

O serviço humilde e despojado de Jesus se realiza até as últimas conseqüências e se manifesta numa entrega profunda de toda a sua vida. A cruz sintetiza essa entrega. E justamente por causa da cruz, o diabo seria irreversivelmente derrotado. A cruz salvou a humanidade, afirma Santa Teresa. A partir dali a salvação é uma realidade atual e presente. Que não se diga “Jesus vai me salvar...”. Não! Ele já nos salvou de uma vez por todas, através de sua morte na cruz. Por causa de sua ação libertadora, de sua atitude de amor extremo, nos tornamos raça eleita, nação santa e, sobretudo, povo de Deus (cf. 1Pd 2,9s). Nesse particular, é notável observar que muitos tentam falar, tocar em Deus e no deserto do mundo ficam surpresos quando ele os acaricia.

É imperioso assinalar que o amor de Deus pela humanidade não se esgota na ressurreição de Cristo, mas se plenifica no dom do Espírito Santo (cf. 7, 39; At 2, 4) que atua como alma e memória da Igreja. E isto se torna claro no chamado “segundo livro” do Evangelho de João (13–21), onde a palavra amor e seus cognatos aparece 38 vezes.

A expressão “amou-os até o fim” não se refere apenas à morte-ressurreição de Jesus. O amor extremo é a partilha, por parte de Jesus, de sua filiação do Pai e sua comunhão no Espírito. Desta forma, não se pode deixar de notar (e proclamar) que amar é a característica mais notável de Jesus; afinal, Deus é amor (cf. 1Jo 4,8.16).

A partir do elemento água, Deus, criador de todas as coisas, visíveis e invisíveis, nos fala, através do seu Cristo. A água é contemplada como uma visão privilegiada desde o passado remoto. No contexto histórico-teológico de Israel, vemos a água como sinônimo de vida, limpeza, dom, sabedoria, graça.

No Antigo Testamento, as leis litúrgicas estabeleciam a limpeza com água, assumindo um caráter simbólico de purificação. Já no Novo Testamento, há uma menção mais clara do lava-pés como o exemplo de humildade e serviço que Jesus ensinou a seus amigos, com o fito de mantê-los unidos e fiéis (cf. 1Tm 5,10).

Para realizar seu primeiro sinal, em Caná da Galiléia (cf. 2, 1-11), Jesus usou a água, que os serventes colocaram em grandes jarros, para transformá-la em saboroso vinho. A mudança da água em vinho estabelece a passagem da antiga lei para a nova: da tradição judaica para o amor cristão.

No texto que ora se nos apresenta para estudo, vemos Jesus colocando água em uma bacia, para lavar os pés de seus discípulos, naquela noite de despedida, às vésperas do Calvário. Na literatura rabínica (e também grega), era um sinal de honra que se concedia a um discípulo, o privilégio de lavar os pés do mestre. O contrário, no entanto, nunca se ouviu dizer. São Paulo afirma que Jesus, na sua entrega, esvaziou-se (cf. Fl 2,7) tornando-se obediente (v. 9).

O trabalho de lavar os pés dos visitantes era tão ignóbil que nem os servos gostavam de fazê-lo, delegando-o a crianças, jovens, filhos menores. Talvez por isso Pedro tenha ficado tão chocado ao ver Jesus se dispondo a lavar os pés dos discípulos. Ele enxergou o fato com olhos meramente humanos e por isso resistiu.

Os monges, que recebiam peregrinos em seus mosteiros, a partir da Idade Média, acolhiam-lhes com um abraço e o ósculo da paz, lavando-lhes os pés, para demonstrar que aquela visita os enchia de alegria, e que eles estavam a serviço do hóspede. Esse gesto de generosidade, na sinapse da hospitalidade expressava seu seguimento ao gesto humilde de Jesus.

O lava-pés, como se verá no decorrer desta meditação é um prenúncio da páscoa de Jesus. Como um serviço prestado pelo maior ao menor, ele quer exprimir que a autoridade e a superioridade só podem ser compreendidas em função da qualidade do serviço que executam. A menção do “grande é quem serve” (cf. Mt 20,26) tem nesse evento sua confirmação. Anteriormente, Jesus já havia valorizado o lava-pés que uma mulher havia praticado nele, em causa do fariseu Simão (cf. Lc 7,36-48).

Hoje, vemos Jesus se humilhando ainda um pouco mais, numa atitude de escravo, lavando os pés dos discípulos. Amanhã, acompanharemos a entrega definitiva de sua vida no Calvário e morte de cruz. Lava-se os pés com as mãos. Elas simbolizam ação, dinamismo... Através das mãos recebemos, doamos e acariciamos.. São João afirma, no Evangelho, que Jesus é consciente de que o Pai entregou em suas mãos o verdadeiro amor e, antes de voltar ao Pai, precisa doar com suas próprias mãos este amor aos seus discípulos:

Jesus sabia que o Pai tinha colocado tudo em suas mãos. Sabia também que tinha saído de junto de Deus e que estava voltando para Deus. Então Jesus se levantou da mesa, tirou o manto, pegou uma toalha e amarrou-a na cintura. Colocou água na bacia e começou a lavar os pés dos discípulos, enxugando com a toalha que tinha na cintura (vv. 3-5).

Nessa última noite em que estava com os discípulos, Jesus tinha muito a dizer-lhes. Mesmo na iminência do desenlace, havia entre eles uma contenda, sobre qual deles parecia ser o maior. Essa rivalidade, manifestada na presença de Cristo, entristeceu e magoou o Mestre. Apegavam-se os discípulos a sua idéia favorita de que Cristo firmaria seu poder, e tomaria seu lugar no trono de Davi. No coração cada um continuava a anelar a posição mais elevada no reino humano. Embora se estimassem uns aos outros, em lugar de considerar seus irmãos mais dignos, eles colocavam a si mesmos em primeiro lugar.

