Os Félix no Rio Piranhas

Registra-se que na segunda metade do século XIX, os irmãos Manoel Félix da Costa e José Félix da Costa, oriundos de Jardim do Seridó-RN, se fixaram em terras de propriedade do senhor Bonifácio Gonçalves de Moura (1869-1941), pai do ex-bispo de Cajazeiras, Dom Zacarias Rolim de Moura (1914-1992), às margens do Rio Piranhas, nas proximidades de onde hoje se localiza o Núcleo Habitacional II (São Gonçalo-PB).

Conforme Hélias (2015), naqueles tempos nos sertões nordestinos “Havia um fluxo tenebroso de flagelados que fugiam das secas, arrastando suas desilusões por veredas e sendas desconhecidas”.

Trabalhando como vaqueiro do Senhor Bonifácio, segundo a tradição oral da família, Manoel Félix recebeu do patrão a doação de vasta extensão de terras, que se estendia do Sítio Lamarão até o Santarém (onde hoje se localiza o Mutirão, em Sousa), numa época que estas terras possuíam pouco valor. Em vida, nos primeiros anos do século XX, vendera parte delas. Com a sua morte, no ano de 1921, parte das terras foi dividida entre os herdeiros, enquanto outra parte tivera mãos alheias como destino e causa desconhecida.

Embora homem de hábito de vida rústico, típico dos tempos do carrancismo nordestino, das brenhas do pé de serra do sertão, Manoel Félix teve uma existência prolongada, entrada em muitos anos. Sobrevivera até mesmo à cruel seca de 1877, que vitimou quase meio milhão de nordestinos e fora lucidamente denunciada por Rodolfo Teófilo. Mesmo tendo sido um homem de corpo e alma surrados pelas inclementes estiagens, é sabido que atravessara a longínqua vida sem conhecer a figura de um médico, sem jamais visitar algum hospital.

Manoel Félix era um sertanejo de antecedentes honrados. Havia herdado dos pais apenas a miséria e a dignidade. Com estes atributos, derrotaria inúmeros verões históricos e exponenciais. Pode ser considerado um símbolo da insurgência contra a impetuosidade das secas, por quem destilava todo o seu desagrado e desafeição.

Aquele sertão acolhedor era a sua casa, a sua fortaleza intransponível. De lá, nunca mais arredaria os pés. Quando de sua morte, em um nebuloso outono de 1921, o sertão embargou a voz, desfaleceu a face, e chorou. Copiosamente. Numa tristeza incontrolável e indefinida. Nada mais óbvio quando um pai perde um filho querido. O exército sertanejo perdia um herói de guerra, um veterano das contundentes batalhas contra as secas. Até mesmo a caatinga verde, aproveitando-se das últimas chuvas do acanhado inverno do ano, murchou por dentro, com a notícia de conteúdo desolador.

Desse modo, calou-se o aboio do vaqueiro. Silenciou-se a poesia que brotava das cordas vocais do músico-aboiador. Pendurou-se, para sempre, o velho chapéu de couro do campeador de gado do sertão nordestino. A boiada perdeu o seu rumo. Ao sabiá não restou escolha, senão se assentar nos galhos do marmeleiro e cantar de tristeza. O ermo sertão meridional paraibano nunca mais seria o mesmo.

Além do patriarca dos Félix, morreriam no mesmo ano os chefes das famílias Jó e Maroca, tornando o preto a cor predominante na região por um longo período. Aquele foi um período excruciante.

Entrara na era da orfandade o vale. Uma cicatriz marcaria para a sempre a sua face. (HÉLIAS, 2015)... Era agora o sertão esverdeado por fora e enegrecido por dentro. Aquela relação homem-sertão-caatinga era estritamente passional.

