Autobiografia I

É com o início das aulas no começo do ano, o que às vezes coincide com as chuvas do que chamamos inverno, que desperto prá um recomeço, como na época em que frequentava a escola. O que me faz me sentir melhor não é só esse reinício das atividades e o deleite de sentir a chuva fazendo renascer o campo e a paisagem, é também e principalmente o desejo, o renascer da vontade de viver que em mim é muito intensa. Sinto uma grata satisfação por existir, verdade, insisto nesse ramerrão de gratidão pela existência e creiam, é verdade.

Sou interiorano, cearense, morei em algumas cidades grandes do Brasil e me adaptei como pude, parece mesmo que Deus dá o frio conforme o cobertor.

Meu pai se chama Francisco, o chamam de Chico João e é filho de camponês. Além do gosto pela caça, admira a leitura e a música, eu o considero um poeta, embora ele não tenha escrito versos. É um apreciador das artes, meio indiferente à laboriosidade, mas trabalhou o suficiente para conseguir a aposentadoria. Papai e mamãe se conheceram no Aracati, quando ele estudava por lá no colégio Marista. Minha mãe se tornou professora e dona de casa, possuía um grande instinto materno aliado à moral Cristã e à rigidez de uma família educada ainda no relho de couro cru e na palmatória.

Meu avô paterno, era conhecido por João Luis, homem do campo, possuidor de umas dezenas de hectares, vivia da agricultura doméstica e da exploração da carnaúba. Nasceu pouco antes da chegada do século XX, e deixou o vale do Jaguaribe em companhia do pai na estiagem de 1915, para se fixarem na Mata Fresca. Era alto e esguio, meio índio, puramente sertanejo, atento a tudo quanto é coisa do mato... lembro-me do som produzido pelo maracá da cascavel, quando nós, ele, eu e o nego Zé, íamos pela vereda da cacimba e ele gritou atrás de mim: é uma cobra! Paramos assustados. Era tardezinha, já nem se via mais o sol por detrás da mata de jurema... enrolada bem à minha frente estava a bicha venenosa, de vez em quando estertorando o chocalho. Foi morta a pauladas pelo velho, que depois, ainda extraiu o maracá. O nego Zé e eu ouvimos dele naquela tarde que cada chocalho do maracá representava um ano de vida da serpente... o meu avô, se dizia curado de cobra, e isso eu não sabia bem o que queria dizer, mas dizem que quem é curado de cobra, pode ser mordido por uma venenosa e não ser envenenado, outros dizem que um curado de cobra, se cuspir na boca de uma serpente, ela é quem morre. Essas coisas são ditas por pessoas dos matos e o meu avô se dizia curado, do mais não sei, sei que aquele acontecido foi comentado no caminho de volta e em casa, que uma cascavel quase ia me dando um bote, ante as exclamações de espanto da minha avó paterna e da sua irmã, a cachimbeira Odeta.

__ Valha-me nossa Senhora! ói que uma coisa dessa! Uma cascavel quage ia mordendo o menino!

Eu devia ter uns sete anos.

Aviso aos amigos leitores do RL que a continuação desse meu relato estará em breve disponível em e-book no amazon.com. Não deixem de ler. Um abraço e até logo.

Agamenon violeiro
Enviado por Agamenon violeiro em 02/05/2013
Reeditado em 09/10/2015
Código do texto: T4270673
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