A água que Jesus coloca na bacia, traz consigo um significado profundo de limpeza, serviço, amizade, generosidade, vida. Para um bebê, por exemplo, a água proporciona a alegria de um bom banho. A dona da casa, sabe a utilidade da água, para lavar as roupas, a louça, o chão. A pessoa que trabalha todo o dia, vem ávida por um reconfortante banho. Todos vêem, em suas vidas, o indiscutível valor da água. É pela água (do batismo, da benção, do perdão) que o cristão tira a sujeira (o pecado) para atingir seu maior objetivo (o Reino dos céus). O lavacro regenerador do batismo e do perdão, tem no lava-pés seu paradigma.

Se de um lado, água é vida, de outro, seca é morte. É a dialética que envolve o confronto entre a graça e o pecado. Se a graça traz alegria, dá sensação de limpeza e fartura, o pecado cria um estado de aridez, sede, tristeza e morte. É outra lição do uso que Jesus faz aqui do elemento água. A idéia da água, como sinal de vida, purificação e graça perpassa toda a Bíblia, desde o Antigo Testamento, como se verá a seguir. O uso religioso e purificador da água aparece por vez primeira na história de Jacó (cf. Gn 35,2) quando ele manda sua família lavar-se para tirar de si as impurezas dos ídolos.

No êxodo, a mesma água que salva o povo hebreu (graça), faz sucumbir seus inimigos egípcios (pecado). No Apocalipse, a água é símbolo do esplendor de Deus (cf. Ap 22, 1.17). Em seguida, a lavagem ritual é prescrita a Israel em preparação à vinda de Javé no Sinai (cf. Ex 19,10). Por toda a Bíblia a água é vista como um bem messiânico (cf. Is 11,3.9l 32,3.20l 41,18; 43,19). As metáforas bíblicas sobre o uso da água são freqüentes. Para espanto dos discípulos, Jesus assumiu esse papel humilde.

Em seguida, para aumentar o escândalo que deixou os discípulos boquiabertos (mas também para fixar bem o gesto que estava realizando) Jesus ordenou que seu exemplo fosse seguido por todos, como requisito de bem-aventurança (vs. 12-17) e sinal de comunhão com ele. A prática do lava-pés está emoldurada pelo amor, revela seu caminho e nos emboca em sua direção.

A partir de agora vamos acompanhar os gestos praticados por Jesus no lava-pés (vv. 4-11). Este conjunto de atos aconteceu em uma refeição, um jantar. Estar ao redor de uma mesa é sentar-se e partilhar as alegrias, as angústias, as emoções..., e também reunir-se para comer alguma coisa. O evangelista João nos conta que

Então Jesus se levantou da mesa, tirou o manto, pegou uma toalha e amarrou-a na cintura. Colocou água na bacia e começou a lavar os pés dos discípulos, enxugando com a toalha que tinha na cintura (vv. 4s).

Começam aqui a se desenvolver os diversos gestos temáticos de Jesus, cujo resumo é o amor que se converte em serviço, que induz à imitação, e é capaz de construir comunhão. Embora de conhecimento de todos, por temáticos e emblemáticos, vale recapitulá-los:

• Jesus levantou-se da mesa. Ele nos diz que é preciso sair do nosso egoísmo, mobilizar-se, ir ao encontro dos outros;

• Tirou o manto. Jesus se esvazia de si mesmo e coloca-se na condição de servo. Ele nos ensina sobre a necessidade de despojar-se de tudo o que divide, dos fechamentos, das barreiras, dos medos, das inseguranças, que nos bloqueiam na prática do bem;

• Pegou uma toalha e amarrou-a na cintura. Jesus põe o avental para servir. "Aquele que era de condição divina, humilhou-se a si mesmo" (Fl 2, 6-8). Ele nos propõe o uso do avental do servir na disponibilidade, e na generosidade, e ainda do comprometer-se com os mais necessitados e colocar-se em último lugar;

• Colocou água na bacia. Jesus usa instrumentos da cultura do povo: água e bacia. Repete um gesto que era feito pelos escravos ou pelas mulheres. Ele quer nos dizer que para anunciar sua proposta é preciso entender, conhecer, assumir o que o povo vive, sofre, sonha...

• E começou a lavar os pés dos discípulos. Para lavar os pés Jesus

se inclina, olha, percebe e acolhe a reação de cada discípulo. Com o lavar os pés, Jesus nos compromete a acolher os outros com alegria, sem discriminações, a escutar com paciência, a partilhar os nossos dons...

• Enxugando com a toalha que tinha na cintura. Jesus enxuga os pés calejados, rudes e descalços de seus discípulos. São muitos os gestos que Jesus nos convida a praticar para amenizar os calos das dores de tantos irmãos: visita a doentes e idosos, organizar-se para atender crianças de rua, uma palavra de ânimo a aidéticos, valorização de nossos irmãos negros e indígenas...

O ato de tirar o manto, não tipifica apenas um gesto prático, tirar para não se molhar ou evitar que se suje. Na verdade, ele aponta para uma atitude de abrir mão de todo privilégio ou posição. Despindo-se de sua dignidade de Mestre (ele seria despido na cruz), ele se dispõe a entregar-se para gerar vida nova. Jesus esvazia-se, kénosis, e se põe a executar um serviço que era atribuído a menores, socialmente falando. No Oriente Médio, o manto, colocado como um sobretudo, era um signo de poder, proteção, caracterizando o espírito da pessoa. O ato de tirar o manto (v. 3), prestar o serviço planejado, e depois recolocá-lo (v. 12) indica que Jesus se desprende de sua vida (e de sua autoridade) para depois assumi-la de novo:

O Pai me ama, porque eu dou a minha vida para retomá-la de novo (10,17).

