SORTE DE KOKURA OU AZAR DE TSUTOMU YAMAGUCHI?
Há no Japão uma expressão que é “Sorte de Kokura”. Eu explico o porquê: Quando da Segunda Guerra Mundia, três cidade japonesas foram escolhidas como possíveis alvos das bombas atômicas americanas: Hiroshima, Nagasaki e Kokura. No dia 6 de agosto de 1945, quando foi lançada a primeira bomba, a de urânio, que os americanos, em tom de deboche e pouco caso com seu poder de destruição, chamavam de Little Boy (garotinho), em Hiroshima, Kokura seria a segunda opção, caso em Hiroshima o tempo estivesse nublado, como lá o tempo estava bom, os americanos lançaram, pela primeira vez na história, uma bomba de energia nuclear sobre uma população de civis inocentes, matando de uma só vez mais de 140 mil pessoas, que não tiveram oportunidade de ao menos saber o que lhes atingiu.
O Coronel Paul Tibbets Jr. era o comandante do grupamento 590, que foi transferido para a pequena ilha de Tinian, no Arquipélago das Marianas, no meio do Pacífico, foi ele quem comandou o B-29, que levava na lateral o nome de sua mãe: Enola Gay. Voando 9 mil metros de altitude, porém, desceu a 4.550 metros para lançar a bomba que explodiu a 500 metros do chão, transformando em vidro a terra em um raio de mais de 300 metros, provocando um desloacamento de ar com vento de mais de 800 kilômentros por hora.
Passaram-se três dias e os bombardeiros B-29 americanos voltaram à ação, desta feita, o alvo primário seria Kokura e o secundário Nagasaki, porém ao chegarem à Kokura o tempo estava nublado, então partiram para a segunda opção: Nagasaki, aí lançaram a segunda bomba, com carga atômica de plutônio, Fat Man (homem gordo).
Nas duas ocasiõs Kokura foi poupada, primeiro pelo bom tempo em Hiroshima e na segunda ocasião, pelo mal tempo em seu próprio território. Daí nasceu e expressão “sorte de Kokura”, diz-se de alguém que está com muita sorte.
Morreu 11/01/2010, aos 93 anos, Tsutomu Yamaguchi, que na época da Segunda Guerra era morador da cidade Nagasaki, porém, estava resolvendo negócios em Hiroshima no dia em que foi lançada a primeira bomba. Ali ele foi medicado, devido a alguns ferimentos na parte superior do corpo e voltou para sua cidade: Nagasaki, três dias depois sofreu com a segunda bomba. Tsutomu Yamaguchi, até onde se sabe, foi o único sobrevivente dessas duas catástrofes causas das pela intolerância do homem.
Mas Tsutomu Yamaguchi é prova de que pode haver sorte até mesmo no azar. Por infelicidade ele estava nos dois eventos catastróficos, mas por sorte se salvou em ambos. Nas duas explosões, que causaram grandes danos em um raio de quatro kilômetros, ele estava a mais ou menos a três kilômetros de distância.
Na segunda explosão, a de Nagazaki, ele, mesmo machucado, se apresentou no estaleiro em que trabalhava, a maior parte de seus colegas foi para um abrigo antiaéreo quando soou o alarme alertando que haveria um ataque dos americanos, ele resolveu ficar com a mulher e o filho no estaleiro, a bomba caiu exatamente em cima do abrigo, matando todos, inclusive seus companheiros, que lá estavam.
Apesar dos ferimentos, Tsutomu Yamaguchi, presenciou a história, tornando-se um palestrante que falava em nome da paz, além de ter escrito livros e músicas sobre os episódios.
Na verdade os Estados Unidos pretendia mostrar ao mundo, e principalmente a União Soviética, o seu poderio nuclear. Em 15 de agosto de 1945, diante das destruições causadas pelas bombas, o Japão se rendeu, pondo fim à Segunda Guerra mundial e iniciando a chamada Guerra Fria.
Em outubro de 1982, enquanto eu passava pela Praça D. Pedro em Petrópolis, minha cidade natal, ouvi alguém chamar pelo meu nome, era um músico amigo meu, que correndo ao meu encontro disse: olha estão precisando de um músico para ir se apresentar no Japão, e eu sugeri que você fosse, vá falar com o empresário que ele deve te escolher para fazer essa temporada lá. Eu respondi que iria depois falar com a tal pessoa, mais o meu amigo insistiu que eu fosse naquele momento. Acabei indo mais pela insistência dele, do que por acreditar que faria uma viagem para o outro lado do mundo. Eu não ia bem na profissão de músico e a auto estima estava muito baixa para acreditar em qualquer coisa boa, alias eu tinha ido ao centro da cidade para espairecer, esquecer um pouco as adversidades daquele momento da minha vida.
Bem, eu fui, falei com o empresário e acabei sendo contratado para me apresentar na Boate Saci Pererê, justamente na cidade de Kokura, onde fiz boa parte dos meus 180 shows no Japão.
Naquele 9 de agosto de 1945, em que a cidade de Kokura estava com o tempo nublado, muitos moradores podem ter achado que não era um bom dia, mais não sabiam a sorte que estavam tendo, que o dia nublado preservou suas vidas. Assim como eu também não sabia que naquele dia de outubro de 1982, quando caminhava desolado pela cidade de Petrópolis, com o coração tão nublado, que também estava com sorte, de conhecer um país tão bacana, centenas de cidades e um povo muito interessante. Mas minha sorte não chegou a ser uma “Sorte de Kokura”, essa se diz principalmente quando alguém se salva de algo muito grave sem percebe o que lhe podia acontecer.