OS INFORTÚNIOS DE GONÇALVES DIAS
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Notas Biográficas
Nasceu, Antônio Gonçalves Dias, no dia 10 de agosto de 1823, numa palhoça sem qualquer conforto, de uma fazenda dos arredores de Caxias (Maranhão), entre aflições e medo. Pois, seu pai Manoel Gonçalves Dias, comerciante português e Vivência Ferreira, a amante, brasileira de origem ainda incerta (índia pura ou cafuza?), ali havia se refugiado das perseguições dos nacionalistas mais exaltados.
Aos seis anos Gonçalves Dias conhece seu primeiro infortúnio: separa-se da mãe. Seu pai a abandonou para casar-se, em Caxias, com outra mulher. Deixaram-lhe viva e forte impressão este incidente de sua vida, conforme narra no belíssimo poema autobiográfico Saudades, que dedicou à irmã:
Parti, dizendo adeus à minha infância,
Aos sítios que eu amei, aos rostos caros
Que já no berço conheci, aqueles
De quem mau grado a ausência, o tempo, a morte
E a incerteza cruel do meu destino,
Não me posso lembrar sem ter saudades
Sem que aos meus olhos lágrimas despontem.
O menino Gonçalves cresceu em Caxias, onde aprendeu as primeiras letras, revelando viva inteligência. Em 1837, trouxe-o o pai para São Luís, capital do Maranhão, a fim de embarcarem rumo a Europa. O pai, já muito doente, em busca de saúde; ele de instrução. Ia completar os estudos secundários e seguir o curso de direito em Coimbra. Pouco tempo depois de chegarem a Portugal, morre seu pai. Com quatorze anos, conhece Gonçalves seu segundo infortúnio: separa-se do pai. Estava só em terra estranha.
Não obstante os anos passados, no mesmo poema Saudades, deixa transparecer sua grande mágoa por "essa dor que não tem nome":
De quando sobre as bordas de um sepulcro
Anseia um filho, e nas feições queridas
Dum pai, dum conselheiro, dum amigo
O selo eterno vai gravando a morte!
Escutei suas últimas palavras,
Repassado de dor! – Junto ao seu leito,
De joelhos, em lágrimas banhado
Recebi seus últimos suspiros.
Acabrunhado e magoado, regressa, o órfão Gonçalves, a Caxias. Encontra, para sua dor, apoio em sua madrasta, que o manda de volta para Portugal, em 1840, matriculado na Universidade de Coimbra. Desta vez, passa o poeta por dificuldades materiais, porque a situação financeira da madrasta tornara-se difícil em Caxias; e, nem sempre podia enviar-lhe a mesada. Houve momentos em que o poeta pensou em desistir e tornar ao Brasil, e tê-lo-ia feito, se não fosse à solidariedade dos companheiros de estudo e conterrâneos que contribuiriam para lhe garantir sua estada em Portugal.
Em Coimbra, Gonçalves não se limitou somente ao curso universitário. Estudou a língua e a literatura da França, Inglaterra, Alemanha, Espanha e Itália. Escreveu grande parte das poesias dos Primeiros, Segundos e Últimos Cantos, só mais tarde publicadas. Escreveu fragmentos do romance biográfico Memórias de Agapito Goiaba, queimado depois pelo próprio poeta, por conter alusões a pessoas ainda vivas. Escreveu, também, as peças teatrais Patkull e Beatriz Censi, depois rejeitadas por sua condição de texto "imoral" pelo Conservatório Dramático do Brasil.
Em 1845, forma-se em Direito, e regressa a sua terra natal, mas não permanece por muito tempo, em 46 viaja para o Rio de Janeiro, e nesse mesmo ano publica os “Primeiros Cantos”. Antes publicara apenas um pequeno poema, Inocência, no Trovador, de Coimbra e três ou quatro de igual extensão no Arquivo, jornal do Maranhão. No prólogo de Primeiros Cantos, Gonçalves Dias, nos conta seu conceito de Poesia:
Gosto de afastar os olhos de sobre nossa arena política para ler em minha alma, reduzindo à linguagem harmoniosa e cadente o pensamento que me vem de improviso, e as idéias que em mim desperta a vista de uma paisagem ou do oceano – o aspecto enfim da natureza. Casar assim o pensamento com o sentimento, a idéia com a paixão, colorir tudo com a imaginação, eis a Poesia – a Poesia grande e santa – a Poesia como eu a compreendo sem a poder definir, como eu sinto sem a poder traduzir.
E é isso que vamos, efetivamente, encontrar em toda a lírica de Gonçalves: uma constante nostalgia a amargurar-lhe a alma profundamente melancólica. A consciência da inferioridade de origem, a saúde precária, tudo lhe era motivo de tristezas, por ele bem expresso nessas quadras:
Uma febre, um ardor nunca apagado,
Um querer sem motivo, um tédio a vida
Sem motivo também – caprichos loucos,
Anelos doutro mundo e doutras coisas;
Desejar coisas vãs, viver de sonhos,
Correr, após um bel logo esquecido,
Sentir amor e só topar frieza,
Cismar venturas e só encontrar dores.
Em 1851, o poeta recebe do governo a incumbência de examinar o estado da instrução pública no Norte do país, para onde parte. Em São Luís do Maranhão, Gonçalves encontra moça feita a menina Ana Amélia, que lhe inspirara os versos Seus Olhos e Leviana. Enamoram-se, e, em 52, pede-a em casamento, mas a mãe da moça influída pelos preconceitos de cor e nascimento, refutou veementemente o pedido. Eis aí o seu terceiro e maior infortúnio: separa-se do grande amor de sua vida.
A dor do poeta foi grande e incurável. No entanto, lhe inspirou os mais sinceros e profundos poemas dos Novos Cantos, em especial, A Sua Voz, Se se Morre de Amor!, Não me Deixes e Ainda uma Vez, Adeus!
No mesmo ano, amargurado, retornou ao Rio de Janeiro, onde, procurou assentar sua vida, num casamento infeliz com Olímpia Carolina da Costa. Sem paixão de sua parte, e de paixão ciumenta da parte da esposa, separaram-se em 1856. Tiveram uma filha falecida na primeira infância. ®Sérgio.
Veja Também (clique no link):
O Grande Amor de Gonçalves Dias.
Agonia e Morte de Gonçalves Dias.
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Ajudaram na composição do texto: BOSI, Alfredo – História Concisa da Literatura Brasileira, 3ªed., São Paulo, Cultrix. / VERÍSSIMO, José – História da Literatura Brasileira, Rio de Janeiro, Record, 1998. / BANDEIRA, Manuel – Seleta de Prosa, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1997.
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