Para nós

Saio na rua e sei que não devo estar nela; não sou da rua e nem ela é minha; não há atração entre nós.

Olho para o céu como se lá existisse um mapa, logo me canso do nada que encontro.
Volto para mim, o único lugar que me acomoda mesmo incomodando exacerbadamente.
Sei que fui uma desculpa muito cômoda, a saída que estava mais próxima da sua cela calculadíssima, aquela passagem que possuía credibilidade para os cegos; que não podiam enxergar que a porta sempre esteve aberta.
Não há mais salvação possível para um de nós; não nos condenaram a coisa alguma; andamos para a perdição espontaneamente como se fosse um passeio.
Acreditávamos que poderíamos acreditar que estávamos enganados; não conseguimos enganar nem a nós mesmos; seria para chorar se não ríssemos como hienas.
Sabe o que é? Estamos acabando, apenas acabando.
Não adianta mais lamentar por escolhas e nem imposições; o difícil é assumir que aceitamos e nos corrompemos quando correspondemos às expectativas, e atendemos a todas, todas mesmo!
Não nos restou um papel de vítima... Ainda que pudéssemos nos colocar nele, somos péssimos quando tentamos nos adequar; sobramos por todos os lados.
Gostava quando sabia apenas da criação, admirava a obra e me encantava, mas fui querer conhecer o criador; é tudo que lamento com louvor.
A verdade é que não cabemos mais em lugar algum, porque fomos a todos e nos ferimos até este ponto, até o momento de não cabermos mais nem em nós mesmos. Somos tão amadores que nem conseguimos ser outras personagens; assim podemos constatar nossa obscena credibilidade.
Você chora e eu queimo em febre, o que poderia ser uma união perfeita, mas nunca foi e nem será; suas lágrimas são etílicas e minha temperatura evapora rápida demais.
Estamos indo aos poucos, aos pedaços e nada nos espera; sabemos muito bem que é assim. Nunca coubemos nem aqui, então não dá para nos enganarmos mais a espera de um céu e nem de um inferno; não estamos à altura de nenhuma ilusão e nem queremos o que já vivemos e revivemos.
Só você pode se consolar e eu a mim, mas sabemos que não temos a tolerância necessária para tanto; sabemos que teria que ser demais.
Sua dor ecoa voltando para você; a minha preferi calar, porque posso estar enganada, mas tenho a impressão que sua dor é duplicada e se divide em duas partes; o mesmo engano do tal giro de 360ª do qual já ri muito e sabemos.
Você foi amado incondicionalmente e se não viu, foi porque não quis. Eu fui invadida e quando vi, não quis; exercemos nosso direito de escolhas.
Conhecendo-nos tão mais que o ideal; nem mesmo por brincadeira imagino um recomeçar; faríamos tudo exatamente da mesma forma - não foi o que fizemos a cada nova oportunidade? Não cometemos os mesmos erros sabendo que estávamos errando? Nem mesmo tivemos o bom gosto de procurar novas formas de nos equivocarmos...
Somos imutavelmente patéticos, não é o máximo do mau gosto?
Aí jaz um ser que morreu por engano, aqui também. Que decadência!
Atrás da porta sempre haverá alguém chorando, mesmo que por um minuto.
Resolvi registrar toda esta droga, para que nós dois tenhamos ao menos um resto de dignidade, que nos impeça de fazer a mesma mágica barata um para o outro; estamos realmente cansados de repetir a mesma cena.
 
Não me esqueci de imagem, é que não quis procurar uma medíocre o suficiente para ilustrar uma coisa que é qualquer coisa mesmo, porque agora todos os possíveis motivos já não importam.

Rose Stteffen
Enviado por Rose Stteffen em 16/07/2012
Reeditado em 16/07/2012
Código do texto: T3780836
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.