São filhos do casal Manoel Félix da Costa e Ângela Maria da Conceição (bisavós paternos de Nina):

1 - Pedro Félix (22.07.1901-26.09.1976), casado com Joana, em primeiras núpcias, com quem teve os filhos: Dimas (casado com Tica), Rubens (casado com Marlene), Zequinha (casado com Lindalva de Candu) e Silvia (casada com Jacinto); e com Munda (30.12.1916 -26.05.2007), em segundas núpcias, com quem teve os filhos: Chico Pedro (casado com Deza), Lurdes Félix (casada com Valderi Félix), Joana Félix (solteira), Celesto (casado com Sonia), Chagas (casado com Vanda), Salé (casado com Rosa), Maria Félix (solteira), Alzira Félix (casada com Peba) e Fátima Félix (casada com Mago);

2 - Miguel Félix, casado com Cândida, que era sua sobrinha (filha de João Félix). São os pais de: João Miguel (casado com Socorro Félix), Geraldo Félix (casado com Elizabete), Zé Félix (casado com Francisca), Angelita (casada com Adelson), Oliveira (casado com Valmira), Assis (casado com Adalgisa), Paulo (casado com Alzenir), Toinho (casado com Regina), Maria de Lourdes (casado com Nelson) e Joaquim (casado com Eurismar);

3 - João Félix, casado com Maria Cândida (irmã de Vevea). São seus filhos: Joaquim Sobrinho (casado com Maria), Zé Justino (casado com Joaquina), Santana (casada com Antonio Basílio), Helena (17.12.1923-28.10.2013, solteira), Ângela (casada com João Trajano) e Cândida (casada com Miguel Félix, seu tio);

4 - Raimundo Félix, casado com Raimundinha. São os pais de Manoel Félix da Costa Neto (solteiro);

5 - Antonio Félix, casado com Maria Suzana. São filhos do casal: Mundico Seresteiro (casado com Socorro), Odete Suzana (casada com Miguel Basílio), Germania Félix (17.03.1937-07.03.2008, casada com Otacílio), Geralda (solteira) e Francisca (casada com Miguel Neco);

6 - Isidora Félix, casada com João Zumba (irmão de Vevea), em primeiras núpcias, com quem teve os filhos: Antonio Zumba (solteiro), Zumira (esposa de Francisco), Candinha (esposa de Chico Firmino) e Rosa (solteira, doente mental); e com Mestre Cícero, em segundas núpcias, com quem teve os filhos: Maria (casada com João Ribeiro), Manoel e Nazinha;

7 - José Galdino da Costa (Dadino), casado com a prima Alexandrina Maria da Conceição (Vevea), que era filha de José Félix da Costa e Cândida Maria da Conceição. São filhos do casal Dadino e Vevea, que residia no Sítio Alto da Boa Vista: Raimundo Galdino (1918-1995, casado com Bila); Manoel Galdino da Costa (casado com Francisca Abrantes da Costa); Julia Galdino (23.06.1926-17.09.2009, casada com Manoel Basílio 23.07.1918-07.07.1986); Maria do Socorro Félix (18.11.1928-2019, casada com João Miguel 1932-2013); e Zolda (26.10.1935, casado com Dezuíte 04.08.1934-02.07.2005);

8 - Francisca Lourenço de Jesus (01.06.1895-1973), casada com José Basílio da Silva (filho de Jose Vicente e Maria Basilio). São os pais de: Maria Soledade (casada com João Jó), Manoel Basílio (casado com Júlia Galdino), Lídia (casada com o sobrinho Tarso), Angelina (casada com Chico Nobre), Miguel Basílio (03.11.1928-01.10.2006, casado com Odete 15.01.1933-09.05.2014), Maria Basílio (casada com Antonio Roque), Regina (casada com Pedro Ferreira), Severina (casada com Zé Mendes) e Antonio Basílio (casado com Santana);

9 - Alexandrina Félix (1900-1962), casada com Júlio Ferreira (?-1970). São seus filhos: Joanita Ferreira (27.06.1915-17.09.2009, casada com Celedon), Neco Ferreira (casado com a professora Doralice), Francisca (casada com Antonio Benedito), Helena Ferreira (06.08.1917- 17.11.2003, esposa de Zé Terroso) e Severina (esposa de João Caboclo);

10 - Ana Félix, casada com Manoel Zumba (irmão de Vevea), em primeiras núpcias, com quem teve os filhos: Chico Rocha (solteiro, 02.04.1922-20.06.2007), Dona Candu (casada com Aprígio) e Raimunda (solteira); e com Zé Rocha, em segundas núpcias, com quem teve os filhos: Honorina (casada com Cazuza 1927-20.08.1993), Helena Félix (casada com Leomar) e Maria (casada com Avelino);

11 - Joaquim Félix, casada com Severina. São os pais de: Cazuza (casado com Honorina), Ciano (casado com Mercês), Joaquina (casada com Hélio), Constante (casado com Lourdinha), Maria (casada com Joaquim) e Edwiges (casada com Feliciano Ferreira);

12 - Maria Ângela, casada com Zé Zumba (pai de Vevea). São filhos do casal: Maria do Carmo (casada com Joaquim Alves), Olindrina (solteira) e Ângela (casada com Bonfim);

Comenta-se que o ano de 1877, período da mais devastadora seca dos sertões, registrara um acontecimento que seria cômico se não fosse trágico. Este foi um ano em que os céus não demonstravam boa vontade com os sertanejos. Muito menos piedade.

