FRAGMENTOS DO TEMPO – INFÂNCIA II

FRAGMENTOS DO TEMPO – 3 INFÂNCIA II

Em minha infância fui muito solitária, sem amigos ou irmãos por perto, ao lado de adultos que, como era de praxe, além de nada me informar, nem sequer me incluíam em suas conversas. Passeios nem pensar, Paizinho era muito ocupado e dizia que isso era tarefa de Mãezinha, que por sua vez não gostava de sair, imaginem que nem as homenagens do dia das mães ela comparecia.

Além de não ir, não deixava que eu fosse com outras pessoas, salvo com uma vizinha de frente à minha casa, alma caridosa que se penalizava com meu enclausuramento, tinha três filhos, um menino e duas meninas, que se tornaram amigos preciosos, tanto é que nunca perdemos o contato. Verdadeiramente essa família faz parte de minha história.

Dessa forma, tinha como opções de companhia apenas os animais domésticos da minha residência: cachorro; gato; e aves, (pássaros, patos e galinhas) lembro-me ainda da curiquinha, uma porquinha simpática que por não fazer regime logo foi sacrificada para saciar a fome de alguns, menos a minha.

Minha residência parecia um sítio, era um ambiente espaçoso, e muito arborizado. Costumava subir nas árvores para colher e saborear as frutas fresquinhas, goiaba, caju, siriguela dentre outras de mais difícil acesso como é o caso do limão, que com uma pitadinha de sal ficava uma delícia.

Havia também balanços, e determinadas árvores em que sempre me acomodava para estudar ou cantar. Era fã de Jerry Adrianny, Roberto Carlos, e outros mais da Jovem guarda, aprendia as músicas ouvindo-as pelo rádio, principalmente quando mãezinha saia de casa, aí sim, eu pintava o sete, usava suas pinturas, sapatos roupas, enfim, chegava a remexer em tudo, sempre trancada para evitar qualquer flagra.

Em relação a iguarias proibidas, o depósito do açúcar era meu favorito, recebia muita repreensão até o dia em que aprendi que se agitasse o pote não deixaria pistas que usara a colher, e assim, ia me safando. Porém uma vez me dei mal em minhas travessuras, fui tirar as sobrancelhas com uma navalha de meu pai fazer a barba, e me cortei, foi um sacrifício extremo para estancar o sangue, além de ficar muito assustada, essa peripécia valeu-me uma imensa reprimenda.

Quanto às brincadeiras com as bonecas era por pouco tempo, o bastante para trocar suas roupas e pô-las para dormir na casinha edificada no quintal, com papelão, paus e palhas de bananeiras, obviamente com a ajuda de meu pai, que fincava bem as estacas no chão, evitando assim, o desmoronamento que ocorria quando me dispunha a construí-la sozinha. Todavia, chorei muito quando minha avó, sem querer, incendiou minha casinha destruindo tudo, inclusive o que tinha lá dentro.

Na realidade não me conformava com a passividade daquelas bonecas. Certa vez, já na preadolescência ganhei uma de tamanho médio, que chorava quando a viravam, mas não me contentei plenamente, choro sem sentimento não valia, por isso preferia conversar com os animais e me divertir com a expressão deles, até parece que me entendiam, dando sinal de contentamento ou de medo, dependendo da minha ação. C O N T I N U A

Mira Maia 16/06/2014