Adultos Paulistanos

Eu tenho andado bem, sabe? Tenho uma família feliz, sou realizada profissionalmente, já visitei lugares que eu mais queria visitar e já passei também em lugares que jamais pensei chegar. Tenho filhos maravilhosos, uma menina e um menino, nós fazemos piquenique aos domingos e eu os ajudo com a lição de casa. Eles são lindos e inteligentes, são as melhores coisas que aconteceram na minha vida.

Eu estou feliz... Não choro mais e, se choro , é de alegria. Vejo meus pais regularmente, às vezes no fim de semana. E eles estão bem, muito bem. Compraram um sítio ano passado e têm uma vida bem sossegada. Reencontrei nossos amigos e perguntaram sobre você e nós, respondi um pouco monótona que seguimos rumos diferentes e perdemos contato.

Tenho muitas tarefas, mas sempre consigo um espaço de tempo pra cuidar de mim. Pra ler bons livros, ir ao salão de beleza, assistir romances comendo chocolate com morango, te pra cochilar nas tardes chuvosas ou ir à praia nas férias de verão. Meu marido é maravilhoso, com ele eu divido segredos, medos e até dívidas. Discutimos raramente e, sempre que discutimos, é construtivo pra nós dois.

Eu ando tão bem nesses últimos seis anos que às vezes até me esqueço. E, me esquecendo, esqueço dos problemas que tenho que encarar. Não pense que sou irresponsável, problemas fazem parte da vida e temos que enfrentá-los, mas há momentos em que devemos simplesmente esquecê-los.

Não deixei de ser aquela adolescente/criança. Ela continua comigo todos os dias, se revelando em alguns detalhes como me lambuzar de sorvete e dançar na chuva, cantar musicas infantis e ler histórias em quadrinhos, dançar limpando a casa e ter crises de riso... Serei a eterna adolescente, a eterna romântica e a eterna insana que conhecera, só que com algumas rugas que insistem em aparecer com o tempo.

Eu ando tão bem, tão maravilhosamente bem. Mas quando o vejo andando nas ruas movimentadas de São Paulo – com seu olhar vago, seus passos rápidos e toda sua capacidade de arrancar sorrisos, até mesmo sério – dá vontade de te agarrar e voltar no tempo, nos dias em que éramos amigos.

Você se lembra? Do tempo que riamos de tudo e tínhamos segredos? Você se lembra da nossa ironia estampada nos olhos? Aliás, você se lembra das nossas trocas de olhares, quando víamos algo engraçado na sala de aula? Lembra-se de quando conversávamos até o amanhecer? E das conversas sem sentido, mas com muito significado pra nós, você se lembra disso? Se lembra? Dos nossos abraços apertados e apelidos bobos? E das nossas brigas? Aquelas engraçadas que, após dois minutos, estávamos pedindo desculpas um pro outro. Você se lembra de tudo isso?

Eu ando tão bem... Mas ficaria melhor se passasse mais tempo com você. Podíamos tomar um café e falar do tempo “essa chuva fininha não para de cair” ou “está um calor insuportável”. Assim, como bons adultos paulistanos...

Ana Eduarda
Enviado por Ana Eduarda em 14/10/2013
Reeditado em 14/10/2013
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