Há tempos que o sol namorava o céu, sem nenhuma testemunha. Para desgosto dos sertanejos, todas as nuvens se ausentaram. Preferiram não atrapalhar aquele romance. Em um dia desses, um viajante que perambulava pelos extremos rincões da Paraíba, aparece na região, demasiadamente sedento e faminto. Logo é servido com uma saborosa água do pote de barro. Conversa vai, conversa vem, indaga sobre a alimentação local neste período de grave estiagem. Os nativos respondem que estão se servindo de malassada. Por instantes, o forasteiro revigorou o semblante, esboçou um sorriso colorido. Mas tudo não passara de um mal-entendido. Na realidade, os ribeirinhos do Piranhas estavam se alimentando de pedaços de couro de mala assada, além de pedaços de sandálias de couro. Não havia comida, apenas combalidas esperanças. Era um lugar de que o mundo havia esquecido.

De acordo com Cardoso (2013), os flagelados desta histórica seca de 1877-1879 se serviram do couro para matar a fome naquele aterrorizante período. Nesta seca, devido à grande mortandade que se abateu na localidade, ocorreram muitos enterros na própria região sitiante.

Dadino era um rapaz avesso à frouxidão e o pai sabia bem disso. Sendo assim, quando entra o ano de 1915 e uma pavorosa seca faz morada no sertão, expulsando e desfalecendo grande parte do seu povo, como bem dissera Raquel de Queiroz, Manoel Félix ordena uma missão (quase) impossível para o filho, então com 18 anos. Determina que, diante das enormes dificuldades com o roçado, ele viaje até Cabaceiras, próximo a Campina Grande, a fim de conseguir um empréstimo de uns trocados com um compadre dele, para a família atravessar a estiagem. Inicialmente, a dura missão havia sido imputada ao primogênito, João Félix. Entretanto, como este havia casado recentemente, pediu ao pai dispensa do sofrível encargo.

Não bastassem a seca hedionda, a inexistência de estradas e o desconhecimento do caminho e destino, a viagem de quase 700 quilômetros, ida e volta, teve que ser derrotada a pé, pelas selvas da caatinga, sem nenhum centavo no bolso, atravessando vilas e povoados, seca e dor, miséria e abandono. Orientando-se apenas pelo sol e pelas estrelas, seguiu o seu caminho. Semblante tenso, mas sem reclamar.

A caatinga, aparentemente desabitada e inóspita, reservou ao jovem desbravador uma recepção amistosa. Vez por outra, era saudado por mandacarus e xique-xiques. As palmas, nitidamente gentis, o aplaudiam. Os juazeiros, umbuzeiros e jatobás ofereciam-lhe frondosas sombras e suculentos frutos. As lagartixas nunca lhe negaram cumprimentos positivos com a cabeça. As cigarras anunciavam, exultantes, a sua passagem com uma cantoria harmônica de 120 decibéis. Já a onça parda passou por longe, sem cortejá-lo. Mas sua fama era conhecida na região. Era um felino arisco, antipático e mal-educado. Não gostava de estranhos.

Embora sem acompanhante na longa viagem, Dadino nunca se sentira sozinho. Durante o dia, era escoltado de perto pela sombra, projetada por um sol em alta combustão. À noite, confabulava com mosquitos e pernilongos até altas horas. Quando o sono chegava, pouco antes das aragens da madrugada, ajeitava o aromático travesseiro confeccionado por folhas de eucalipto, cobria-se com a lua e adormecia, ouvindo ao fundo o estridente canto dos grilos.

