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Aposto! Nasci quando chovia muito: estou sempre nublada! Minha namorada acredita que dias cinzentos me trazem leveza. Lia se mostra uma alma de docilidade insuportável. O sorriso sempre sincero, doa-se sem cobrar retorno. Talvez eu a odeie, e por isso permaneça a seu lado, preciso agredi-la! Sinto-me Bandeira demais para suportá-la: os anjos não compreendem os homens. Eu a carrego às costas. Embora sua pretensão de ser angelical, não possui asas. Ainda bem! Seria demais até para a índole predadora que me faz agir.
 
Se tenho Lia ao lado direito, cativo Cacaô (deste jeito: Ca-ca-ô) ao esquerdo. Alguns anos mais jovens, diverte-se em me retratar. Prefiro seus desenhos às fotos. Revelam-me com maior paixão. Assusta-me ver em seus traços a face nua e cruel que ostento. Creio que me ama. Não por minhas qualidades, todas dispersas ou falsas, mas pelos defeitos que cultivo. Minha identidade são as faltas que cometo.
 
Leio Ana Cristina Cesar, que entendo um pouco menos do que a mim mesma. Distraio-me e deixo de me enxergar. Perigoso se descobrir! Quase certo não se apreciar a imagem refletida ao espelho. Interpretar a Ana, que não consigo, rouba-me o tempo de saber quem ocupa o corpo de 28 anos, um pouco usado, outro tanto marcado, sem grandes atrativos sociais. Imagino-me no texto alheio, em lugar de capturar-me. Bom recurso que se presta a livrar de me perceber.
 
Meus poemas não têm sentido para mim. Pertencem a quem os lê. Como deve ser. Que ousadia, caso procurasse impor aos outros as ideias desta mulher sem limites! Pura corrupção. Não ofereço pedagogias, somente inconstâncias, incoerências. O ponto de contato com meus leitores é que utilizamos fermento idêntico. Diferem os paladares da massa. Sou bolo azedo sobre uma prateleira açucarada. Não gostem de mim, por favor. Engulam somente as minhas palavras.