É interessante observar – ao contrário de muitas ações nossas “caridosas”, do hoje e do sempre – que Jesus lava, ele mesmo, os pés dos amigos; ele não manda fazer. Pedro não entende o gesto de Jesus, como veremos adiante. Ele interpreta o lava-pés, no máximo, como um rito inserto nos atos de purificação dos judeus (v. 13). Jesus corrige (v. 10) essa distorção. Trata-se de uma alegoria que inflete na direção de uma obrigação concreta. Lavar os pés não é tão-somente tirar a sujeira dos pés, mas dedicar-se, de corpo e alma, àquilo que Jesus, no contexto do evangelho, preconizou àqueles que se dispusera(e)m a segui-lo.

O lava-pés revela a obrigatoriedade de estar a serviço do irmão, e não um mero rito simbólico. Cingir-se com a toalha, um tipo de avental usado para esse fim (v. 4), é a atitude do serviçal. Por não terem a exata noção do serviço que o cristianismo viera instaurar, Pedro e os demais ficaram escandalizados.

Na Palestina do Antigo Testamento, mulheres e crianças lavavam os pés de maridos e pais, demonstrando uma situação cultural de submissão e inferioridade. Jesus inverte os papéis e surpreende a todos. O mestre torna-se servo. A lição de serviço, humildade e amor é testemunhada, por Jesus. Ele não induz ao serviço (que é a espiritualidade transformada em ação) com meras palavras, mas confirma isto com a atitude. Depois de lavar os pés do grupo, Jesus retoma seu lugar na mesa, repõe a vestimenta e pergunta:

Vocês compreenderam o que acabei de fazer? (v. 12)

Aqui, Jesus quer ter a certeza de que os discípulos entenderam o gesto, não pelo conhecimento visual de um ato que presenciaram, mas se eles haviam compreendido o que ele havia acabado de realizar, isto é, se alcançaram a dimensão espiritual que ele havia impregnado naquela ação de lavar os pés de todos. A pergunta – ele que conhecia a limitação intelectual daquele grupo – não foi feita na esperança de uma resposta conclusiva, satisfatória, mas para encaminhar uma reflexão deles sobre a explicação da questão que ele colocaria em seguida:

Vocês dizem que eu sou o Mestre e o Senhor. E vocês têm razão; eu sou mesmo. Pois bem: eu, que sou o Mestre e o Senhor, lavei os seus pés; por isso vocês devem lavar os pés uns dos outros. Eu lhes dei um exemplo: vocês devem fazer a mesma coisa que eu fiz. Eu garanto a vocês: o servo não é maior do que o seu senhor, nem o mensageiro é maior do que aquele que o enviou. (vv. 13-16)

O lava-pés constitui-se, por assim dizer, um primeiro plano, o portal da narrativa da paixão. Trata-se de um gesto temático da práxis do Messias, por excelência. Aqui ele apresenta-se como Mestre (didáskalos) e Senhor (Kyrios), dando por aberta a revelação de sua divindade e senhorio, que seriam confirmados na ressurreição. Por esta razão, e por todos os seus fundamentos teológicos, trata-se de um forte sinal – embora não sobrenatural, ainda – da práxis da espiritualidade cristã que, como tal, não pode ser minimizado. Antes, precisa ser assimilado, imitado e entronizado na ação da Igreja.

Por sua realidade meta-histórica, o lava-pés vai além das aparências, para converter-se em uma narrativa simbólica, que facilita, de certo modo, a compreensão de Jesus, sua vida, sua missão e sua morte. Há, em todo o evento, narrado por São João, uma forte carga pedagógica, emocional, e sobretudo querigmática.

Chegou a vez de Simão Pedro. Este disse: “Senhor, tu vais lavar os meus pés?” Jesus respondeu: “Você agora não sabe o que estou fazendo. Ficará sabendo mais tarde”. Pedro disse: “Tu não vais lavar os meus pés nunca!” Jesus respondeu: “Se eu não os lavar, você não terá parte comigo” (vv. 6ss).

Para Pedro, o ato de Jesus querer lavar os pés de todos era um escândalo incompreensível. Como o Mestre poderia imaginar uma coisa daquelas? O próprio texto de João dá ênfase ao contraste com os versículos anteriores: aquele, em cujas mãos o Pai colocou o poder e a glória, querendo agora lavar os pés de um bando de pecadores. Um ato assim não seria bem compreendido hoje (um bispo lavando os pés de um fiel, ou um professor do aluno), imagine naquele tempo.

O diálogo de Jesus com Pedro (vv. 6-11), que é uma alocução insólita e reveladora ao mesmo tempo, enfeixa o tema central do fato, e por isto é extremamente revelador. Nele encontramos o cerne do serviço cristão prestado aos irmãos. De acordo com a opinião de alguns biblistas, os vv. 6-10 são um acréscimo para dar ao texto um enfoque sacramental: no caso, o batismo (Esta observação encontra-se no rodapé da Bíblia de Jerusalém). E por revelador, esta perícope se presta a várias leituras e meditações de exortação e edificação espiritual, bem como uma emulação à diaconia.

Quando Pedro quis impedir que Cristo lavasse seus pés, teve de reconhecer que esse gesto o afastaria do Mestre. Ao lavarmos os pés uns aos outros, reconhecemos que dependemos sempre de Jesus para a nossa salvação. Ele nos serviu primeiro e assim servimos a nosso semelhante e nos unimos a ele. Nesse particular, o lava-pés é um gesto de unidade.