Certa noite, depois de um dia inteiro de caminhada, bastante cansado e faminto, pede abrigo em uma modesta e isolada casa, no meio do nada, nos limites das jurisdições do sertão. Os moradores, bastante receptivos, ofertam ao jovem viajante um avantajado e calórico prato de comida e uma confortável rede de chita armada no alpendre. Tudo levava a crer que aquela seria sua noite de luxo.

Todavia, no correr da madrugada e já atingido por um sono profundo, Dadino é surpreendido com uma contundente lambida de vaca na sola dos pés. O susto é tão grande que ele salta de cima da rede aos gritos, ocasionando um susto ainda maior no animal, que corre e saltita desesperado. No final, percebe-se que os dois, homem e animal, numa cumplicidade involuntária, acabam destruindo o alpendre alheio.

E assim, sob uma bravura exponencializada e com a anuência da sorte, se passaram dias e noites, até o fiel cumprimento do encargo...

Em 1919, mais uma temível seca assola os sertões. Intrometida, entrou sem avisar pela sala de estar do Nordeste. As escassas e franzinas nuvens que percorriam os céus, no dia de São José, ainda choraram algumas lágrimas de despedida. Depois, encabuladas, migraram para bandas distantes, deixando a desolação como soberana, imperial.

Neste período, há muito recuado, em certo dia, alguns filhos de Manoel Félix se animaram ao avistar um descarnado peba nas imediações dos sítios Recanto e Matumbo. Era um tempo de fome e consternação. Desta feita, montaram uma escala de revezamento e passaram a perseguir o animal, dia e noite. Em um anoitecer atípico, começa a chover no sertão. Pedro Félix guardava a toca. De repente, o animal sai do esconderijo e é prontamente agarrado pelo vigilante atento. Entretanto, Pedro percebe que, após dias sem se alimentar, o réptil continha apenas pele e osso. Mesmo assim, diante das circunstâncias, foi levado e servido um caldo com sal do bicho, em um jantar especial para a carente família.

No entanto, as coisas logo começariam a mudar, com a ascensão de um cabra da peste para governar a nova República, apelidada de velha. E o Paraíba não decepcionou seus conterrâneos. De imediato, Epitácio implantou um ambicioso programa governamental de combate aos efeitos maléficos das secas, irradiando esperança pelo sertão nordestino. Assim, no dia do aniversário de Deus, quem ganha presente são os filhos Dele, ou seja, a Lei nº 3.955, de 25.12.1919, conhecida como a Lei Epitácio Pessoa, autoriza a construção de obras de açudagem e de irrigação no Nordeste.

Alguns filhos de Manoel Félix, dentre eles, Dadino e Pedro Félix, trabalharam nas obras de construção do açude São Gonçalo, nas décadas de 1920 e 1930, sob as rígidas ordens dos patrões Epitácio e Getúlio.

Além deles, os irmãos Joaquim Jó e Zé Jó, filhos de Seu Jó, também trabalharam na vultosa construção, na década de 1930. O irmão mais jovem, João Jó, não foi contratado, devido ao porte físico franzino. Aos sábados, nas primeiras horas do dia, João Jó montava o seu jegue e ia até São Gonçalo pegar a feira com os seus irmãos nos tradicionais barracões do acampamento.

Os irmãos Jó contavam que, devido às precárias condições sanitárias e as epidemias que assolavam a região, havia muitas mortes de operários. Então, o chefe do serviço determinou a criação de turmas de enterro, encarregadas de transportar, a pé, os mortos em uma rede para serem enterrados em Sousa.

Não seria exagero imaginar que estes operários tiveram a honra de ver de perto o Ministro da Viação e Obras Pública, José Américo de Almeida, entre os anos de 1932 e 1934, visitando os trabalhos que ele tanto contribuiu para que se concretizassem, conversando com o Engenheiro Estevam Marinho sobre o andamento das obras, sendo cobrado pelos cassacos os pagamentos atrasados...

Certamente, um acontecimento presenciado pelos jovens cassacos sitiantes foi a retirada de uma grande ossada de um animal pré-histórico, de cor azulada, nas escavações da barragem, no ano de 1932, a aproximadamente 17 metros de profundidade. Um grande alvoroço tomou de conta da obra em que todos os operários, chefes e engenheiros se locomoveram até o local para ver o achado misterioso. Foram encontrados vários ossos, dentre os quais um fragmento de cabeça e outro de madeira petrificado, que foram cuidadosamente guardados pelo Dr. Estevam Marinho, engenheiro responsável.

