Carta sobre a copaíba
Belém, 06 de agosto de 2012.
Caríssimos Heraldo e Pollyanna,
Belém, 06 de agosto de 2012.
Caríssimos Heraldo e Pollyanna,
O mundo de hoje é meio sem graça, sem mitos, muito racionalismo, com pouca magia e lirismo. Eu, como engenheiro florestal não podia ficar de fora deste perfil, focado nos resultados e métodos visíveis, concretos e numéricos. Mas foi a árvore de copaíba que ajudou a quebrar a casca dura do só-vendo-pra-crer, deixando mais leve o profissional que hoje sou.
Em curso realizado nos quilombolas de Gurupá para extração de óleo de copaíba, fiquei assombrado com o barulho feito por uma copaibeira quando acertamos a veia dela na procura por óleo. Foi como se um ralo estivesse a sugar uma pia cheia. Falaram isso pra mim antes, mas achei lenda. Assim como dizem que não é pra olhar pra cima na hora de furar a árvore com o trado, pois a bicha fica com vergonha e trava o óleo. Do mesmo modo que indicam que mulher “naqueles dias” não pode acompanhar a tirada do fluido, pois também esconde a produção. Dos casos que vi, só testemunhei a primeira, do ruído dentro do tronco e fiquei maravilhado.
Naquele dia de curso a dita árvore fornecera 5 litros de óleo, que vendidos naquela época (2005, ano do curso) a R$30,00, daria ao quilombola R$150,00, uma boa diária para quem só tem o trabalho de furar, deixar o carote e mangueira fazerem o serviço, enquanto a pessoa faz outras atividades como caça ou pesca.
Em 2012, volto-me com a extração de óleo de copaíba. Desta vez, seu Pacatuba, um sábio daqueles que a gente esbarra na vida, formado na Universidade da Experiência e da Prudência, me diz que no centro de treinamento do IFT uma árvore que ele usa nos cursos que palestra já lhe dera 60 litros, com litro atualmente vendido facilmente no mercado a R$50,00, ou seja, uma receita de R$3.000,00 em uma só árvore! Isso sem falar dos animais que chama para perto de si na época da frutificação como a cutia e o porco-do-mato, a fornecer a carne necessária para os dias de luta pela comida.
Outro dia comprei um vidrinho com 30 ml de óleo de copaíba na farmácia, vendida a R$4,00. Processado e embalado, portanto, seu valor é entorno de R$130,00 o litro. E pelo efeito na gripe da gente, vale a pena.
O que acho que não vale a pena é derrubar copaibeira pra tirar madeira. Pagando o mercado madeireiro cerca de R$156,00 o metro cúbico em tora desta espécie, pense em uma árvore que tenha seus 4 metros cúbicos. São 624 reais que se consegue uma só vez, sem mais óleo e com um atrativo a menos para a fauna. Interfere-se em um potencial medicinal, na cultura de uma comunidade e no andar dos bichos. Mesmo a dita copaibeira que vi em 2005 com seus 15 litros ganhariam hoje em valor monetário sobre sua derruba, na mais pura linguagem capitalista seca.
Por tudo isso, não penso ser correto para o amazônida do futuro que hoje se derrubem árvores de copaíba.
Não deveriam constar nos editais de concessão florestal.
Não deveriam constar nos planos de manejo florestais madeireiros aprovados, principalmente naqueles ditos de POA único (onde só há uma exploração e pronto, uma praga).
Deveria ser condicionante em certificações florestais a ausência da copaíba nos planos operacionais anuais de exploração de madeira.
Caminhemos, pois, para a valorização cada vez mais da floresta em pé.
Aos mestres, escrevi.
Pantoja Ramos
(nota do autor: recebi crítica e fiz autocrítica de que preciso relatar as coisas que faço e penso sobre o Marajó. Envio assim cartas aos amigos que fazem a diferença, a melhor forma para me sentir mais confortável para escrever).
Em curso realizado nos quilombolas de Gurupá para extração de óleo de copaíba, fiquei assombrado com o barulho feito por uma copaibeira quando acertamos a veia dela na procura por óleo. Foi como se um ralo estivesse a sugar uma pia cheia. Falaram isso pra mim antes, mas achei lenda. Assim como dizem que não é pra olhar pra cima na hora de furar a árvore com o trado, pois a bicha fica com vergonha e trava o óleo. Do mesmo modo que indicam que mulher “naqueles dias” não pode acompanhar a tirada do fluido, pois também esconde a produção. Dos casos que vi, só testemunhei a primeira, do ruído dentro do tronco e fiquei maravilhado.
Naquele dia de curso a dita árvore fornecera 5 litros de óleo, que vendidos naquela época (2005, ano do curso) a R$30,00, daria ao quilombola R$150,00, uma boa diária para quem só tem o trabalho de furar, deixar o carote e mangueira fazerem o serviço, enquanto a pessoa faz outras atividades como caça ou pesca.
Em 2012, volto-me com a extração de óleo de copaíba. Desta vez, seu Pacatuba, um sábio daqueles que a gente esbarra na vida, formado na Universidade da Experiência e da Prudência, me diz que no centro de treinamento do IFT uma árvore que ele usa nos cursos que palestra já lhe dera 60 litros, com litro atualmente vendido facilmente no mercado a R$50,00, ou seja, uma receita de R$3.000,00 em uma só árvore! Isso sem falar dos animais que chama para perto de si na época da frutificação como a cutia e o porco-do-mato, a fornecer a carne necessária para os dias de luta pela comida.
Outro dia comprei um vidrinho com 30 ml de óleo de copaíba na farmácia, vendida a R$4,00. Processado e embalado, portanto, seu valor é entorno de R$130,00 o litro. E pelo efeito na gripe da gente, vale a pena.
O que acho que não vale a pena é derrubar copaibeira pra tirar madeira. Pagando o mercado madeireiro cerca de R$156,00 o metro cúbico em tora desta espécie, pense em uma árvore que tenha seus 4 metros cúbicos. São 624 reais que se consegue uma só vez, sem mais óleo e com um atrativo a menos para a fauna. Interfere-se em um potencial medicinal, na cultura de uma comunidade e no andar dos bichos. Mesmo a dita copaibeira que vi em 2005 com seus 15 litros ganhariam hoje em valor monetário sobre sua derruba, na mais pura linguagem capitalista seca.
Por tudo isso, não penso ser correto para o amazônida do futuro que hoje se derrubem árvores de copaíba.
Não deveriam constar nos editais de concessão florestal.
Não deveriam constar nos planos de manejo florestais madeireiros aprovados, principalmente naqueles ditos de POA único (onde só há uma exploração e pronto, uma praga).
Deveria ser condicionante em certificações florestais a ausência da copaíba nos planos operacionais anuais de exploração de madeira.
Caminhemos, pois, para a valorização cada vez mais da floresta em pé.
Aos mestres, escrevi.
Pantoja Ramos
(nota do autor: recebi crítica e fiz autocrítica de que preciso relatar as coisas que faço e penso sobre o Marajó. Envio assim cartas aos amigos que fazem a diferença, a melhor forma para me sentir mais confortável para escrever).