SOBRE “TRÁFICO DE CRIANÇAS...”, DE IRON JUNQUEIRA

Não é de agora que venho acompanhando os engenhosos e polidos textos dos articulistas do Diário da Manhã, aliás, assim como tantos outros, estou certo de que todos os Estados do Brasil deveriam ter um jornal que falasse a língua popular. Mas o que mais chamou a minha atenção (e também pude presenciar comentários de muitos leitores transeuntes goianienses, a respeito do assunto) na edição do último dia 18, foi o artigo de Iron Junqueira, intitulado “Tráfico de crianças...”.

A legislação precedente ao Estatuto da Criança e do Adolescente, o chamado Código de Menores que, como frisou Iron Junqueira, foi instituido pelo governo militar, em 1964, tinha realmente um caráter discriminatório, isto é, associava a miséria à delinquência, ao mesmo tempo em que camuflava os reais motivos dos problemas vividos pelas crianças, bem como por seus familiares. A desigualdade social, somada à falta de alternativas melhores de vida fazia com que as crianças de baixa renda fossem taxadas de inferiores e, por conta disso, deveriam ser protegidas pelo Estado (deveriam). Existia uma ideia imbecil, idiota e retrógrada de que os sujeitos mais carentes apresentassem uma conduta harbitrária aos padrões sociais, ou seja, disposição natural à desordem social e, por isso, futuramente desenvolveria a falta de civismo, de ética e a imoralidade, não conseguindo, portanto se adequar à vida em sociedade. Diante desses argumentos usados pelo Estado, as crianças enquadradas nessa classe social tida como “inferiores, miseráveis ou delinquentes”, eram vítimas da falta de proteção, principalmente por parte do Estado.

Depois de relatar várias atrocidades cometidas às nossas crianças anapolinas e das demais regiões brasileiras, pela instituição que, na verdade, deveria protegê-las, a qualquer custo, sabiamente, Iron Junqueira segue dizendo que contra essas brutalidades um “movimento iniciado em Anápolis por uma denúncia (...) feita numa quarta-feira na sede da ACIA – Associação Comercial e Industrial de Anápolis – tomou força em todo o território nacional”, com propósito de coibir à adoção de crianças a estrangeiros, muitos dos quais, possivelmente, estariam mais preocupados com a extração dos órgaos vitais das crianças que a intenção de melhorar o padrão de vida do adotado.

Em 1990, dois anos após a promulgação e sanção de uma nova Constituição Federal, a de 1988, surgiu o Estatuto da Criança e do Adolescente, documento oficial de amparo legal às crianças e aos adolescentes, haja vista que o Código de Menores passou a ser incompatível com os princípios da nova Constituição Federal.

Assim, podemos dizer que a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente foi graças à participação popular. É uma prova concreta de que a participação dos movimentos sociais que representam a sociedade civil deste País reflete nas mudanças benéficas à sociedade.

Todavia, com a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente, grande parte de nossas crianças e adolescentes ainda vivem a mercê do descaso, são descaradamente ignoradas por muitos gestores brasileiros. E pensar que este mesmo País signatário da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, de 1989, continua de olhos fechados para suas próprias crianças! Que ironia!

Iron Junqueira está coberto de razão e merece nossos parabéns, temos que gritar em prol da defesa de nossas crianças e dos adolescentes para que muitas delas não continuem às margens da sociedade. O próprio autor relata que apesar das manifestações, “somente em 2009, a luta iniciada em 1988, teve um desfecho maravilhoso,” já que foi revisto pela comissão de Direito Nacional da Criança e Adolescente, do Ministério da Justiça, a questão da adoção. Vejam bem, senhores leitores, apesar de a grande luta e esforço, foram necessários vinte e um anos (se considerarmos 1988, o início da luta e 2009 a conquista) para conseguirmos maior amparo juvenil. E, pior, a conquista só veio “graças a longa conversação (...) com o ministro Paulo Brossard” que soube que as crianças mais procuradas eram a do seu Estado, Rio Grande do Sul, por serem bonitas, parecidas com crianças europeias. Uma incoerência total: fui educado de modo a observar a beleza interior, bem como as práticas e nunca padrões sociais, raças, etnias...

Além disso, nem precisamos sair de Goiânia em busca de exemplos práticos de contrassenso do poder público para com as crianças e os adolescentes não, aqui mesmo podemos comprovar a vergonhosa omissão do poder público para com essas criaturas.

No meu próximo artigo, se for da permissão deste jornal que tem a cara do povo, trarei um pequeno recorte sobre o estado de abandono em que se encontram milhares das nossas crianças e adolescentes goianienses. Por horas posso somente agredecer aos nossos pacientes leitores e ao Diário da Manhã pela total colaboração na difusão das mais variadas ideias.

Gilson Vasco

escritor

professor

pesquisdor de assuntos juvenis

Gilson Vasco
Enviado por Gilson Vasco em 14/07/2016
Código do texto: T5697994
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