Outro fato que também acompanharam, foi o fatídico acidente acontecido durante as escavações da barragem do açude, no ano de 1933, em que um soterramento ceifou a vida de uma equipe inteira de cassacos. Os corpos nunca foram resgatados, continuam soterrados até hoje sob a magnifica obra de engenharia, que seria concluída no ano de 1934.

No dia 5 de novembro do mesmo ano, sob o comando de José Augusto Trindade (Chefe da Comissão de Serviços Complementares) e Manoel Tavares de Melo C. Filho (Chefe local), acontece a inauguração do Posto Agrícola de São Gonçalo, o mais destacado dos Postos Agrícolas da IFOCS. O Jornal a União destaca o certame, que apresenta uma exposição agropastoril regional, a primeira do sertão da Paraíba, e a oferta de cursos para fazendeiros e agricultores da região. O evento contou com a presença do Interventor da Paraíba, Gratuliano da Costa Brito (1932 a 1934).

No dia 21 de fevereiro de 1935, devido às boas chuvas, ocorreu a inundação do acampamento, visto que a barragem interrompera o curso natural do rio. Por outro lado, o sangradouro, ainda em construção, contava com pequena altura. Desta feita, a água passou por sobre o sangradouro invadindo e inundando todas as ruas centrais, como a Rua Dezesseis, Avenida Rio Piranhas, Rua Mecânica, Rua da Baixa...

A população já se encontrava de sobreaviso na expectativa de uma possível inundação, mesmo assim, quando a sirene da casa de força apitou, de forma bastante incisiva, por volta de meia-noite, foi um tumulto generalizado. As pessoas corriam desesperadas abandonando suas casas. O Dr. Estevam Marinho preparou equipes de operários com barreiras de sacos de areia no intuito de impedir a inundação das ruas, mas todo o esforço foi em vão. A inundação fez-se realidade, ocasionado desabamento de várias casas. A maior resistência adveio da Rua Dezesseis, cujas casas foram construídas de maneira bem mais estruturadas que as demais.

São filhos do casal José Félix da Costa (irmão de Manoel Félix da Costa), conhecido como Zé Zumba, e Cândida Maria da Conceição (bisavós paternos de Nina): Vevea, casada com Dadino (primo); Tintina (solteira); Maria Cândida, casada com João Félix (primo); João Zumba, casado com Isidora (prima); Manoel Zumba, casado com Ana Félix (prima); e Cândida (solteira).

Zé Zumba faleceu por volta do ano de 1939, sendo enterrado numa rede, uma vez que até parte da década de 1950, devido às frágeis condições financeiras, vigorava este costume nos sítios locais. Andrade (2014) declara que além de ser uma peça indicativa da pobreza, a rede servia para lembrar aos vivos que o finado dormia o sono eterno. Que sua alma seria acordada por Deus, dono de todas as almas.

No dia 1º de outubro de 1940, acontece um eclipse solar que contemplou a inculta região dos sítios. A comunidade entrou em pânico diante do inédito espetáculo da natureza, quando em pleno dia o sol cedeu espaço à sombra da lua. Galinhas se recolheram aos poleiros, pássaros retornaram aos seus ninhos, preás se embrenharam em suas locas. Caborés e raposas ainda ensaiaram ficar de pé, mas preferiram retomar o sono sagrado. Dadino, Raimundo Galdino, Manoel Galdino e Chiquinha voltaram às pressas do roçado, atônitos. Traziam nas feições o pavor do avistar o fim dos tempos. Em casa, Vevea, desesperada, começa a chorar e rezar, agarrada pela saia pelo filho caçula, Zolda, de cinco anos. Todos acreditavam que havia chegado o dia do juízo final, o julgamento por Deus de todos os seres humanos, conforme as profecias bíblicas.

Entretanto, em poucos minutos, o eclipse passara, com o retorno do sol, e a vida retornaria a sua normalidade. Com a volta gradativa da luz, os galos cantaram novamente, mesmo sem nada entenderem.

Em 1948, uma grande cheia atinge a região. O açude de Boqueirão sempre causa assombro aos moradores. Alguns sousenses, como os senhores Zé Honório, Dr. Lelela e Joca Amancio, bastante preocupados com a possibilidade de arrombamento de Boqueirão compareceram à região sitiante e contataram Dadino, para que este pudesse ir até o povoado de Poço (atual município de Poço José de Moura), consultar o guru da região, Senhor Zé de Moura, com vistas a um possível rompimento do açude e suas trágicas consequências para a indefesa população.