Compreendendo mal o gesto do Mestre, Simão Pedro não permite, pelo menos num primeiro momento que lhe lavem os pés. Imagine, Jesus lavando pés, isso nunca! É indispensável analisar aqui a conduta de Pedro. Ela é tipicamente humana, racional, pragmática e sobretudo atual. É impossível à sua visão obtusa ver além do fato que lhe é dado observar: o Mestre, de joelhos, lavando os pés daqueles homens incultos e pecadores. Pedro não compreendeu – pelo menos no primeiro momento – que o amor produz o serviço, e que este é capaz de gerar a fraternidade.

A ele ainda não fora dada a faculdade de entender o sentido das coisas, inclusive a morte anunciada de Jesus. Essa iluminação só aconteceria na efusão de Pentecostes. E não sejamos rigorosos demais com nosso querido Pedrão. Até hoje, gente que fez catequese, que freqüentou igrejas, passou por encontros eclesiais, escutou homilias, pregações, palestras, fez cursos e exerce cargos hierárquicos, dentre esses ainda há, muitos, que não entendem a necessidade do serviço cristão. Muitos fecham-se à essa interpelação, enlevados pelos halos de uma pretensa “santidade”.

Dentro da mentalidade mundana, há uma estratificação social: senhor é senhor e escravo é escravo e – segundo os que assim preconizam – é Deus que quer assim. Muitos chegam a afirmar que a desigualdade é vontade de Deus e, como tal, legítima. E até necessária. Tal ponto-de-vista é encontrado por toda a história, inclusive abraçado hoje, por políticos, intelectuais, comunicadores, etc.

Ao bradar “Tu não vais lavar os meus pés nunca!”, Simão Pedro está colocando o assunto em termos de uma negação radical. Um ato desses jamais vai acontecer. Chocado pela inversão de papéis, ele reage de forma intempestiva. Pedro era muito autêntico. Ali não se tratava de uma falsa humildade, mas de um choque, pois ele nunca seria capaz de imaginar o Mestre se rebaixando daquele jeito.

A importância do significado do lava-pés está na mudança dessa mentalidade, revelando quem deve prestar o serviço. Dessa mudança vai depender ter parte com Jesus ou não... (v. 8). Jesus coloca os pingos nos ii, ao contestar a recusa de Pedro:

Se eu não o lavar, você não terá parte comigo (v. 8)

Fazer o que o Mestre manda e faz, é ter parte na herança (do Reino), na aliança (com o Pai), na missão (testemunhar o Filho) e na vida (da graça, abundante, eterna). Ser cristão – de fato – é aceitar a nova ordem que vem inserida neste sinal. Jesus manda que nos amemos como ele nos amou (cf. 13, 34), e esse amor pleno se torna o verdadeiro distintivo dos seguidores do Ressuscitado (cf. 13, 35). Nesse contexto, ter parte aponta para um semitismo que exprime uma união, unidade de pensamento, comunhão. Mesmo hoje em dia, a expressão denota um vínculo. Ao dizer não terás parte comigo, Jesus está dizendo a Pedro e a todos, que não podes fazer parte da minha turma, se não fizeres o que eu faço. Sem igualdade e serviço, espiritualidade e ação, não há cristianismo. Assim, não ter parte com Jesus é não estar em comunhão com ele. É não aceitar a obra da redenção, que é pura gratuidade. Ligado à formalidade, o apóstolo negou-se, pelo menos no primeiro momento, a conhecer a verdade espiritual: lavar é servir, o lava-pés era o protótipo do serviço do cristianismo que ora se instaurava.

Ao alertar se eu não te lavar os pés... Jesus faz alusão à santificação pela graça, onde, aquele que não aceita a oferta do amor de Deus, não pode ter acesso ao Reino. Há aqui um duelo entre o homem rebelde, de cabeça dura e coração obliterado pela pouca fé, e o Deus rico em misericórdia. Sem a atitude do serviço, amoroso e desinteressado, simbolizado prioritariamente pelo lava-pés (depois, a cruz seria o paradigma máximo da doação), ninguém conseguirá o progresso espiritual, e nunca poderá desfrutar integralmente do dom de Deus, que Jesus veio, gratuitamente, trazer (cf. 10,10).

A resposta de Jesus praticamente dá um xeque-mate em Pedro: ou perfila-se à exigência do serviço comunitário ou exclui-se da comunhão com o Mestre:

Se eu não o lavar, você não terá parte comigo (v. 8)

O que é ter parte com Jesus? É crer nele e fazer o que ele pede que seja feito. O discípulo ainda vê as coisas pelo lado do simples lavacro físico, com água, bacia e toalha. Pressionado pela emoção, sentindo a iminência de uma perda, Pedro entra em pânico:

Senhor, então podes lavar não só os meus pés, mas até as mãos e a cabeça (v. 9).

A reação apaixonada de Pedro funciona como que um ato de defesa. Para ele, um homem livre lavar os pés de outro, é um escândalo; mais que isto: uma humilhação. Ele não admite um rei lavando os pés de alguém, por que entendeu a extensão da realeza de Jesus. O apóstolo sente-se desconfortável (e desconsertado) ante o gesto inesperado de Jesus. É a típica reação de quem desconhece a humildade cristã (e o serviço que dela dimana) em favor dos outros. Até hoje se constata –infelizmente – a existência de pessoas que, para não se humilharem, fogem do serviço ao próximo. Primeiro ele rejeita a idéia e agora deseja um banho total.

