T.O.C

Como se começa do fim? Isso aqui é uma petição de suicídio... Tão logo você desfilar suas mandalas castanhas por essas palavras, me porá pra correr com o rabo entre as pernas, como o cão covarde que sou. Falemos de covardia, então: sua presença me esmorece e me enternece; me confunde e me contunde. Não há suplício maior que me possa ser infligido do que um tête-à-tête com você - e longe de você ter feições de um Corcunda de Notre Dame; não, não mesmo. Sei que sua vontade é de começar a ler pelo fim pra apagar essas interrogações que pairam acima dos seus desalinhados e desgrenhados e crespos cabelos de uma vez por todas, mas, me espere, preciso me explicar; o recheio disso aqui é explicação. Ora, não torne vãs minhas hesitações todas; minhas cabeçadas na parede desse quarto imundo em que vivo sozinho, chacoalhando as idéias, tentando racionalizar e minimizar esse erro que estou cometendo; tentando - sem sucesso - transformá-lo em uma masturbação anônima e sem o peso do registro de fileiras e fileiras de palavras traiçoeiras e comprometedoras. Você é má, ambos sabemos. Dissimula e sorri com facilidade com um punhal na mão que mantêm às costas. Suas atitudes supostamente - pois veja bem: sou homem, e como homem, sofro de uma síndrome doentia (algum desvio cerebral, biológico, sei lá) que transforma um simples "bom dia" feminino em juras de sexo alucinante, interminável e sem culpa - ambíguas têm esvaziado meu crânio de tudo quanto é pensamento meu. Sabe, queria te mostrar o inchaço nas minhas coxas - de afundar ponta das chaves que carrego no bolso - mas só me resta falar sobre ele; queria filmar meus acessos sadomasoquistas onde estapeio minha cara pra parar de pensar no quão mambembe poderíamos deixar essa minha cama de solteiro, mas só me resta te entregar o ouro da minha personalidade borderline. Estamos, imagino, num ponto da carta onde você pensa que se trata de uma piada... Bom, eu SOU uma piada - das mais sem graças, por sinal -, mas o que você leu, lê, lerá (ou não), não. Imagino, também, que após ler essas últimas palavras você já esteja maquinando um achaque dos mais sucintos, discretos e terríveis que minha mente é capaz de conceber - chute no rabo sem direitos, processos, vida suja arruinada ad infinitum etc. Tudo bem, eu agüento. Eu agüento tudo de ruim que possa vir - não é isso que as pessoas que repugnam os suicidas pensam sobre elas mesmas? O que me difere delas é a ciência de que não haverá salvação alguma após as curradas temporais e muito menos curradas atemporais; e outra, se houver, de fato, que me importa? Não pedi um mundo, uma vida, e muito menos essa moral amoral que impera nesse chiqueiro voador. Caralho, mulher, amo você, amo você com toda a força vascularizada do meu órgão sexual; amo com toda a poesia possível represada no âmago do poeta desconhecido; amo você com toda a disritmia que me assaltou quando sentei à luz do abajur e te escrevi esse monte de coisas nonsense e que provavelmente você porá termo numa fragmentadora de papel com motor queimado. Porra, chega!

Como se termina um começo?

09/11/2011 - 17h57m

Rafael P Abreu
Enviado por Rafael P Abreu em 09/11/2011
Código do texto: T3326684
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.