Dadino parte logo cedo, sem ser visto pelo sol, em busca do povoado, no extremo oeste do estado. Os galos mal haviam começado a cantoria. Fizera a dificultosa travessia de 120 km (ida e volta) no lombo do seu fiel cavalo pardacento. Estava acostumado a cortar os sertões, a afrontar as suas ameaças, a se embrenhar em suas veredas convidativas, a apreciar as belezas da sua mata em flor. Não era homem de fugir de desafios. Encarara todos eles de frente. A história está aí para comprovar. Nada temia. Nem mesmo a sua consciência, principal testemunha de seus intrépidos atos.

A vegetação da caatinga se encontrava revigorada pelo bom inverno daquele ano. O céu nublado serviu para tornar a travessia menos extenuante. Durante aquele dia, o sol permaneceu insolitamente sereno. A viagem foi dificultada apenas pela cheia do Rio do Peixe e por diversos riachos que rasgam aquelas terras. É sempre assim no sertão. Quando chove bem, sem cerimônia, os riachos mais afoitos deixam o seu leito normal e escapolem com suas águas turvas por sendas mais distantes e até desconhecidas. Parecem até filhotes selvagens desgarrados da mãe, traquinos por natureza.

Zé de Moura era rezador, curandeiro e benzedor, e consultava em sua residência, sem cobrar nada, ganhando fama na região também pelas previsões sobre o futuro. Conhecia como poucos os mistérios do sertão. Enfim, era um profundo entendedor da alma e dos anseios do sertanejo.

Ao receber Dadino na sua casa, disse, de forma irônica, que todos iriam embora, sendo o primeiro o Padre Viana, que era o mais idoso, menos Boqueirão. Em outras palavras, o Guru afirma que as pessoas morreriam, até mesmo pelo avançar da idade, e Boqueirão continuaria de pé, inabalado. Dadino retornou à boca da noite com a boa notícia que tranquilizou a todos.

Na década de 1950, é levada à presença do guru sertanejo a senhora Helena de João Félix, acometida de fortes transtornos mentais. Ao ver a mulher totalmente amarrada, aparentando fortes sinais de agressividade, Zé de Moura manda soltá-la de imediato. De início, os parentes de Helena relutam em atender ao guru, sob a alegação de que foram necessários cinco homens para amarrá-la. Cumprida a ordem, depois de algumas orações e sob espanto de todos, Helena, agora livre, não apresentava mais nenhum sinal de possessão. E todos retornaram para casa, admirados e contentes.

Na estiagem de 1952, o governo de Getúlio Vargas determina a abertura das frentes de emergência no Nordeste Brasileiro, para alentar os flagelados da seca. Em São Gonçalo, o alistamento acontece no majestoso edifício do Instituto. Neste período, ingressam nos serviços: Zolda, Chico Rocha, Ciano Félix, Miguel Basílio, Raimundo Félix, Rubens, Zequinha, Assis Roque, Renato, dentre outros.

No dia 3 de junho de 1956, falece em Cajazeiras, aos 53 anos, por falta de atendimento médico, o Senhor Zé Rocha, esposo de Ana Félix, vitimado por uma obstrução intestinal aguda. O velório foi marcado por forte desalento. A filha Helena era uma das mais sentidas. Já Pedro Félix se encontrava inconsolável com a perda do amigo/parente, visto que, ultimamente, os dois estavam sem se falar por motivos banais.

No dia 29 de junho de 1958, dia de São Pedro, chega aos ouvidos de Manoel Galdino no Sítio Alto da Boa Vista a notícia da conquista da copa do mundo na Suécia pela seleção brasileira, com shows de Pelé e Garrincha. No mesmo dia, ocorre o velório e sepultamento de sua prima, Rosa de Isidora, sob forte comoção da família. Manoel Galdino contaria esta história para o neto Josemar, nos primeiros anos na década de 1980, fato confirmado pelo seu irmão Zolda, em 2016.