Ao pedir que Jesus lave não só os pés, mas também as mãos e a cabeça (v.), Pedro proclama sua adesão pessoal a Jesus, mesmo sem entender o modo de agir do Mestre. É aquele tipo de fé que aceita sem exigir comprovações. Mesmo assim, dispõe-se a obedecer sem colocar em prática. Pedro imagina que o lavabo de Jesus tem poderes purificatórios. Ele ainda não havia penetrado no “espírito da coisa”. O grande serviço de Jesus pela humanidade é a sua morte na cruz. Por um parente muito chegado, por um amigo, pode ser que alguém se disponha a dar a sua vida. Quem é capaz de imolar-se em favor de estranhos, alguém que é capaz de trair, indigno de um sacrifício desse jaez?

O ato de lavar os pés dos visitantes era muito usado na Palestina, no tempo de Jesus e até mesmo antes do seu nascimento. Era um trabalho humilde, feito por escravos, que consistia em lavar os pés dos patrões da casa e daqueles que chegavam de viagem. Em Roma, esse trabalho era considerado humilhante a ponto de ser designado como castigo a algumas pessoas que cometiam delitos legais. Diante daquelas circunstâncias dramáticas, e para dissipar o medo de Pedro, Jesus afirma:

Quem já tomou banho, só precisa lavar os pés, porque está todo limpo. Vocês também estão limpos, mas nem todos. Jesus sabia quem o iria trair; por isso é que ele falou: Nem todos vocês estão limpos (vv. 10s)

O banho aludido por Jesus, não é um banho convencional, como se conhece hoje, nem se trata, como quiseram alguns no passado, das purificações rituais dos judeus, mas daquele batismo primevo, que contempla os bem-aventurados que têm um coração puro. O cristão que já tomou banho, é aquele que foi batizado, converteu-se e perseverou no caminho de Jesus.

Em uma meditação que fala no amor de Deus, no testemunho amoroso e serviçal de Jesus, fica desagradável falar-se em pecado, diabo, traição e morte. Embora estas sombras, na síntese, não ofusquem a luz verdadeira, é preciso falar nelas, pois fazem parte do enredo. Mesmo em um ambiente de espiritualidade e convívio fraterno, as pessoas não estão imunes às tentações. A vigilância contra esse assédio precisa ser constante:

Durante a ceia, o diabo já tinha posto no coração de Judas Iscariotes, filho de Simão, o projeto de trair Jesus. (v. 2).

Naquele evento, o diabo instrumentaliza Judas Iscariotes, para que, atraído por uma recompensa pecuniária, entregue Jesus a seus inimigos. O demônio tomou conta dele, seduziu-o pela ganância de ter mais (trinta moedas), dispondo-o a trair Jesus.

Para o evangelista, não se trata de uma mera traição humana, movida por interesses mesquinhos, mas algo mais profundo, complexo e sinistro: é o diabo que a inspira. Ele age como um filho das sombras, atuando contra a Luz, como um legítimo fautor da mentira contra a Verdade.

Ao referir-se ao mau comportamento de Judas, instrumentalizado pelo diabo, o evangelista pinta a cena com cores sombrias (cf. 13,2). O inimigo ataca, usando como agente um dos convidados. Quem será o mais forte? o traidor (pecado e morte) ou Jesus (amor e vida)? O mal é capaz de produzir um “oráculo de pecado” no coração perverso do traidor (cf. Sl 36,2). Jesus sabia do efeito danoso da traição, por isso alertou:

Jesus falou: “Quem já tomou banho, só precisa lavar os pés, porque está todo limpo. Vocês também estão limpos, mas nem todos”. Jesus sabia quem o iria trair; por isso é que ele falou: “Nem todos vocês estão limpos”. (vv. 10s).

Com isto, o mestre está querendo afirmar que, naquele episódio e pela vida afora, os homens estão limpos, mas não todos. É aí que a porca torce o rabo! Será possível alguém, que está na Igreja, não estar limpo? É imperioso dizer que em todos os grupos humanos, sociais, profissionais e religiosos há pessoas de todo jeito: há Pedro e há Judas, fiéis e infiéis, sinceros e falsos, autênticos e interesseiros, convertidos e indiferentes... Até hoje, vemos pessoas se escondendo atrás de máscaras, aparências, na busca de outros interesses, que não o serviço ao outro, que não a glória de Deus e a salvação. Há, pela graça de Deus, os limpos por causa da Palavra colocada em prática, os limpos pela adesão, pela disponibilidade à missão; limpos por causa do coração puro. É isto que torna a atitude do homem agradável aos olhos de Deus, dispondo-o à obra do Reino. Jesus fala, mais de uma vez, nos bem-aventurados “de coração puro” (cf. Mt 5,8; Lc 6,5; Jo 14,1).

Vocês já estão limpos por causa da Palavra que eu lhes falei... (15,3).

A Palavra havia feito sentir seus efeitos em todo o grupo apostólico, exceto no traidor. Na verdade, Judas vive. Ele é hoje representado pelo egoísta, o indiferente, aquele que não lava os pés, não deixa lavar, critica, não serve, aliena-se, trai e não volta atrás... Sem fé, não confia na misericórdia e no perdão, e acaba enforcado na ponta de uma corda.

