Pluto está no poder
PLUTO ESTÁ NO PODER
Rangel Alves da Costa*
Segundo a mitologia grega, Pluto (não confundir com Plutão, deus do mundo subterrâneo) era o deus da riqueza, da abundância e da generosidade, podendo-se obter dele infinita quantidade de qualquer coisa que se desejasse. Era representado como uma criança levada pela mão da Fortuna, ou como um velho de olhos vendados carregando uma bolsa.
No seu mundialmente prestigiado Elogio da Loucura, Erasmo de Roterdã qualifica Pluto como pai da insanidade, da própria loucura por ele defendida. Assim, caracteriza-o como pai dos deuses e dos homens, que faz o que quer e quando quer e altera radicalmente as coisas profanas e sagradas; dirige a seu talante a guerra, a paz, os conselhos, os tribunais, as assembléias, as leis, os tratados, as alianças, os assuntos sérios e as coisas erradas; intromete-se sem pedir permissão na vida das pessoas; enfim, governa como quer todos os negócios públicos e particulares dos homens.
Pelas duas concepções de Pluto expostas acima, não seria errôneo afirmar que esse deus de segunda categoria (é esta a sua categoria na mitologia) faz da riqueza e da abundância que tem uma forma de governar os homens do jeito que lhe venha à cabeça, como num sopro de querer assim ou assado, sem se ater, em instante algum, às conveniências ou cautelas que devem pautar as ações daqueles que detêm o poder.
Quando Pluto é representado como um velho de olhos vendados carregando uma bolsa, assim está porque deveria distribuir a sua riqueza indistintamente entre todos. Não podendo enxergar, também não poderia fazer escolhas próprias, dando a determinadas pessoas muito mais do que a outras. Significaria que o poder benfeitor do deus deveria alcançar a todos, sem nenhum privilégio de classe.
Contudo, não se sabe porque cargas d’água, o guia de Pluto, que poderia ser o próprio povo, um dia tirou-lhe a venda dos olhos e deu no que deu. Governante, com o poder nas mãos, com muitas riquezas à sua disposição, podendo enxergar seus apadrinhados e fazer as escolhas que quisesse, decidiu ser um plutocrata.
A plutocracia nasceu assim, da junção entre o poder e a riqueza. Esta deveria ser, na verdade, o poder exercido pelos que têm riqueza. Contudo, o que se observa é que tal conceito se transformou numa forma de distribuição de riqueza por aquele que detém o poder. Tal distribuição, frise-se, é feita pelo governante aos grupos que lhe dão apoio, aos aliados que defendam as ações do poder, e aos amigos de que detém o poder. De certa forma, as riquezas distribuídas pelo governante aos seus escolhidos, formando uma base de poder econômico e poderio político, faz gerar uma plutocracia secundária.
Ora, Pluto é uma entidade da mitologia grega, sendo esta uma forma de que dispõe as pessoas de explicar, através do apenas idealizado, a realidade das coisas e do mundo. Entretanto, entre o mito e a realidade há muito mais do que imagina nossa vã filosofia, como diria o poeta. E nesse ínterim, juntando o mitológico com a realidade que presenciamos perante muitos governantes, poderemos chegar a uma mitologia política brasileira, com diversos Plutos governando para o deleite dos seus escolhidos.
Nesse Olimpo que é o país, os Plutos se espalham desde o panteão, que é Brasília, até as diversas moradias dos semideuses, que são os estados. Tal qual o deus mitológico, sem a venda da imparcialidade e da moralidade, cada um acumula para si as riquezas geradas pelo povo e vai distribuindo-as ao seu bel-prazer entre os já conhecidos escolhidos.
Da bolsa do Pluto grego saía verdadeiras fortunas, dos cofres governados pelos Plutos brasileiros as fortunas saem com endereçamento certo. Não se trata aqui do dinheiro destinado às obras públicas ou à manutenção da máquina estatal, mas sim daquelas verbas destinadas às Ong’s amigas, às associações e sindicatos amigos, aos partidos políticos, entidades de fechada, políticos corruptos, políticos com sede de poder e amigos do poder, empreiteiros e o escambau.
Contudo, agem assim, descaradamente, e ninguém pode fazer ou dizer nada, afinal são Plutos. E como tal fazem com que a junção entre o poder e a riqueza cale de vez os insatisfeitos, afinal podem, em nome daqueles que lhe endeusaram, fazer e desfazer, mandar e desmandar, que não é da conta de ninguém. Tendo nas mãos o comando do público e do privado, que sorte teria um reles do povo que fosse de encontro à vontade de um deus, mesmo que não passe de um Pluto?
Advogado e poeta
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