Pedro Félix, irmão de Dadino, exercia a função de curandeiro dos sítios, sendo considerado curado dos venenos de cobra, pelo seu tio, Zé Zumba, após uma mordida de cobra cascavel. Depois da cura, sofrera várias mordidas de cobras peçonhentas, sem nada sentir. Quando chamado para uma cura, começava as orações ainda em casa. Logo deslocava-se de cavalo até a residência do enfermo. Chegando lá, receitava café cuspido por ele. Depois, recomendava o isolamento do doente em casa por 30 dias, em que não podia ver nem ouvir pessoas estranhas, mas apenas da própria casa, sob o risco de morte. A cura dos animais picados por cobras era realizada mediante uma cusparada na própria boca do animal.

No início da década de 1960, curou o sobrinho João Miguel, repassando o ofício para ele, que também fora mordido por várias cobras venenosas. Depois, João Miguel chegaria a curar sua esposa, Socorro, de uma picada sofrida na mesma década.

A atividade de curandeiro de Pedro Félix também incluía o dom de isolar as diversas propriedades com orações, percorrendo toda a extensão de terra, de forma a impedir o ingresso de cobras venenosas na área.

Além de curandeiro, Pedro Félix atuava como uma espécie de ortopedista, em que “encanava” as fraturas de braços e pernas dos enfermos com talo de carnaúba. Antes, passava óleo de jenipapo no membro e receitava mastruz com leite para o enfermo.

Também dispunha de um conjunto musical de forró, composto pelos membros: Pedro Félix (pífano), João do Carmo (pífano), Miguel Félix (bumbo), Antonio Félix (caixa), Chico Gomes (caixa) e Zequinha (pífano).

Certa vez, em um animado forró no sítio, Manoel Galdino, que já se encontrava com as orelhas quentes da branquinha (cachaça), convidou a prima Geralda para uma dança. Revoltado, diante de uma contundente e inesperada recusa, arrastou a sua inseparável peixeira de 12 polegadas e determinou ao sanfoneiro tocar 10 mazucas (estilo musical semelhante ao xaxado) seguidas e a todos continuarem dançando. O tempo fechou, mas diante da fiel obediência dos forrozeiros não houve maiores dissonâncias.

Seu Pedro Félix era um verdadeiro polivalente. Sua inteligência aguçada era explorada em diversos ramos e atividades. Exercia, ainda, a função de domador de burro e cavalo brabos. Os proprietários levavam os animais enfurecidos até ele, que ficava de posse das “feras” por uma semana. Depois, os devolvia completamente domesticados.

Algumas considerações sobre os sítios que se localizavam na região atualmente ocupada pelos Núcleos II e III:

- Quandu – o sítio pertencia a Boaventura Rocha. No local, funcionou a usina de algodão do seu filho, Assis Rocha. Luizinho Rocha foi outro proprietário de parte do sítio.

- Grossos – localizava-se às margens do Rio Piranhas, próximo ao Núcleo II. Abrigou a família dos Mata Fresca, de Chico Moreira, Zé Noé, de João Ferreira, de Inácio Brigadeiro.

- Paquetá – onde funcionou o engenho de Augusto Braga, durante as décadas de 1950 a 1970. Abrigou as famílias de Orestes Sá, Nazareno, Maroca, Dias e Ferreira, além de Chico Amancio e Chico Braga.

- Boa Vista – moradia da família Félix. No local, eram realizadas as novenas do mês de maio, na casa de Dona Severina Félix, viúva de Joaquim Félix.

- Recanto – moradia das famílias Costa, Félix e Nóbrega. Uma parte do sítio também fora propriedade de Joca Amâncio. Localiza-se entre o Paquetá e o Matumbo.

- Alto da Boa Vista – era moradia das famílias Félix e Costa. Na casa de Dona Ana Rocha Félix, esposa de Zé Rocha, eram realizadas as novenas de São João.

- Volta da Caiçara – localiza-se entre os Núcleos II e III, às margens do Rio Piranhas. Foi morada das Famílias Severiano, Sá, Vieira, Costa e Félix. O sítio possuía uma vasta plantação de bananeiras.

- Escadinha – localizava-se próximo ao atual Núcleo III. Abrigou as famílias de Júlio Porto, Alcino Patrício, Chico Oliveira, João Patrício, Antonio Basílio, Nelson Basílio, Fransquinho Sarmento, além do Senhor Ranulfo, que promovia vaquejadas na sua propriedade na década de 1960.