Observando os evangelhos, vemos que todos os gestos de Jesus têm sua pedagogia, aplicável em nossa vida humana, física, assim como nos aspectos sobrenaturais de nossa existência. Na verdade, se pode notar no episódio aqui observado, que Jesus quer ensinar que exercer poder implica em servir, e não em tiranizar, afinal – ensina o Mestre – todos são iguais. Como foi enfatizado aqui, não se pode enxergar o lava-pés levado a efeito por Jesus, naquela distante quinta-feira, apenas como um gesto, curioso, histórico ou temático . É preciso ir mais fundo. É precisamente nesse sentido que o Senhor deu a todos um novo sinal, que seria o grande distintivo dos cristãos: o amor (cf. 13,35). Ao dizer

...dei-lhes o exemplo... façam o mesmo... (v. 15)

ele está ensinando que o que governa, aquele que manda, o líder do grupo, deve estar a serviço dos demais (cf. Lc 22, 24-30). Aquele que diz que permanece com ele, deve também andar como ele andou (cf. 1Jo 2,6; 1Tm 5,10). O grande exemplo do serviço prestado por Jesus à humanidade foi o ato de dar sua vida, para que tivéssemos vida (cf. Jo 3,16; 10,10). A espiritualidade do lava-pés é toda ela perpassada por amor e atitude. Jesus nos ama, e transforma esse amor numa atitude em nosso favor.

Jesus também ensinou um princípio teológico no lava-pés: que quem já se banhou, ou seja, quem já foi batizado, ao sujar-se, isto é, ao cometer um pecado, não precisa ser outra vez batizado, mas deve limpar a parte da sujeira do novo pecado. Essa é a lição vital do lava-pés, um ajudar o outro a se manterem limpos, a exortação mútua, mas com humildade, com amor no coração, não com arrogância e autoritarismo. Evidentemente essa lição não foi válida para aqueles principais sacerdotes que sabiam o mal que faziam, e não buscavam conversão. A eles Jesus deu outra lição, expulsando-os do templo, tendo antes os chamado de túmulos caiados.

Por causa do serviço de Jesus, representado pelo sacrifício na cruz – do qual o lava-pés é sinal – ficou assegurada à humanidade a maravilha da glória, a ressurreição, evento em que Jesus revelou-se o primeiro vivente (cf. Ap 1,18), tornando o homem verdadeiramente imortal. Esse trinômio morte/ressurreição/imortalidade funciona como que um “certificado de garantia” da veracidade das promessas do Senhor. Ele indica que aqueles que crêem em Jesus haverão de participar daquela “vida plena” anteriormente aludida (cf. Jo 10,10), que ele “comprou” para nós, ao preço de seu generoso sangue (cf. 1Cor 6,20).

A ligação do gesto com a espiritualidade revela que o lava-pés não é um rito de purificação, mas possui uma cristalina profundidade simbólica. Quem dele não participa deixa de compartilhar dos valores de Jesus, tornando-se cúmplice de uma sociedade injusta, fomentador de uma atividade perversa e egoísta. Esse não está limpo e, por conseqüência, não tem parte com Jesus.

Ao lavar os pés dos discípulos, Cristo ordenou que seguíssemos seu exemplo, lavando os pés dos nossos irmãos. É a espiritualidade transformada em ação. Nós o seguimos no batismo e na celebração da Eucaristia. A obrigação de lavar os pés dos nossos irmãos precisa ser encarada como um mandamento do Senhor. Finalmente, Jesus Cristo declara bem-aventurados todos aqueles que participam do lava-pés, isto é, quem escuta a Palavra e a coloca em prática. O lava-pés traduz toda a vida e a missão de Jesus: o amor.

Ele, que tinha amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim (v. 1b)

Nós, em geral, não somos muito afeitos ao serviço, à renúncia, à humildade. Gostamos mais de ser servidos do que servir. Preferimos mais a parte dóxa (a glória) do que a kenóssis (o despojamento). Esse ato de abandonar-se, no clássico despojamento de um “servo sofredor” (cf. Is 42; 52,13–53,12) tem no lava-pés um pórtico emblemático e revelador. Só um Deus que se abaixa para lavar os pés dos seus amigos, tem capacidade de dar a sua vida por eles (cf. 10,11);

Não existe maior amor do que dar a vida pelos amigos (15,13).

Querem um exemplo da superveniência da glória sobre o despojamento? Há questão de uns dez anos atrás me pediram que organizasse, numa comunidade de periferia, uma “gincana bíblica”, no mês de setembro. Foi um certame bonito, diversos grupos, de adultos e jovens, pessoas da pastoral, ministros e movimentos leigos participaram. Uma das tarefas pedia que trouxessem “os objetos que Jesus usou na ‘última ceia’”. Todos trouxeram cálice, pão e vinho. No entanto, ninguém se lembrou de trazer o jarro, a bacia e a toalha, que deveriam igualmente fazer a composição daquele acervo. Isso evidencia que somos mais afeitos à glória que ao aniquilamento. Lembraram a Eucaristia-comunhão e esqueceram o lava-pés, igualmente comunhão.

Na dimensão escatológica, o lava-pés é em si uma ação mistagógica (referente a mistério) que revela a extensão purificadora da morte de Jesus. Imitar o gesto é aderir à espiritualidade dele decorrente, participando da morte e da ressurreição do Filho de Deus. Mas Jesus faz uma ressalva:

vocês estão limpos, mas não todos... (v. 10b).

Como foi dito, Judas, pela ambição, dureza de coração e falta de fé, ficou excluído dos benefícios da salvação que Jesus veio instaurar. Assim ocorre hoje, com quem, seduzido pelos apelos do mundo, vira as costas à salvação que Deus manda, gratuitamente, pelo Filho (cf. Jo 3,16). Na essência do estar limpos aparece o fato de os discípulos terem aceito a missão e tomado Jesus como O caminho (cf. Jo 15,3;13,10). A ação do Messias expressa um amor levado às últimas conseqüências. Nessa visão, o lava-pés encerra o “mandamento novo” (cf. Jo 13,34) que é a mensagem que purifica o cristão (cf. 15,3).

Precisamos ver na gratuidade de Deus, a essência do que se chama de “teologia da graça”. Deus vem ao nosso encontro, e “de graça” nos dá sua amizade, sua paternidade e a ação redentora do Filho. A herança do Reino e a pertença à Igreja ocorrem como verdadeiro dom, vindo do Pai que nos amou desde o princípio. Por mais que a gente diga que ama a Deus, é imperioso saber que “ele nos amou primeiro” (cf. 1Jo 4,19).

Jesus termina o lava-pés disposto a ensinar aos que assistiram à cena a necessidade de passar da teoria à prática. É um fato usual, nos dias de hoje, a existência de teóricos. Como tem gente que dispõe de explicações teóricas para tudo! Eles têm roteiros e soluções para endireitar o mundo, mas, em muitos casos, não sabem ordenar suas vidas. As palavras do rabi da Galiléia não deixam margem para teorias, outras interpretações ou acomodações:

Eu lhes dei um exemplo: vocês devem fazer a mesma coisa que eu fiz (v.15)

Aqui, o ato de dar o exemplo, funciona mais como um dom de Deus do que um mero modelo, exterior, humano a ser seguido. Se Jesus é feliz junto ao Pai, o cristão será feliz junto dele, se fizer o que ele manda. Nesta conformidade, a coroação da felicidade humana está inserida no “mandamento novo”: só quem ama pode ser feliz! É mais ou menos fácil compreender; difícil é transformar essa compreensão em atitudes. Trata-se de desfrutar de uma autêntica bem-aventurança.

Em primeiro lugar, para praticar a Palavra, é preciso saber intuir que o amor vem de Deus, e sentir este amor pleno, que nos é doado através das mãos de Jesus. Mãos que lavam, acariciam e enxugam, com ternura, os pés de cada um dos discípulos, de cada um de nós... Em segundo lugar, a ação de Jesus quer ensinar aos discípulos, e também a nós, que é preciso imitá-lo, fazer o mesmo:

Depois de lavar os pés dos discípulos, Jesus vestiu o manto, sentou-se de novo e perguntou: “Vocês compreenderam o que acabei de fazer? Vocês dizem que eu sou o Mestre e o Senhor. E vocês têm razão; eu sou mesmo. Pois bem: eu, que sou o Mestre e o Senhor, lavei os seus pés; por isso vocês devem lavar os pés uns dos outros. Eu lhes dei um exemplo: vocês devem fazer a mesma coisa que eu fiz (vv.12-15).

Jesus usou, como “moral da história” (v. 17), três verbos: compreender, praticar e ser feliz, que constituem três eixos de evangelização Vamos tentar aqui, academicamente, atualizar o sentido de cada um deles para nossa vida de cristãos:

• compreender

nossa fé precisa – iluminada pelo Espírito Santo – ser clara, consciente, objetiva; as coisas de Deus só são compreendidas com o coração;

• praticar

colocar-se a serviço deve ser uma constante; o lava-pés não pode ser um rito externo só praticado na Quinta-feira Santa; é preciso que, a exemplo de Jesus, o cristão se desinstale, deixando o Tabor, na direção de onde está a missão;

• ser feliz

a felicidade é uma conseqüência transcendente do serviço cristão; compreender e praticar o ensinamento de Jesus, invariavelmente nos torna felizes; a fruição da vida da graça atua como uma autêntica “bem-aventurança” (v. 17).

Infelizmente, esse “compreenderam?”, a despeito de tantas respostas bem-intencionadas, é parcial até hoje. Essa compreensão ainda é limitada a muitos fatores, os mesmos que impedem uma adesão total e irrestrita a Cristo e ao apostolado. Muitos emocionam-se com leituras de textos sagrados, com liturgias e outras atividades (às vezes algumas delas projetadas para causar impacto), mas têm dificuldade em transpor as barreiras do comodismo, do egoísmo, da indiferença (e porque não dizer de uma fé incipiente) e não põem em prática o ensinamento que subjaz do relato do lava-pés.

Entender e praticar é transformar a espiritualidade em ação. Se não experimentamos essa mudança em nossa vida, vamos engrossar o rol dos teóricos, dos que fazem tudo pela “experiência”, que têm uma devoção especial para qualquer circunstância, mas nunca vamos deixar a estagnação que leva ao esvaziamento e à aridez da fé. Quem faz o que Jesus preconiza é bem-aventurado, feliz ( v. 7; cf. Tg 1,25).

Nesse aspecto, o lava-pés torna-se o paradigma, o modelo, o exemplo do cristianismo: compreender e colocar em prática. Compreender algo é ter acesso a alguma coisa pelas faculdades intelectuais. É mais fácil. Compreender com base na fé, já é mais difícil. De outro lado, colocar em prática, é espiritualizar, sob a égide da fé, a compreensão, transformando-a em ação. Isto, convenhamos, é bem mais difícil e laborioso. Aí o lava-pés transforma-se em “mandamento” (vv. 12-15).

No v. 17, vimos, há uma bem-aventurança para quem entende e coloca em prática aquilo que é a essência do ser-cristão: o amor. O evangelho nos revela que a verdadeira felicidade está em conhecer a Deus, pelo Filho e o Espírito Santo, ser-lhe obediente, fazendo aquilo que ele mandou. Conhecer (espiritualidade) e praticar (ação), são os meios pelos quais o homem pode chegar ao estado de bem-aventurança.

Celebrando a ceia com os seus amigos Jesus inaugura a nova páscoa, isto é, dá um novo sentido para a “Páscoa” que, em seu contexto histórico, era a maior festa do ano para os judeus. Mantendo seu ritual como no Antigo Testamento (cf. Ex 12), Israel celebrava a Páscoa para fazer memória da “antiga libertação do Egito” e atualizar “os benefícios de Deus” para com os seus filhos. Jesus como que aplica um “recheio” de amor e misericórdia atualizada no bojo da páscoa histórica dos judeus.

Em sua práxis, Jesus não coloca limites para o amor. O gesto que realiza no lava-pés é carregado de um simbolismo e de um ensinamento profundos para nós, cristãos, que queremos seguir as pegadas do Senhor, no caminho para o Pai. O sofrimento de Cristo deve provocar em nós, portanto, não apenas um sentimento de dó, de com-paixão, mas deve despertar-nos para uma vida de verdadeiro serviço aos nossos irmãos, amando-os como Jesus nos amou.

No entanto, porque somos humanos, fracos e sujeitos a humores, às vezes assalta-nos a tentação de desistir, desistir das pessoas que amamos, desistir de orar pelos que sofrem, dos doentes, dos familiares que “nunca irão se converter”, desistir do apostolado.... Mas a esperança não pode nos abandonar, pois não trabalhamos em nosso nome, mas em nome da fraternidade, que é obra do Senhor! Sobre isto, São Paulo advertiu as comunidades, cansadas da virtude e do apostolado:

Saibam que o trabalho de vocês no Senhor não é em vão (1Cor 15, 58b)

O miolo da narrativa do lava-pés, o sitz im leben, para usar uma expressão dos teólogos alemães, como o ponto onde foi maturado o texto, está no serviço e na humildade com que Jesus nos amou e deu sua vida por nós. Ele que podia invocar todas as prerrogativas de Filho de Deus, rebaixou-se, lavando os pés de seus amigos, num gesto-sinal de serviço. Este é o requisito fundamental do cristianismo. Parece simples, mas não é. Vê-se mais pessoas querendo ser servidas do que se manifestarem dispostas a prestar um serviço, acolher e repartir. Jesus encerra o episódio, dando a todos, pelos tempos afora, a pista da verdadeira felicidade:

Se vocês compreenderem isto e o praticarem, serão felizes (v. 17).

De fato, não basta conhecer a doutrina cristã, mas importa colocá-la em prática. O apóstolo Tiago ensina que não devemos ser meros ouvintes da Palavra de Deus, mas praticantes (cf. Tg 1, 22-25). Ouvir a Palavra e não colocá-la em prática, é como erguer um edifício sobre um lençol de areia. A ruína é iminente. A fidelidade do discípulo que não pratica o que o Mestre ensina, é ilusória. Quando não, hipócrita. Sem dúvida alguma, o lava-pés nos traz várias lições, de serviço, de entrega e de humildade. Talvez por isso que os biblistas o chamem de “ato de fundação da Igreja sob o signo do serviço”.

A realização do lava-pés, tipo do serviço fraterno, estabelece uma “comunicação” entre o que lava e quem é lavado. Esse liame traz consigo vários significados, como aceitação, hospitalidade, acolhida, despojamento, compromisso, etc. Nessa conformidade, amor, serviço e compromisso tornam-se juízos indissociáveis.

Jesus se dá por todos, mas nem todos o acolhem como verdadeiro dom. Alguns, é sabido, não o receberam (cf. 1, 11). Só os que se abriram ao assédio libertador da graça receberam o poder de serem chamados de filhos de Deus (cf. 1, 12) e de serem efetivamente convertidos em morada de Deus:

Se alguém me ama guarda a minha palavra, e meu Pai o amará. Eu e meu Pai viremos e faremos nele a nossa morada (14, 23).

O grande pólo de atualização do lava-pés é o exemplo de serviço e de humildade. Ser cristão é praticar as ações que Cristo faria. O agir cristão se reveste de doação e serviço, este último com os atributos humilde, prestativo, eficaz e perene. Jesus ensina que o exercício do poder e da autoridade implica sempre em um serviço. O dom de Deus não nos é im-posto, mas pro-posto.

Pois bem: eu, que sou o Mestre e o Senhor, lavei os seus pés; por isso vocês devem lavar os pés uns dos outros. Eu lhes dei um exemplo: vocês devem fazer a mesma coisa que eu fiz. Eu garanto a vocês: o servo não é maior do que o seu senhor, nem o mensageiro é maior do que aquele que o enviou. Se vocês compreenderam isso, serão felizes se o puserem em prática (vv. 14-17).

O gesto do lava-pés é a concretização do amor-serviço. Tudo isso nos ensina que só há sentido em se celebrar a Eucaristia quando se procura viver o amor fraterno, quando se vive a mensagem do lava-pés. Nessa atitude, Jesus apresenta o Pai, como o amor que liberta e salva o homem. O gesto do Mestre é simbólico mas tem um sentido bem claro dentro do contexto da revelação de Deus por Jesus. A síntese do texto bíblico é seu primeiro versículo:

Ele, que tinha amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim (v. 1b).

Jesus amou (e continua amando) seus amigos, não apenas com palavras ou meras afetividades circunstanciais. Ele amou e se entregou por todos. Nessa associação podemos observar o amor e a atitude, o gesto, o princípio ativo que moveu o Mestre e deve iluminar todo o cristão.

Finalizando, é bom recordar que a expressão “amou-os até o fim” já vista, dá uma idéia de coisa acabada, completa, e quer dizer “até a consumação”. Tanto assim que na cruz, Jesus disse “está consumado” como que a afirmar que sua obra estava completa! (19, 30). A humanidade e Deus estão reconciliados, pela entrega e pelo amor. Qual é a “obra de Deus”? Que toda a humanidade acredite naquele que ele enviou (cf. Jo 6,29). O lava-pés trata do epílogo da vida de um Deus que se fez homem. É a vitória da luz sobre as trevas, da vida sobre a morte. É a vitória do amor total.

Um grande abraço e votos de uma Páscoa cheia de amor.